Carta da Airbus contraria versão de Mário Lino sobre contrapartidas

A venda de dez Airbus à TAP está na origem da polémica
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A venda de dez Airbus à TAP está na origem da polémica Manuel Roberto (arquivo)
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A proposta de cooperação da Airbus com a indústria portuguesa, por ocasião da venda de dez aviões à TAP, em 2005, limitou-se à "concretização de alguns negócios" com a Ogma e com uma empresa francesa instalada em Palmela, a Lauak, segundo revelou a porta-voz do gabinete de Mário Lino, ministro das Obras Públicas.

O país pagou, através da TAP, 2,5 mil milhões de euros pela renovação da sua frota de aviões; as duas empresas tiveram contratos de fornecimento de serviços à EADS no valor de 18 milhões de euros, em 2007.

Não era essa a intenção da Airbus, que pretendia um programa de cooperação com a indústria nacional, como prova uma carta enviada ao Governo português em Setembro de 2005, a que o PÚBLICO teve acesso, e cujo processo passou à margem do Ministério da Economia. O relatório sobre contrapartidas que esteve ontem comissão parlamentar de Economia cita a carta e considera que a operação foi uma oportunidade perdida para o desenvolvimento da indústria.

Daniel Therial, então vice-presidente da Airbus, enviou uma carta a 14 de Setembro de 2005 ao secretário de Estado adjunto das Obras Públicas, Paulo Campos, a pedir-lhe notícias depois de um encontro ocorrido três meses antes na feira aérea de Le Bourget, em França, com uma delegação portuguesa liderada por Mário Lino. Daniel Therial recorda que o objectivo desse encontro, em que estiveram também o presidente da TAP, Fernando Pinto, e o embaixador João Rosa Lã, "era discutir a cooperação industrial com a indústria portuguesa" e que tinha sido acordado um "plano de acção" que não estava a ser cumprido.

O plano previa que o Governo enviaria à Airbus uma lista das empresas e das suas actividades que o fabricante deveria considerar para fins de cooperação. Por sua vez, a Airbus enviaria a Portugal uma equipa para visitar as empresas propostas "a fim de definir programas de trabalho [encomendas] adequados às suas capacidades". "Até ao momento não recebi nada do vosso lado. Por isso peço cordialmente que veja quando a informação relativa à rede industrial me será transmitida", prosseguia o gestor. O PÚBLICO sabe que o pedido foi a despacho do secretário de Estado adjunto da Economia, Castro Guerra, o qual nomeou o IAPMEI como interlocutor do ministério, com a assessoria do centro de inteligência em inovação Inteli, sua participada e a qual, recordava, estava a desenvolver iniciativas para o desenvolvimento de um cluster aeronáutico. Esse era o teor da sua resposta a Paulo Campos, que não teve seguimento.

Ontem, no Parlamento, Mário Lino disse ter elaborado uma lista de empresas, após "reuniões com o presidente da TAP", a qual foi enviada à Airbus. Seguiu-se, disse o ministro, "uma quase triplicação" das encomendas feitas pela Airbus a empresas portuguesas. A porta-voz do ministro informou ontem o PÚBLICO que as empresas em causa são a Ogma e a francesa Lauak. Mário Lino sustenta ainda que a TAP poupou com a negociação 1,6 mil milhões de euros, o equivalente a 64 por cento do valor dos Airbus, um desconto que não corresponde aos valores tradicionalmente avançados pelo mercado.

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