Como a Europa tenta integrar (ou controlar) os seus imigrantes

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Os imigrantes ilegais em França fizeram um protesto de seis semanas Joel Saget/AFP

Vários países europeus têm testes de língua e cultura e outras medidas, como assinatura de contratos de direitos e deveres ou sistemas de pontos para os seus imigrantes. A ideia, dizem os governos, é promover uma imigração com potencial de integração. Outros acusam os governos de tentarem simplesmente limitar o número de residentes estrangeiros no seu território e as naturalizações.

A ideia dos testes de inteligência para os imigrantes, avançada por um político conservador alemão, foi o pretexto para uma visita a várias destas políticas em países europeus.

Alemanha

A polémica surgiu dentro e fora da Alemanha quando Peter Trapp, especialista em política interna do partido da chanceler Angela Merkel, sugeriu que se fizessem testes de inteligência para os imigrantes que queiram viver e trabalhar no país. "Para além de educação e qualificação profissional, devíamos ter em conta a inteligência. Sou a favor de testes de inteligência para imigrantes." A ministra da Integração, Maria Böhmer, reagiu logo, dizendo que a própria sugestão "não revela muita inteligência".

As principais dificuldades para os imigrantes na Alemanha são a língua e o facto de o país limitar a dupla cidadania. Imigrantes a viver na Alemanha que desejem obter a autorização de residência têm já de fazer testes de língua (em que lhes é exigido um nível básico, ou seja, devem conseguir expressar-se sobre a vida quotidiana) e ainda um teste de conhecimentos sobre a sociedade alemã.

A Alemanha introduziu ainda, em Setembro de 2008, um teste de naturalização para os imigrantes que queiram obter a cidadania. Trata-se de um teste de cultura, história e democracia, com 33 questões de escolha múltipla - desde quantos estados federados tem a Alemanha até porque se ajoelhou Willy Brandt no antigo gueto de Varsóvia. Das 33 perguntas, 17 têm de ter resposta correcta.

Uma outra medida, proposta pela comissária alemã da Integração (que ainda não está em vigor, mas que o Governo quer adoptar durante esta legislatura), é a assinatura de um contrato pelo imigrante dizendo que aceita certos valores (liberdade de imprensa ou direitos iguais para as mulheres, por exemplo) quando decidir ir viver para a Alemanha. O projecto deverá começar a ser testado este ano em regiões-modelo, com voluntários.

O número de pessoas a pedir a nacionalidade alemã tem vindo a baixar: em 2000, naturalizaram-se mais de 186 mil pessoas, em 2004 foram pouco mais de 127 mil. Nos anos de 2008 e 2009, houve na Alemanha mais pessoas a emigrar do que a imigrar, contrariando uma tendência de décadas. O país tem cerca de 15 milhões de imigrantes, numa população total de 82 milhões, e o maior grupo é de origem turca (cerca de três milhões).

Reino Unido

O Reino Unido está num período de consulta em relação ao estabelecimento de um limite anual para a imigração de fora da União Europeia. O Governo de David Cameron quer reduzir os números da imigração dos anos 1990, para "dezenas de milhares, e não centenas de milhares", segundo o Ministério do Interior. Já está em vigor um limite temporário, para evitar um pico de imigração em antecipação das restrições.

O país tem, desde 2005, testes de língua, assim como de cultura e costumes para os imigrantes que requerem a cidadania (no ano passado, foram mais de 193 mil). As perguntas vão desde legislação até história, passando por questões relativas ao dia-a-dia (como pagar impostos, etc...). Quando um residente recebe a cidadania, tem obrigatoriamente de participar numa cerimónia solene em que presta lealdade à pátria e à Rainha e recebe as boas-vindas à sociedade.

Enquanto isso, o Reino Unido tenta também livrar-se de imigrantes de outros países europeus que estejam em situação precária, sem trabalho e sem meios de regressar a casa: uma das últimas medidas é oferecer bilhetes de avião, só de ida, a sem-abrigo vindos de países europeus. Esta medida está em vigor há 18 meses e já permitiu o regresso a casa de centenas de pessoas, segundo o Ministério do Interior. Outros países europeus têm tentado levar a cabo esta medida, para imigrantes de fora da UE: a União Europeia criou um fundo de 676 milhões de euros em cinco anos para a repatriação voluntária de imigrantes ilegais.

