Direcção dos Serviços de Sangue e Transplantação demite-se

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A direcção da ASST demite-se como "forma de protesto" contra as declarações de Paulo Macedo Foto: Lara Jacinto/arquivo

O presidente e a coordenadora nacional da Autoridade dos Serviços do Sangue e da Transplantação pediram hoje a demissão em protesto contra as intenções do ministro da Saúde de cortar as verbas daquele organismo.

“Recuso-me a permanecer aqui porque o meu lugar está esvaziado de funções. Não posso aceitar que haja doentes que se podem salvar mas que vão morrer porque o país está em dificuldades económicas”, disse à Lusa a coordenadora nacional das Unidades de Colheita de Órgãos, Tecidos e Células para Transplantação, Maria João Aguiar.

A demissão da coordenadora nacional surge na sequência das declarações “absolutamente desastrosas” do ministro da Saúde, Paulo Macedo, em entrevista à TVI nesta quinta-feira à noite.

Questionado sobre se os transplantes estariam em risco, o ministro Paulo Macedo admitiu que “pode não haver o mesmo número de transplantes”, explicando que é preciso perceber se o país “pode sustentar o actual número de transplantes”.

“O que pretendemos é manter um número de transplantes tão interessante e de qualidade como tem vindo a ser feito, mas claramente dando menos incentivos aos hospitais, porque também não é necessário. Estes incentivos visam um incremento e o que achamos é que não é necessário haver aqui um incremento”, acrescentou o ministro.

Perante as declarações do ministro, Maria João Aguiar e o director geral da Autoridade dos Serviços do Sangue e da Transplantação (ASST), João Rodrigues Pena, apresentaram hoje a sua carta de demissão ao ministério como “forma de protesto”, uma informação que o ministério já confirmou à Lusa.

“Digam então às famílias dos doentes”

“Enquanto médica e enquanto técnica para mim isto é absolutamente inaceitável”, disse Maria João Aguiar, acrescentando: “É muito difícil para os médicos aceitar que haja doentes que se podem salvar e vão morrer porque o país está em dificuldades económicas. Digam então às famílias dos doentes que temos de fazer cortes económicos para salvar o Serviço Nacional de Saúde e terão que morrer doentes.”

“Como é que um doente que está à espera de um transplante para sobreviver recebe estas notícias? A colheita não sobe nem desce por milagre, tem de ser apoiada”, sublinhou a responsável.

Em Agosto, o Governo decidiu cortar para metade os incentivos para a realização de transplantes, com efeitos retroactivos desde o início do ano.

A responsável refere que o anúncio de cortes aos incentivos previstos para a ASST tinham sido recebidos pelos responsáveis como “inevitáveis” face à actual situação do país: “Eu, com alguma ingenuidade, pensei que poderia tentar fazer o mesmo trabalho com metade [do orçamento] e que se iria tentar que os números da actividade não baixassem. Mas as declarações do senhor ministro [nesta quinta-feira] foram muito claras.”

Maria João Aguiar considera que as suas funções deixam de fazer sentido quando o ministério admite que o país está sem capacidade económica para manter o actual nível de colheitas e transplantes.

A responsável garante que as transplantações renais significam uma “poupança de milhões de euros” ao Estado: “A transplantação é a maneira mais económica para os doentes que vão continuar a gastar dinheiro ao Estado porque continuam em diálise se não são transplantados.”

Afirmou ainda à Lusa que decidiu enviar uma mensagem aos colegas que trabalham na área, apelando para que “continuem a ter em mente os doentes que estão em lista de espera, porque eles existem e sofrem todos os dias”.

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