Deputado socialista acusa Mário Lino de "manifesta negligência" no caso dos Airbus

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Cresce a polémica em torno dos aviões Airbus comprados pela TAP Pedro Cunha

Ventura Leite, deputado do PS e autor do relatório parlamentar sobre acompanhamento dos processos das contrapartidas, lançou ontem um apelo ao primeiro-ministro para que chame a si o controlo dos processos de construção do TGV e do novo aeroporto de Lisboa (NAL).

Pede que José Sócrates não os deixe à responsabilidade do ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, Mário Lino. Isto porque, justificou ao PÚBLICO, Mário Lino revelou "manifesta negligência" na gestão do processo de aquisição dos novos aviões da TAP, dado o "desperdício de oportunidades" de obter compensações para a indústria portuguesa num negócio que ascendeu a 2,5 mil milhões de euros.

"Houve manifesta negligência", afirmou Ventura Leite, reforçando as conclusões do relatório discutido anteontem em comissão parlamentar, cuja votação foi adiada para Fevereiro. "A partir de certo ponto, a repetição da negligência em detrimento do interesse do país poderá ter outra explicação", considera, sublinhando que "nenhum outro país repete os mesmos erros ao longo de tanto tempo". O relatório refere outros exemplos de falta de aproveitamento de contrapartidas em grandes negócios, como é o caso das compras de material militar (submarinos e helicópteros), apontando o dedo aos sucessivos governos por esse facto.

Sem querer levantar suspeições explícitas, o deputado de Setúbal que se encontra no seu primeiro mandato deixa perceber a preocupação de fundo: "Tem que haver outras causas para essa negligência, para além da inexperiência. Há no mínimo falta de vontade política e é preciso saber se esta aproveita a alguém." Por isso defenderá até ao limite a necessidade de se fazer uma auditoria ao negócio de aquisição dos Airbus pela TAP: "Nós [deputados] não estamos capacitados para apurar esse tipo de coisas, tem de ser uma entidade externa e independente a fazê-lo. Se me indicarem outra que não o Tribunal de Contas, perfeito."

A sua preocupação está, sobretudo, virada para o futuro, para os grandes investimentos públicos anunciados, TGV e NAL, rejeitando a visão destas obras como uma "mera soma de empreitadas". "Neste momento crítico a nível económico para o país, se não houver um bom aproveitamento e controlo destas obras, não tenho dúvidas de que o Governo espanhol apoiará as suas empresas como for preciso para ganhar todos os concursos de fornecimento de equipamento e serviços, incluindo os sleepers [travessas em que assentam os carris ferroviários]", afirma.

Por isso, apela ao primeiro-ministro, José Sócrates, a que "chame a si o controlo" destes investimentos e, com visão estratégica, se faça "o que se fez no caso das eólicas", defende este economista. "Portugal tem de assumir ao mais alto nível a liderança do processo, não o pode deixar em mãos de governantes que já mostraram a sua incapacidade", acusa, apontando o dedo tanto ao ministro Mário Lino como ao responsável pela pasta da Economia, Manuel Pinho, por "nunca ter assumido as suas responsabilidades no processo da TAP e ter remetido sempre para o MOPTC".

Lauak desmente Lino

A subsidiária portuguesa da Lauak garantiu ontem que nenhum dos seus contratos com a Airbus está ligado à compra de aviões que a TAP realizou junto deste fabricante e que nunca foi contactada por parte do Governo português para qualquer negócio nesse sentido.

"Nunca fui contactado directa ou indirectamente para qualquer negociação vinda da parte do Governo português e os contratos que temos com a Airbus vieram directamente da casa-mãe, em França", afirmou ontem ao PÚBLICO o administrador delegado da Lauak portuguesa, Armando Gomes.

O ministro das Obras Públicas, Mário Lino, garantiu diversas vezes, nos últimos dias, que empresas portuguesas viram os seus negócios aumentar por via de condições negociadas no âmbito da operação de compra da nova frota Airbus, pela TAP, em 2005 e 2007. Ao PÚBLICO o gabinete do ministro tinha entretanto concretizado que as empresas em causa são a Ogma e a Lauak.

Os responsáveis da Ogma, como noticiámos na edição de ontem, negam que os seus contratos com a Airbus, detida pela EADS, tenham a ver com a renovação dos aviões da TAP. A Ogma nota também uma redução geral do seu nível de encomendas, na qual se inclui a Airbus.

Em declarações ao PÚBLICO, o gabinete do ministro garantiu terem sido realizadas "visitas técnicas" a empresas portuguesas "na sequência das diligências do MOPTC" e que "ocorreram efectivamente e tiveram resultados concretos". Isto depois de a própria Airbus ter proposto cooperação com a indústria portuguesa.

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