Despejados do Bairro Nicolau regressam ao Bonfim

Alvo de um despejo polémico em Julho pelo anterior executivo da Câmara do Porto em Julho, os antigos moradores já estão a ser contactados pelo município com vista ao regresso à antiga freguesia.

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Câmara do Porto é a que paga a factura mais elevada por serviços de clipping Fernando Veludo/nfactos

O ano começou com uma alegria inesperada para Isabel Lima. A boa notícia chegou pelo telefone ao apartamento no Bairro do Cerco onde o Município do Porto a instalou a 31 de Julho 2013, dia em que a câmara a despejou e aos vizinhos do Bairro Nicolau, nas Fontainhas. Agora, do outro lado da linha estava uma técnica da empresa municipal DomusSocial, a informar Isabel de que ia poder regressar ao centro da cidade. Os antigos vizinhos do bairro também já foram contactados.

“Já tenho as chaves da nova casa, mas fui apanhada de surpresa e estava desprevenida. Tenho de fazer as mudanças, ando a meter tudo em caixotes”, diz Isabel, antes de continuar, com a alegria nas palavras: “O meu pai também já tem a chave da nova casa. Vamos ficar no mesmo bloco”.

O pai de Isabel, Mário Duarte Lima, era o mais antigo morador do Bairro Nicolau, na altura do despejo. Morava ali há 69 anos e, semanas antes da saída forçada, foi uma das vozes que protestou contra a ida anunciada para o Bairro do Cerco. Em Junho, a então vereadora da Habitação, Matilde Alves, garantiu ao PÚBLICO que, naquele momento, a câmara só tinha casas disponíveis naquele local. E foi para lá que, contrariados, os moradores acabaram por ir.

Isabel nunca se conformou e, mesmo sabendo que, pelas regras da autarquia, não teria prioridade num pedido de transferência, avançou na mesma. Ela e o pai. A resposta positiva foi rápida, porque os serviços já tinham sido instruídos para tratar do regresso à Freguesia do Bonfim dos antigos moradores do Bairro Nicolau, explica o vereador da Habitação, Manuel Pizarro. “Temos alguma obrigação de realojar estas pessoas o mais próximo possível das Fontainhas. É uma lógica de humanização. As pessoas foram desalojadas, em nome de uma alegação de problemas na escarpa, à qual não vale a pena voltar. Eu tinha pedido aos serviços para tratar desta questão, até porque havia razões sérias de protecção de crianças, que andavam em escolas naquela zona”, diz. O desalojamentos dos moradores do Nicolau foi criticado por todos os principais candidatos à Câmara do Porto, que prometeram reinstalá-los na zona assim que possível.

Nesta altura, os 16 agregados que saíram do Bairro Nicolau, “cerca de 30 pessoas”, pelas contas do vereador, já foram avisados pelos serviços de que a câmara está disponível para os retirar do Bairro do Cerco. As alternativas que lhes estão a ser oferecidas são o Bairro de Fernão de Magalhães e o de Duque de Saldanha. “O mais próximo que tínhamos para oferecer”, explica o vereador.

Isabel, com três filhos, e o pai vão para o Bairro de Fernão Magalhães. E é para lá que irá também Vânia Cardoso, com o filho. Esteve na DomusSocial na quarta-feira e saiu animada. Nunca se habitou ao Cerco. “A minha vida é casa, trabalho, como nas Fontainhas, mas não é a mesma coisa. Não nos sentimos em casa, é um local estranho para nós”, diz.

Vânia espera que os pais e os irmãos também sejam transferidos para o Bairro de Fernão de Magalhães, que escolheu – explica –, “porque as casas têm mais ou menos as mesmas dimensões do que as do Cerco, enquanto as do Duque de Saldanha são um pouco mais pequenas”. Diz que já teve de se desfazer de muitas coisas quando deixou as Fontainhas e não quer deixar mais nada para trás. Por enquanto, ainda não sabe exactamente quando poderá mudar-se. “Disseram-me que me avisariam mal tivessem uma casa com a tipologia certa para mim e requalificada por dentro, porque há casas que ainda estão a ser arranjadas”, diz.

Manuel Pizarro garante que, neste momento, “estão a ser tratados 13 dos 16” processos abrangidos. “Há três agregados para os quais não temos capacidade para já, porque são familiares e querem ficar perto uns dos outros, por isso é preciso esperar mais um pouco. Mas nas próximas semanas poderão todos mudar-se”, garante.

Isabel espera que nesta sexta-feira lhe vão ligar a luz da nova casa. E já anda a encaixotar roupas e louças. O pai, explica, tem feito viagens de autocarro, carregando o que pode em sacos de plástico para a nova casa. “Quando viemos para aqui a câmara trouxe as nossas coisas, mas desta vez somos nós que temos de fazer a mudança e não estávamos preparados, o dinheiro não chega para tudo”, diz para justificar por que não se mudou ainda. Manuel Pizarro garante que desconhecia esta dificuldade e que ela tem solução. “Se pedirem ajuda, de certeza que a câmara e até a junta ajudarão”, promete.

Além dos moradores, quem também está satisfeito com o evoluir do processo é o Fernando Matos Rodrigues, responsável pelo programa de Habitação da candidatura de Rui Moreira e estudioso das ilhas da cidade, que acompanhou o caso do Bairro Nicolau desde o primeiro minuto. “Havia um compromisso de Rui Moreira e também de Manuel Pizarro para com estas pessoas. Estão a cumprir o que prometeram e, por isso, estão de parabéns. É um bom sinal, para a cidade e para o país”, diz.

Além dos agregados que saíram do Bairro Nicolau há um grupo de moradores que permaneceu no local, em habitações ilegais e sem água e sem luz. Manuel Pizarro garante que não estão esquecidos. “É um problema muito sério. As pessoas que lá ficaram estão a viver em condições infra-humanas. É um dos ‘monumentos’ que o pelouro está a tratar”, afirma.
 
 
 
 
 

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