Em 2007, a imigração atingiu no Reino Unido um pico de 237 mil por ano (a recessão fez entretanto com que caísse). A maioria dos imigrantes é de origem asiática.

França

Há cerca de duas semanas terminaram seis semanas de protestos de imigrantes ilegais em Paris. Os sans-papiers exigiam documentos que lhes permitissem trabalhar e protestaram contra as leis aprovadas em Novembro que dificultam as reunificações familiares e facilitam as expulsões dos ilegais, que serão cerca de meio milhão.

Este não é o único caso polémico em relação à imigração em França: o Governo de Nicolas Sarkozy anunciou a intenção de fazer com que quem queira naturalizar-se tenha de assinar uma carta de direitos e deveres - um "contrato para ser francês". Esta carta porá a tónica no "respeito pela república e em especial pelo princípio de igualdade entre homens e mulheres", segundo o primeiro-ministro francês, François Fillon. O tema da integração versus tradição tem sido bastante explorado com a questão da proposta de proibição do véu integral (burqa ou niqab). O Executivo gaulês tenciona ainda que a assinatura desta carta seja feita numa sessão solene, como a cerimónia britânica (ou espanhola). Todos os anos, cerca de 100 mil estrangeiros adquirem a nacionalidade francesa - ou seja, quatro por cento da população estrangeira em França, dizem dados do Governo. A média europeia é de dois por cento.

Itália

O Governo de Sílvio Berlusconi tem feito correr muita tinta com as suas medidas drásticas contra a imigração ilegal - quem estiver ilegalmente no país pode ser multado até 100 mil euros e ser preso até seis meses, enquanto quem hospedar imigrantes sem documentos poderá ser condenado a até três anos de prisão; além disso, médicos que tratem imigrantes clandestinos podem agora reportá-los às autoridades.

Entretanto, o país prepara um sistema de pontos para a autorização de residência, uma ideia da Liga Norte, um dos partidos da coligação governamental. O Ministério do Interior anunciou no mês passado este procedimento, para jovens com idades entre os 16 e os 25 anos que queiram viver em Itália. O candidato tem de assinar um "pacto de integração", comprometendo-se a respeitar uma carta de valores de boa cidadania.

O imigrante começa com 16 pontos, e o objectivo é obter 30. Os pontos são conseguidos com a frequência de cursos de treino vocacional, contratos para arrendar ou comprar casa, ou ainda trabalho voluntário, explica a agência noticiosa Ansa. Se faltar aos cursos ou for condenado por crimes ou delitos fiscais, perderá pontos. Caso perca todos os 30 pontos, o imigrante será expulso.

No início deste ano, os trabalhadores estrangeiros organizaram um dia de greve com o objectivo de protestar contra as leis de imigração, cada vez mais apertadas, e de mostrar como são importantes para a economia italiana. O número de estrangeiros a residir em Itália é de quase quatro milhões, quase o dobro do número de 2001. Todos os anos chegam cerca de 37 mil imigrantes ao país.

Espanha

As medidas de integração em Espanha variam conforme as administrações locais, mas os cursos de integração para imigrantes que os queiram fazer são comuns. Após um a cinco anos de residência, os imigrantes podem pedir a nacionalidade, que receberão se tiverem demonstrado "boa conduta cívica" e "um grau suficiente de integração", explica o diário espanhol El País. A cidadania é concedida numa cerimónia solene com uma promessa de fidelidade ao Rei e obediência à Constituição.

A Espanha só aprovou recentemente legislação para facilitar que cientistas estrangeiros trabalhem no país, em linha com uma directiva da UE de 2005 : aliás, o facto de a Espanha ter sido demasiado lenta a aplicar esta directiva tinha dado origem a um processo da Comissão Europeia no Tribunal de Justiça da UE.

Espanha tem 5,7 milhões de imigrantes numa população de mais de 46 milhões (cerca de 12 por cento).

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