“Hoje, a Igreja está viva” e Bento XVI promete continuar nela

“Nunca estarás sozinho”, disseram ao Papa os fiéis emocionados que dele se despediram na Praça de São Pedro.

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Milhares de fiéis acompanharam emocionados a última audiência de Bento XVI Stefano Rellandini/Reuters

“Obrigado, obrigado!”, “Obrigado, Santidade!”, assim o receberam, entre tantos aplausos e agitar de bandeiras, de Itália, do Vaticano, de Portugal, dos Estados Unidos, da Índia, da África do Sul, da Alemanha, de Espanha, do Brasil... “Viva o Papa, viva o Papa!”, “Bento, Bento, Bento!”, assim dele se despediram, uma hora e meia depois da chegada à Praça de São Pedro, que pela última vez percorreu no interior do Papamóvel.

O Papa usou o seu último discurso para agradecer “sobretudo a Deus” e aos presentes: “Estou realmente comovido”. Agradeceu a todos os que o acompanharam ao longo dos últimos oito anos e quis pedir-lhes que rezem com ele pela Igreja. Agradeceu ainda “aos cardeais”: “A vossa sabedoria, os vossos conselhos, a vossa amizade”. E ao corpo diplomático, “que permite a existência da grande família das nações junto da Santa Sé”.

Partilhou ter pedido “com insistência a Deus” que o iluminasse para o “fazer tomar a decisão mais justa”, a da renúncia. “Não para o meu bem, mas para o bem da Igreja. É o Senhor que me pede isto…”. Tal como duvidara e rezara quando foi eleito. “Senhor, por que me pedes isto? É um grande peso que coloco sobre os ombros. Mas, se me pedes, confio em ti.”

A praça, que o escutava no silêncio quase absoluto, interrompia para o aplaudir. E de novo, mais à frente, quando disse: “Amar a Igreja significa ter a coragem de fazer escolhas difíceis, sofridas”. “Todos nós sabemos que a palavra da verdade é a força da Igreja e a sua vida”, disse, para depois evocar “os momentos de alegria e de luz” “e os “momentos não-fáceis” que marcaram o seu pontificado. “Eu sempre soube que a barca da Igreja não é nossa, mas é Sua. E o Senhor não a deixa afundar. É ele que a conduz certamente, mesmo que através dos homens que escolhe”, afirmou, tantas vezes interrompido por aplausos. Essa é “uma certeza que nada pode ofuscar”.

Lembrando as viagens e os peregrinos que encontrou enquanto Papa e as cartas que tantos “irmãos e irmãs, e filhos e filhas” lhe escreveram, repetiu que, “hoje, a Igreja está viva” e que “a Igreja é um corpo vivo”. Um corpo que ele pôde experimentar de uma forma especial. “Experimentar a Igreja deste modo é quase como poder tocar-lhe com as mãos.” “O Papa pertence a todos e todos lhe pertencem”, garantiu. “A minha decisão de renunciar não muda isto. Não abandono a cruz, permaneço nela. Continuarei a dedicar-me à Igreja.”

Antes de se despedir, o homem que será Papa até às 20h de quinta-feira (19h em Portugal continental), momento em que deixará o Vaticano, disse que rezará “pelos cardeais chamados a uma escolha difícil” e pelo “novo sucessor”. Depois, pediu a todos para nunca perderem a fé. “Cada um de nós vive alegre, na certeza de que o Senhor está por perto, nunca nos abandona, está junto de nós com o seu amor. Obrigado.”

Bento XVI sorriu e a praça aplaudiu. Dois minutos durou o sorriso, um pouco mais os aplausos, os cardeais de pé, o resto da praça emocionada. “Obrigado!”, gritou-se. “Viva o Papa!”, também. Seguiram-se os agradecimentos nas várias línguas em que antes o Papa fizera a leitura da catequese. E as mãos dos fiéis, muitas antes quietas e pousadas sobre o peito, puderam então aplaudir sem interrupções. Até a voz do Papa se voltar a ouvir, na oração do Pai Nosso em latim, e a praça a rezar com ele, baixinho.

Coragem e obrigado
“Nunca estarás sozinho”, lia-se num dos muitos cartazes com mensagens que o Papa pôde ler nesta manhã de céu limpo e azul, com o sol a temperar o frio de fim de Fevereiro em Roma. “Que viva o Papa, que viva o Papa!”, gritou-se por fim. “Bento, Bento, Bento!”

Eram 12h em Roma (uma hora a menos em Lisboa) quando Bento XVI desceu do altar diante da Basílica de São Pedro e entrou de novo no Papamóvel para o último adeus, prolongado e sereno.

“Foi um momento muito difícil para ele, cheio de amor e de dor”, diz com um sorriso aberto Pascal Fomonyuy, franciscano dos Camarões a estudar em Roma. “Foi um bom exemplo. O que posso fazer faço, o que não posso não faço, não me obrigo a fazer sem poder.” Foi esta, para o frade de 36 anos, a lição de Ratzinger. Pascal vê-o “como um profeta vivo”, mas despede-se dele com “tranquilidade”, cheio de “encorajamento”.

Agora, resta esperar e aceitar a escolha do sucessor: “A Igreja é de Cristo, não é de Bento”. Se tivesse podido falar-lhe nesta manhã, na sua última audiência, Pascal teria poucas palavras para Bento XVI. “Coragem. Obrigado. Amo-te.”
 

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