Escolas não sabem quando chega o pequeno-almoço gratuito

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"As escolas asseguram que as crianças comem não só ao almoço, mas também de manhã e à tarde", diz um dos directores contactados Foto: Enric Vives-Rubio

A confusão acerca do projecto-piloto de distribuição do pequeno-almoço gratuito nas escolas, que segundo o Ministério da Educação e Ciência (MEC) arranca esta semana, adensou-se esta segunda-feira.

Apesar de as aulas estarem prestes a terminar, três dos directores de agrupamentos de escolas seleccionadas para o projecto-piloto ainda não sabem quando e como vão receber os alimentos.

O anúncio do lançamento da fase experimental do projecto foi feito no Parlamento, na passada terça-feira, dia 29 de Maio. Durante a audição na Comissão de Educação e Ciência, o secretário de Estado Casanova de Almeida adiantou que, apesar de só ser generalizado a todas as escolas do país no próximo ano lectivo, havia 80 agrupamentos e “milhares de alunos” do ensino básico que começariam a receber a primeira refeição do dia a partir desta semana.

No mesmo dia, o secretário de Estado e o ministro, Nuno Crato, especificaram que estavam envolvidos no projecto grandes empresas do ramo alimentar (que forneceriam os produtos) e a Asociação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), já que caberia às câmaras o transporte dos alimentos entre as grandes superfícies comerciais e os agrupamentos de escolas seleccionados.

Acontece que, segundo António Ganhão, vice-presidente da ANMP, o ministério ter-se-á “esquecido” de negociar com as autarquias. Só dois dias depois do anúncio no Parlamento, às 17h31 de quinta-feira, o ME enviou um e-mail para a associação a referir o assunto. O teor da mensagem também não agradou aos autarcas: “O MEC apresenta uma lista de 41 câmaras municipais e dá a indicação de que cada uma delas deverá contactar a Direcção Regional de Educação (DRE) da sua área de influência, para saber onde deve recolher os alimentos e onde os deve entregar. O ministro Nuno Crato pensa o quê? Que as câmaras são uma extensão das DRE ? Que nos pode dar ordens para transportarmos nem sabemos o quê de um lado para o outro?”, protestou Ganhão.

Nesse dia, pelo menos parte das escolas seleccionadas não tinham conhecimento de que entrariam nesta fase do projecto. Houve quem soubesse sexta-feira, através de um telefonema dos serviços do MEC. E quem chegasse a acreditar que hoje, segunda, já poderiam fornecer as refeições gratuitas às crianças.

"Não sendo já, que sentido faz isto?"

“Não tenho a certeza de que me tenham dito que começava hoje, segunda-feira. Disseram que era esta semana e presumi que sim, porque para a maior parte dos alunos as aulas acabam daqui a quatro dias, com um feriado pelo meio, e para outros acabam daqui a semana e meia. Não sendo já, que sentido faz isto?”, justificou hoje António Lopes, do agrupamento de Escolas de São Mamede de Infesta, que durante o fim-de-semana prestou declarações à Antena 1 informando que contava poder oferecer os pequenos-almoços gratuitos hoje.

José Mesquita, director do agrupamento de Escolas Dr. Vieira de Carvalho, no concelho da Maia, a esta hora só tem uma certeza: “Já não é hoje que o agrupamento entra no programa”. Foi-lhe dito, na sexta-feira, que havia de ser informado sobre os vouchers para ir levantar os alimentos para 25 alunos a uma grande superfície. Não só não recebeu mais informação como não ficou com a ideia de que o objectivo fosse testar o sistema com vista à generalização, no próximo ano. “Perguntaram-me se podia usar o meu carro e eu disse que sim, pela urgência em lançar o programa e porque falta pouco mais que semana e meia para o fim das aulas. Era só o que faltava, fazer isto por sistema, durante todo o ano lectivo”, comentou.

No agrupamento de Olival, em Gaia, a incerteza era semelhante. O director, Carlos Silva, também contactado sexta-feira pelos serviços do ministério, não sabe como lhe chegará o pequeno-almoço gratuito para 20 a 30 alunos.

Os três directores asseguraram ao PÚBLICO que nenhuma criança ficou com fome, hoje ou nos restantes dias do ano. “Nenhuma escola é insensível a este problema. Através das receitas do bufete ou da negociação com as autarquias ou com as empresas de catering, todas as escolas asseguram que as crianças comem não só ao almoço, mas também de manhã e à tarde”, disse José Mesquita. António Lopes, indicou que o mesmo se passa com os 64 crianças do seu agrupamento, candidatas a pequeno-almoço gratuito e quase todas beneficiárias da Acção Social Escolar: “Já garantimos alimentos a muitos e, havendo uma resposta institucional, indicámos mais – antes pecar por excesso do que por defeito”, disse, para justificar o número de crianças a precisar da refeição, num agrupamento de 700 alunos.

Carlos Silva, que gere um agrupamento com 1800 estudantes e pediu 20 a 30 pequenos-almoços, diz que a atenção ao problema da fome é tanta que, às vezes, dá mau resultado: “Já me aconteceu sondar um aluno que me disse que sim, que comia antes de ir para a escola. No dia seguinte apareceu a mãe, furiosa, a dizer que eu não tinha nada que andar a perguntar o que é filho comia em casa”, contou.

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