Auditoria já tinha alertado para problemas na rede informática dos tribunais

Auditoria da Inspecção-Geral das Finanças e documento feito pela equipa que criou a plataforma informática alertaram a tutela para os problemas do Citius.

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Fernando Veludo/NFactos

Muitas das falhas detectadas desde o arranque do novo mapa judiciário na plataforma informática Citius, que faz a gestão dos processos judiciais, já tinham sido referidas numa auditoria da Inspecção-Geral das Finanças (IGF).

A auditoria, citada pelo jornal i, concluiu que a Justiça não tinha recursos humanos com um “conhecimento profundo” do sistema, que a plataforma era lenta e que a rede de comunicações era insuficiente – estas conclusões foram tiradas ainda antes de ser necessário fazer a migração electrónica de mais de 3,2 milhões de documentos e de 20 milhões de actos processuais, como aconteceu com o novo mapa judiciário que arrancou a 1 de Setembro.

Num resumo do relatório publicado no seu site, a IGF explica que a auditoria teve como objectivo avaliar a “eficácia dos investimentos realizados no âmbito do Citius e o respectivo modelo de preservação da informação”. De acordo com o documento, os problemas identificados não estão directamente no Citius enquanto sistema mas sim na lentidão causada pela insuficiente rede de comunicações.

Sobre os recursos humanos, o relatório da IGF refere que o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça e a Direcção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ) demonstraram não ter pessoas “com um conhecimento profundo e aprofundado do sistema”. Referia-se também que o “reduzido número de recursos humanos” da anterior equipa e a necessidade de resposta rápida levou “à renúncia das melhores práticas de programação”.

Nas conclusões, é também referido que o investimento de 1,4 milhões de euros (sem IVA) “na melhoria do Citius, do qual resultou a versão Citius (Plus), teve poucos resultados positivos, limitando-se à resolução de alguns problemas de segurança”. “O custo mensal com a equipa de desenvolvimento do Citius, constituída por 11 elementos pertencentes aos quadros da DGAJ, é substancialmente inferior ao custo incorrido com a contratação de serviços externos para a manutenção e evolução do Citius”, lê-se nas conclusões da auditoria.

No que diz respeito a recomendações, a IGF considera que “é indispensável considerar não só o custo mas também a estabilidade do sistema actual, os problemas e os estrangulamentos reportados, bem como o cumprimento das normas da protecção e segurança da informação”, pelo que insiste na importância de existir “uma equipa de programadores estável e uma gestão adequada da evolução dos sistemas de informação (mediante uma gestão de projectos profissionalizada)”. Sobre o mesmo ponto, a auditoria recomenda que “a manutenção e operação de outros subsistemas da justiça, a operar directamente sobre a plataforma Citius, passem a estar na dependência directa da equipa do Citius”.

Os alertas sobre as fragilidades do Citius também terão chegado há dois anos à ministra da Justiça, Paula Teixeira da Cruz, através de um documento enviado pela equipa que criou a plataforma informática. O Diário de Notícias desta quarta-feira explica que desde Junho de 2012 que a tutela sabia que o sistema corria o risco de colapso, informação que foi dada num documento intitulado “Planeamento para a Reorganização do Mapa Judiciário” e que tinha um total de 43 páginas. Contactado pelo PÚBLICO, o Ministério da Justiça diz não ter registo de entrada nos serviços de tal relatório.

O documento, explica o mesmo jornal, apresentava mesmo três cenários possíveis para adaptar o Citius às 23 comarcas do país. Só que algum tempo depois, em Fevereiro de 2013, os dez elementos da equipa demitiram-se alegando esvaziamento das funções. A ministra não quis comentar nenhum dos documentos.

Desde o arranque do novo mapa judiciário que as denúncias sobre a inoperacionalidade da plataforma informática se sucedem, com a Ordem dos Advogados a anunciar que vai pedir ao primeiro-ministro "o apuramento da responsabilidade" da ministra da Justiça na "paralisação dos tribunais" e solicitar a sua intervenção para, por via legislativa, suspender os prazos processuais até restabelecimento do sistema.

Na última semana, a Associação Sindical dos Juízes Portuguese e o Sindicato dos Magistrados do Ministério Público pediram explicações ao Ministério da Justiça sobre as falhas no Citius, tendo o Sindicato dos Funcionários Judiciais pedido que a ministra demita os responsáveis do Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, que gere o sistema informático.

Na sexta-feira, também a Direcção-Geral da Administração da Justiça (DGAJ) pediu a todos os utilizadores do Citius que não pratiquem "quaisquer actos no sistema informático" e que salvaguardem, "em sistema digital autónomo, todos os actos praticados após 1 de Setembro".

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