O corpo de Cesária Évora vai permanecer em câmara fria até às 7:00 horas de terça-feira, e depois será transladado para a residência da família, na Rua Fernando Ferreira Fortes, onde permanecerá até às 12:00 horas (13:00 em Lisboa).
A cantora cabo-verdiana é lembrada como a diva que levou a música de Cabo Verde para o mundo.
“Cabo Verde fica mais pobre, da mesma forma que ficou mais rico quando ela nasceu, porque nasceu uma estrela que não se apagará, ficará sempre acesa, a brilhar através da sua música”, afirmou o músico cabo-verdiano Tito Paris.
Ao PÚBLICO, Tito Paris lamentou ainda que “muitos [cabo-verdianos] não têm noção do que ela ofereceu” àquele país. “A Cesária levou-nos de uma parte do mundo para a outra, levou o nome de Cabo Verde por todo o mundo e quando ela estava em palco, todo o cabo-verdiano estava lá com ela. Ela levou a morna, e o sorriso, e o calor do Mindelo”.
A cantora, que nasceu em 1941, começou muito jovem a cantar em bares e hotéis, mas só em 1988, com 47 anos, gravou, em Paris, o aclamado álbum “La diva aux pied nus” – “a diva dos pés descalços ”, epíteto com que é frequentemente referida na imprensa.
Poucos anos antes, gravara já um álbum em Lisboa, mas o trabalho acabou por passar despercebido. Numa entrevista ao PÚBLICO, em 1999, Cesária mostrava algum ressentimento por isso. "[Portugal é] um grande país, tenho muitos fãs aqui, mas eu devia ter sido reconhecida aqui primeiro. Eu até ia cantar nos navios de guerra, desde o tempo colonial", disse. "Quem me ajudou foram os franceses, nem os portugueses, nem os cabo-verdianos".
Nos anos que se seguiram a “La diva aux pied nus”, Cesária Évora tornou-se numa estrela no panorama mundial da world music. Em 2009, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, atribuiu-lhe a medalha da Legião de Honra.
Foi “uma das vozes mais expressivas e originais da música mundial”, classificou esta tarde o secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas, numa nota de condolências. “A qualidade da sua voz era de alcance universal, e o reconhecimento internacional que obteve comprovou isso mesmo”. Um comunicado do Presidente da República, Cavaco Silva, descreve-a como uma “artista singular, que tão bem soube exprimir a cultura e a tradição musical da sua terra, muito para além das fronteiras da língua portuguesa".
O ministro da Cultura de Cabo Verde, Mário Lúcio Sousa, considera que "Cabo Verde perdeu uma das suas principais vozes". E acrescentou: "O legado que nos deixou certamente que suplantará a dor. A Cesária tinha uma alma que nos representava a todos. Era uma espécie de anjo da guarda de toda a gente". O Governo de Cabo Verde decretou dois dias de luto oficial.
A Assembleia Nacional cabo-verdiana também já expressou as condolências: “A diva dos pés nus morreu, mergulhando o país numa profunda dor, pois a perda é irreparável. Cabo Verde fica mais pobre com o desaparecimento físico da Cize, como ela era carinhosamente conhecida pelos cabo-verdianos”, afirmou o presidente da assembleia, Basílio Mosso Ramos, citado pelos media locais.
Cesária Évora morreu às 11h20, no Hospital Baptista de Sousa, na ilha de São Vicente, na sequência de complicações cardíaco-respiratórias. Em 2008, sofrera um acidente vascular-cerebral (AVC), que a afastou temporariamente dos palcos. Regressou pouco depois, com um ritmo menor de concertos. "Canto mais um tempo e depois stop!", disse ao PÚBLICO em 2009.
Em Setembro passado, anunciou o fim da carreira, por motivos de saúde.
“É uma notícia triste, embora esperada”, afirmou ao PÚBLICO o escritor José Eduardo Agualusa. “A Cesária já não estava bem há algum tempo, mas quando a notícia chega nunca estamos preparados. O extraordinário sucesso internacional da Cesária mudou por completo a forma como a música cabo-verdiana passou a ser acolhida no mundo e, dessa forma, mudou a própria música cabo-verdiana”.
Também a cantora portuguesa Lura, de ascendência cabo-verdiana, afirma que Cesária Évora “levou Cabo verde ao mundo, ao universo inteiro”.
“Todos falam sobre esta perda irreparável, mas nem consigo pensar nisso”, disse ainda ao PÚBLICO o actor cabo-verdiano Flávio Hamilton. “Só consigo pensar numa enorme tristeza. Para mim a Cesária sempre foi o mundo”. Com Lusa
Notícia substituída às 18h44