Fiscalistas duvidam da legalidade da aplicação de IVA na contribuição do audiovisual

A cobrança de IVA sobre a contribuição para o audiovisual "é de duvidosa legalidade" e um "precedente terrível" que pode levar à tributação de outras taxas, afirmaram hoje à Lusa Miguel Reis, especialista em media e em direito fiscal.

"A confirmar-se, é um absurdo e um precedente terrível que aponta para a sustentabilidade de uma teoria que tributa com IVA todas as outras taxas", afirmou à Lusa o advogado Miguel Reis, especializado em questões de media.

Na prática, adianta, significa lançar um imposto sobre um imposto, tal como seria cobrar uma taxa sobre a taxa de manutenção de esgotos", exemplificou.

O PÚBLICO noticia hoje que o Estado está a cobrar IVA sobre a contribuição para o audiovisual, paga pelos consumidores de electricidade para financiar as rádio e a televisão públicas, indicando que alguns clientes da EDP estão a receber facturas com a sobrecarga fiscal.

Segundo o jornal, aos 1,71 euros de contribuição para o audiovisual passaram a ser cobrados, desde 1 de Janeiro, mais cinco por cento de IVA, uma norma prevista no Orçamento de Estado para 2008.

"É um caminho perigoso", alertou Miguel Reis, que não tem dúvidas de que a contribuição para o audiovisual é uma taxa, na medida em que "corresponde ao pagamento pelo utente de um serviço".

Para o advogado de direito fiscal Tiago Caiado Guerreiro, trata-se de uma medida "estranha" e de "altíssima duvidosa legalidade". "Isto é pior do que uma taxa sobre uma taxa. É um imposto sobre uma taxa, parece-me bastante inovador", ironizou, especificando que "de certa forma são dois impostos".

No entanto, Tiago Caiado Guerreiro não se mostra espantado com a medida, considerando-a "mais do mesmo", já que não é a primeira vez que o Estado cria medidas "ardilosas" para ter mais receitas.

Para reduzir o défice, tem havido inúmeras normas, muitas vezes duvidosas, criadas e depois removidas ao fim de um ano para não dar tempo para as pessoas agirem contra as mesmas, porque o sistema judicial é lento, explicou.

"Como estas decisões não têm efeito retroactivo e o Estado não é pessoa de bem, não paga a todos os que prejudicou", acrescentou.

"O que fazem é: aprovam e sabem que a passividade das pessoas é total. Esperam até dar celeuma e retiram a lei, mas entretanto já ganharam dinheiro", especificou o fiscalista.

A contribuição do audiovisual foi criada em 2003 com o objectivo de financiar a RDP e RTP, sendo o pagamento feito nas contas de electricidade dos consumidores.

No primeiro semestre de 2007 (últimos dados disponíveis) o grupo RTP recebeu 54 milhões de euros através da contribuição para o audiovisual e em 2006 recebeu 100,4 milhões de euros.

Com esta cobrança de IVA, o Estado poderá encaixar à volta de seis milhões de euros anuais.

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