Francisco George: "Quem é contra a vacina não tem fundamento científico"

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O responsável diz que o pico da pandemia não será imediato Raquel Esperança

Na segunda-feira arranca a vacinação contra a gripe A. O director-geral da Saúde garante que está tudo a postos para os primeiros grupos de risco: grávidas no segundo e terceiro trimestre com patologia grave associada, profissionais de saúde insubstituíveis e trabalhadores de sectores essenciais. Em entrevista ao PÚBLICO e à Rádio Renascença, Francisco George explica que Portugal soma já 20 mil casos de infecções, pelo que a vacina chegou antes do pico da pandemia e a tempo de travar as piores previsões. Sobre a resistência à vacina, diz que tudo não passa de "crenças".

Neste momento, qual é a verdadeira dimensão da gripe A em Portugal? O número de casos é mais baixo que o esperado?

No dia 18 de Outubro, tínhamos confirmados no laboratório 4814 casos. Mas cumulativos sem confirmação laboratorial temos 15.081, o que perfaz cerca de 20 mil. O vírus da gripe que emergiu em Abril não é um grandekiller. Mas não podemos ignorar que podem surgir casos graves.


A vacinação arranca na segunda-feira para os primeiros grupos. Está tudo a postos?

Tudo foi feito para, em termos globais, a resposta ser rápida e o plano de contingência português refere que a vacina estaria disponível no prazo de seis meses e que as medidas de contenção para atrasar a propagação da epidemia deviam ser tomadas para dar tempo à chegada da vacina. A campanha vai iniciar-se na segunda-feira para cerca de 55 mil portugueses.


Como foram seleccionados os grupos de risco?

O que pretendemos é proteger os portugueses que possam ter uma evolução mais complicada, vindo a fazer parte do um por cento dos casos graves. E também quisemos proteger as pessoas que desenvolvem trabalhos dificilmente substituíveis. A campanha tem sempre estes dois princípios: proteger quem está mais vulnerável e assegurar que os centros vitais do país continuam a funcionar.


Mas há muitos "anticorpos" a esta vacina entre os profissionais de saúde... O próprio bastonário da Ordem dos Médicos, Pedro Nunes, disse que a gripe era tão "banal" como a sazonal.

Por que é que há tanto empolamento de opiniões sem fundamentação científica? Aqueles que são contra a vacina integram movimentos de opinião que não têm fundamento de base científica. Não há evidência nenhuma para se ser contra. São crenças que existem mas vão passar. A vacina contra a gripe existe há 60 anos com total segurança. Eu serei vacinado quando for a minha vez. Penso que poderei ser incluído nos cinco por cento de profissionais que desempenham funções essenciais.

Os titulares dos órgãos de soberania também foram considerados prioritários. Quem vai ser vacinado e onde?

Na Presidência da República, uma equipa de vacinação irá ao Palácio de Belém. A Assembleia da República vai identificar os deputados que pretendem ser vacinados. Poderiam ser todos. Mas nós estamos num país onde não há nenhuma vacina nem nenhum tratamento que seja obrigatório.


As embalagens de vacinas têm dez doses que devem ser usadas em 24 horas. Vai haver horários específicos nos centros de saúde?

Isso já acontecia no Plano Nacional de Vacinação. Vamos administrar até ao final do ano um milhão de doses de vacinas e temos capacidade instalada e de resposta. Depois seguir-se-ão cinco milhões de doses e, em função da análise do que se passou antes, saberemos se será ou não necessário aumentar o pessoal.

E se a farmacêutica aumentar o volume de entregas ou a agência europeia do medicamento decidir que basta uma dose para o doente ficar imunizado?

Nesse caso serão mais portugueses protegidos. Nenhum cidadão terá de pagar para ser imunizado.


Mas é estranho que nesta fase ainda não se saiba se é necessária uma ou duas doses.

Não podemos fazer determinados estudos sem tempo. Os primeiros testes e os primeiros ensaios concluíram que a vacina tem uma resposta muito eficaz por parte do sistema imunitário. Mas temos de aguardar.


Está afastado o cenário mais negro, que falava em 650 mil infecções na pior semana?

Eu nunca fui muito amigo de fazer cenários. Em matéria de gripe, não há bola de cristal. Todos os anos é diferente. É imprevisível quando começa e quanto tempo dura. Agora o que sabemos é que vamos ter actividade epidémica no país e sabemos que vai haver um eclipse das estirpes sazonais que serão substituídas pela estirpe nova, como aconteceu no hemisfério Sul. Em Portugal, admitindo um cenário desses, falamos de um a um milhão e meio de casos.


Falou-se de um cenário diferente. Houve uma correcção?

Esses cenários são desenhados sem medidas de correcção e sem medidas de saúde pública. As estimativas em termos de saúde pública servem para preparar o sistema para essa pressão. Como temos vacina vamos ter menos problemas, mas não sabemos exactamente o que poderá acontecer no Outono.


A situação será diferente do que se passa todos os invernos com a gripe sazonal? Há capacidade de resposta?

Vai ser muito diferente. A gripe sazonal é um problema de idosos e a gripe pandémica é um problema de jovens. Temos 80 por cento dos casos em pessoas com menos de 30 anos. Admitimos um cenário muito semelhante ao do hemisfério Sul, com desaparecimento e substituição das estirpes sazonais.


Já se sabe quando será o pico da gripe A em Portugal?

Quando houver duplicação de casos semanais, como aconteceu em Agosto, podemos antecipar em duas ou três semanas o que virá a acontecer. O pico não é eminente. Estou confiante. Não é uma questão de optimismo porque, infelizmente, há doentes e há problemas que vão sempre surgindo em famílias. Tivemos três óbitos e temos aqui problemas que não podem ser ignorados.


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