Nova formação do Conselho de Bioética pode favorecer o Governo

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O ex-conselheiro durante 15 anos alerta para a hipótese do Conselho ficar ao serviço de uma força política Fernando veludo (arquivo)

Para o médico e especialista em bioética Daniel Serrão, ex-conselheiro do CNECV, lugar que ocupou 15 anos, esta situação pode ser a morte do organismo consultivo que devia mostrar mais diversidade ideológica.

Segundo a nova lei que rege a formação e competência do CNECV - a lei 24/2009 de 29 de Maio -, são eleitos 19 membros, menos dois que os 21 da formação anterior. E os organismos que nomeiam os membros, bem como o número de membros eleitos por cada um dos organismos, sofrem algumas alterações.

O CNECV passa ainda a reportar à Assembleia da República e não ao Conselho de Ministros, como acontecia. E o presidente deixa de ser designado pelo primeiro-ministro e passa a ser eleito pelos pares.

A Assembleia da República nomeia seis membros, tal como acontecia na legislação anterior. E mantém-se uma lógica de eleição onde impera uma ideologia de Bloco Central: os elementos são designados apenas pelo PS e PSD. Feitas as contas, no contexto actual, o Partido Socialista tem direito a eleger quatro deputados, e o PSD os restantes dois.

Nomeados pelo Parlamento…

Da nova formação do CNECV constam os nomes designados pelo Parlamento da especialista em bioética, eurodeputada e assessora de Cavaco Silva Maria do Céu Patrão Neves, designada pelo PSD, e do obstetra Miguel Oliveira da Silva, de Lisboa, do obstetra e especialista em reprodução medicamente assistida Agostinho Almeida Santos, de Coimbra, e do geneticista Jorge Sequeiros, da Universidade do Porto, designados pelo PS. Todos estes quatro nomes foram reconduzidos do mandato anterior. As duas novidades nos nomes indicados pela AR são o bioquímico da Universidade do Porto Francisco Carvalho Guerra, designado pelo PSD, e o ex-bastonário da ordem dos Médicos Germano de Sousa, indicado pelo PS.


e pelo Governo

Depois, o Governo, através da Presidência do Conselho de Ministros, designa ainda mais cinco personalidades – o constitucionalista Jorge Novais (ex-assessor de Jorge Sampaio e defensor do novo Estatuto dos Açores, vetado por Cavaco Silva), Lígia Amâncio (socióloga e vice-presidente da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, órgão financiador do sistema científico nacional), a investigadora e especialista em imunologia Maria de Sousa (da Universidade do Porto), o neurologista Rosalvo Almeida (ex-mandatário dos Médicos pela Escolha) e ainda a médica Isabel Pereira dos Santos.


Contando com os nomeados pelos dois organismos tutelados pelo Governo, a Fundação para a Ciência e Tecnologia e pelo Instituto de Medicina Legal – a patologista Raquel Seruca e o presidente do IML Duarte Nuno Vieira, respectivamente – são 11 as personalidades designadas pelo PS ou pelo Governo, número maioritário entre os 19 conselheiros.

“Se o Governo pretender que o Conselho de Bioética fique ao seu serviço, mata o Conselho de Bioética”, alerta Daniel Serrão que defende que a diversidade ideológica dentro do grupo sempre foi uma marca de água do CNECV. “Havia sempre uma diversidade de pontos de vista que emanava dos relatórios anuais”. O médico frisa ainda a importância que teria a representação de outros sectores políticos: “As outras famílias políticas deviam ter oportunidade de escolher uma personalidade, sempre uma pessoa acima de qualquer suspeita. Não é de uma designação política que aqui se trata”.

A Ordem dos Enfermeiros passa a nomear um representante e desaparece da lista de entidades com capacidade para designar membros a Comissão para a Igualdade e Direitos das Mulheres, facto criticado pelo conselheiro Jorge Sequeiros.

Para Paula Martinho da Silva, jurista, especialista em bioética e conselheira durante 15 anos (foi presidente no último mandato designada por Durão Barroso), a discussão do testamento vital, depois do CNECV ter emitido um parecer contra o projecto de lei sobre esta questão, a 16 de Julho, será um dos temas prioritários para a nova formação do CNECV.

Jorge Sequeiros garante que não há, para já, temas definidos para arrancar. A primeira reunião do grupo será no dia 14 de Setembro.

Nem Daniel Serrão nem o neurocirurgião João Lobo Antunes, relatores do parecer sobre o testamento vital, se mantiveram na formação nova do conselho. Se Daniel Serrão, designado pela Academia das Ciências, pediu para não ser reconduzido, já a não recondução de Lobo Antunes terá causado alguma apreensão, nomeadamente para Cavaco Silva, dizia ontem o semanário Sol.

Lobo Antunes é conselheiro de Estado e foi mandatário da sua candidatura à presidência. Daniel Serrão, que por várias vezes foi chamado ao parlamento para dar o seu parecer, enquanto especialista, sobre outros diplomas, frisa que nunca foi chamado para opinar sobre a questão do testamento vital.

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