Portugal orienta prestações sociais para rendimentos mais baixos

Análise de economista do Banco de Portugal esvazia discurso do FMI sobre apoios sociais. Redução de subsídios e mudanças nas regras de atribuição de prestações poderão ter agravado desigualdades.

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A despesa em prestações manteve-se “relativamente estável” entre 2009 e 2012, aponta o estudo Nelson Garrido

Numa análise incluída no Boletim Económico de Inverno, divulgado nesta terça-feira pela instituição, Nuno Alves, do Departamento de Estudos do banco, conclui que Portugal é um dos países da União Europeia (UE) em que as prestações sociais (excluindo as pensões) mais são orientadas para quem tem menores rendimentos. E o facto de a despesa com prestações ser mais baixa do que a média europeia impede que o impacto destas medidas seja mais significativo, sustenta o economista.

Quando Pedro Passos Coelho abordou a questão das prestações sociais a propósito do corte de 4.000 milhões de euros na despesa do Estado a apresentar à troika (2013 e 2014), falava de rendimentos de pensões e de outras prestações sociais (como os subsídios de desemprego, subsídios familiares ou rendimento social de inserção). Isso mesmo consta do relatório do FMI que veio a público na semana passada.

Mas no mesmo documento em que se diz que 33,8% de todas as medidas de protecção social (ou seja, incluindo pensões) se concentram na franja de beneficiários com rendimentos mais elevados, o FMI reconhece que só 8,9% das medidas de assistência social (excluindo as pensões) abrangem na verdade essa franja de 20% de rendimentos mais altos.

O artigo do economista Nuno Alves agora conhecido mostra que as medidas de protecção social se dirigem a quem tem menores rendimentos.

O impacto das prestações em dinheiro “na diminuição da desigualdade é ligeiramente inferior ao registado na média da União Europeia” – 6% do rendimento base em Portugal, contra mais de 8% na zona euro e na UE. Este facto, diz o economista, “é usualmente interpretado como revelando não só uma menor eficácia mas também uma menor eficiência das prestações em dinheiro”. Mas, na verdade, aponta, “este resultado decorre exclusivamente da dimensão relativamente modesta daquelas prestações”. E acrescenta: “Portugal é mesmo um dos países em que as prestações em dinheiro (excluindo pensões) são mais orientadas para os rendimentos mais baixos. No que se refere aos impostos sobre o rendimento, o seu efeito redistributivo em Portugal é superior à média europeia, o que resulta de uma maior progressividade dos impostos sobre o rendimento em Portugal”.

O artigo de Nuno Alves deixa de fora a análise do sistema de pensões e, como o próprio assume, não aborda outras “questões incontornáveis no debate em curso sobre políticas de redistribuição”.

Há, porém, um dado que não passa em branco: as mudanças recentes nas regras de atribuição de prestações sociais, como é o caso do cálculo do subsídio de desemprego, a redução de algumas das prestações ou o facto de outras terem sido restringidas. “Estas alterações deverão ter contribuído para mitigar o impacto redistributivo destas prestações em Portugal — devido à diminuição de transferências com um elevado grau de progressividade — e, neste sentido, deverão ter contribuído para um aumento da desigualdade na distribuição do rendimento”.

Com o aumento da taxa de desemprego, os gastos do Estado com subsídios aumentaram. Mas, no seu conjunto, a despesa do Estado em prestações sociais manteve-se “relativamente estável” entre 2009 e 2012. Tal deve-se ao facto de haver “uma diminuição dos gastos do Estado com subsídios de família, subsídios a jovens e do rendimento social de inserção, o que contrabalança o “aumento significativo [na despesa] do subsídio de desemprego — associado fundamentalmente a um aumento sem precedentes do desemprego”.
 
 

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