Primeira prisão vendida a privados foi comprada por ex-sócio de Alberto Costa
Criado em 1998 e instalado no antigo Convento de Brancanes, mesmo à entrada de Setúbal para quem vem de Azeitão, o Estabelecimento Prisional de Brancanes foi extinto pelo Ministério da Justiça em Maio do ano passado, por já não reunir as "condições de habitabilidade que as actuais normas" exigem.
Antes de se tornar prisão por escassos sete anos, o histórico convento, que possui um rico património de azulejaria do século XVIII e foi sede da Câmara de Setúbal após o terramoto de 1755, serviu de quartel militar ao longo de quase todo o século XX. Quando o Governo ali decidiu instalar uma cadeia para resolver o problema da sobrelotação das prisões, era então ministro da Justiça o socialista Vera Jardim, o edifício e os quase cinco hectares da propriedade foram reafectados por decreto ao Ministério da Justiça. Para efeitos da compensação financeira prevista na lei nestes casos, o conjunto foi avaliado em 800.000 contos (4 milhões de euros), valor que o Ministério da Justiça pagou ao Ministério da Defesa.
Vendidos à EstamoNo final de Maio do ano passado, semanas depois da extinção do estabelecimento prisional, o Convento de Brancanes e os terrenos envolventes foram vendidos pelo Estado à imobiliária Estamo, uma empresa de capitais exclusivamente públicos, para que esta procedesse à sua alienação. Nesse mesmo mês, ainda antes de se tornar proprietária, a Estamo requereu à Câmara de Setúbal que alterasse o Plano Director Municipal, por forma a que na antiga cadeia pudessem ser construídos 18.300 m2 de habitação e equipamentos hoteleiros ou de saúde.
A diligência, que ainda não teve resposta, destinava-se a valorizar a propriedade, que goza de uma localização privilegiada, e a torná-la mais apetecível para o mercado imobiliário. Antes disso, no início de Maio, a Estamo fez publicar em dois jornais diversos anúncios em que dizia aceitar propostas até 11 de Junho para vender o imóvel designado Convento de Brancanes, com cerca de 46.000 m2.
De acordo com a informação transmitida ao PÚBLICO pelo gabinete do ministro da Justiça, foram feitas dez propostas, sendo que a melhor foi a da firma Diraniproject III, com "cerca de 7 por cento acima do segundo classificado, pelo que a venda lhe foi adjudicada". O valor do negócio não foi revelado, nem a identidade dos outros concorrentes, mas a escritura de compra e venda celebrada em Novembro entre a Estamo e a adquirente, representada pelo seu administrador único, António Lamego, mostra que esta pagou 3,4 milhões de euros - um preço particularmente interessante para o caso de ali virem a ser autorizados os 18.300 m2 de construção pedidos à câmara.
Feitas as contas à parcela deste total que a lei destina ao ministério a quem a propriedade estava afecta, o Ministério da Justiça vai receber um total de 3,108 milhões de euros, ou seja, menos 892 mil do que pagou ao Ministério da Defesa em 1998.
Por outro lado, a documentação do registo comercial evidencia que a Diranniproject III ainda não existia à data, anterior a 12 de Junho, em que foi apresentada a proposta que lhe permitiu ficar com o imóvel. A escritura da sua constituição foi celebrada apenas em 18 de Julho último, sendo que a totalidade do seu capital é detida pela Diraniproject SGPS, uma holding detida em 99,2 por cento por António Lamego e criada no mesmo dia.
Entre 2000 e 2005 este advogado foi sócio dos dirigentes socialistas Alberto Costa, António Vitorino e José Lamego (seu irmão) na sociedade de advogados criada por estes últimos em 1999 e dissolvida em 2005. Até 2004, António Lamego, que o PÚBLICO não conseguiu contactar, foi também gerente, mas não sócio, da Proteste, uma imobiliária criada por Alberto Costa e alguns dos seus colegas para comprar os escritórios onde aquela sociedade de advogados funcionava.