Mais um jornal de papel que “morre”

Sem ignorar que há um futuro intransponível no digital, o jornalismo não pode adiar também o que lhe dá o “seu próprio futuro”. E esta é que é a verdadeira questão.

Editado desde 1989, o Diário Económico deixou de ser publicado em papel no passado dia 18 deste mês. É mais um jornal que “morre”, porventura, cumprindo o destino fatídico do futuro que, por este andar, está traçado para tantos outros. E, sinceramente, com todo o respeito que possa ter pelos profissionais daquele jornal e da situação que lhes está criada, o que mais me perturba é o indicador de como mais este desaparecimento vai ameaçando a “morte” do próprio jornalismo. Estranho até o espanto de alguns profissionais daquele jornal sobre o inadiável fecho deste órgão. O jornalismo empresarial e “unidade de conta” neste sector industrial tem de ter consciência que subsiste se comercial e financeiramente é rentável. Ou então “morre”. Parece-me até uma certa consciência feita de boa esperança, mas ingénua, vir dizer-se que não se percebe como um jornal “líder de opinião” no sector (com uma tiragem média de cerca de 3mil exemplares mês!) pode acabar. As “obras de misericórdia” contínuas não fazem parte do mundo empresarial. E praticar o mecenato até é bom quando traz alguns lucros.

Mas, como dizia atrás, o que neste desaparecimento mais me preocupa, como cidadão, e aliás como provedor de um jornal que tem o dever de lutar contra este disfarçado e escondido “vírus” da democracia, é o “esfarelar-se” de mais um jornal, de modo tão fácil, qual um outro qualquer pedaço de papel de embrulho. E de como vai sendo “destituída” uma verdadeira componente estrutural do edifício da Democracia. A mediação, como valor baluarte na modernidade, de uma sociedade transparente, intercomunicativa, responsável, não é o simples funcionamento do transmissor dos relatos dos eventos/acontecimentos.  A mediação construída para a garantia de um viver social em liberdade, justiça, mútua responsabilidade, é um “dado de facto”, um constructo basilar do sistema liberal, aberto, dos Estados em funcionamento democrático. O que verdadeiramente é, cada vez mais, “jogo de aparências”, acto de representação para povo ver.

Confunde-me pesarosamente a “gratuidade” fácil, e porventura inconsciente, como o jornalismo, actor natural e com conferição institucional do exercício dessa mediação, vai cedendo o seu espaço, o seu lugar, a todos os outros campos de actividade, sem “identificar a identidade” do espaço social que lhe compete e reivindicando suas condições e direitos.

O jornalismo com esta sua fácil metamorfose, por via de razões subsistência ao plasmar do entretenimento e das transformações culturais, à enorme doação de espaço aos comentadores, na sua grande maioria falantes entre si, uns com os outros, com menos atenção e prática à investigação e à razão de ser da notícia, do acontecimento, está cada vez menos interrogativo, interpelativo. Por exemplo, faz dos eventos judiciais e criminais, relatos sequenciais, eleva-os atá autenticamente à categoria de novelas diárias, mas não interroga, não aprofunda como funciona o sistema da justiça. Não vai à procura de como se constroem esses grandes impérios empresariais ou potentados financeiros, e normalmente só narra, já tardiamente, a queda ou o desfazer-se dos mesmos. Não discute ou faz discutir esta conduta perigosa, e quiçá “assassina” para a destruição da Europa, destes actuais líderes da Comunidade Europeia, concretamente nesta negociação de troca de “compra” e “venda” com a Turquia de refugiados, ou a incompreensível negociação com David Cameron para evitar a eventual saída da Grã-Bretanha. O que se está a passar no Brasil, com a categoria de autêntico “caso de estudo” da autenticidade, suas causas e terríveis ameaças de onde pode chegar o fenómeno da mediação, - o Estado nu e desventrado nas ruas – é um acontecimento histórico na história da mediação que deve interpelar o jornalismo. E são situações sérias e sem controlo de efeitos perversos à vista e que ferem, e de que maneira, um Estado, que devem fazer o jornalismo interrogar-se sobre em que lugar está na História. Francamente, e deixem passar este meu comentário quase em tom de anedota, não é a dedicar tanto tempo de antena e porção de papel, a dizer que o novo Presidente de Portugal, tudo fará para que o OE de 2016 não seja publicado no 1º de Abril que abona a favor das coisas sérias do Estado. Se o OE está aprovado pela AR e vier a receber o OK do Presidente, ser publicado a 1 de Abril, por mais laracha que queiram alguns construir por, simbolicamente, ele poder ser a grande mentira do dia, é brincar com coisas que deveriam merecer de quem tem algum juízo outras posições.

Estas minhas considerações temerosas sobre o “morrer” do jornalismo de papel não gostaria que fossem catalogadas como a posição de um retrógrado e conservador face ao jornalismo digital. O próprio jornalismo (veja-se, por exemplo, o que se está a passar nos EUA com o revivalismo dos jornais de papel e de proximidade) ainda não entronizou mudanças específicas que este traz à mediação. E sem ignorar que há um futuro intransponível no digital, o jornalismo não pode adiar também o que lhe dá o “seu próprio futuro”. E esta é que é a verdadeira questão.

E é porque tenho a noção clara que nem tudo é tão cinzento e desesperante no panorama da revalidação da mediação e do jornalismo que não posso terminar este meu artigo sem relevar o excepcional trabalho de investigação que o PÚBLICO inseriu ontem em suas primeiras 15 páginas, o dossier “A grande conspiração por detrás da OPA de 341 milhões do MONTEPIO ao FINIBANCO”. Uma grande pedrada no charco em que está o sistema financeiro internacional e português. Um exemplo para a revitalização do jornalismo que não quer morrer.

 

CORREIO LEITORES/PROVEDOR

A ausência de Vasco Pulido Valente

Do leitor Ricardo D’Ascensão recebi a seguinte interpelação: “Hoje, após comprar o Público, fui surpreendido com a nota que informa, os leitores, que, até Outubro, o Colunista Vasco Pulido Valente (VPV) se encontrará ausente. Sobre a sua ausência, nada a apontar, está na esfera da sua autonomia. Porém, acerca da solução que o Público encontrará para preencher esse espaço, creio que o Provedor terá uma Palavra a dizer.” (…) “Portanto, será justo ocupar o espaço da Coluna do VPV com notícias, independentemente do seu valor jornalístico? (…) Destarte, só me resta requerer que o Provedor, junto da Direcção, tente sensibilizá-la para a necessidade de recrutar um novo colunista.”

Cartas dos Leitores

“Tenho tido muita dificuldade em me aceitarem a publicação das minhas cartas. Esta desde 29 de Fevereiro… Tenho reparado que só publicam cartas de homens. Terei alguma razão ou as mulheres deixaram de escrever para os Jornais? Lá vou à rua comprar o Público mas sem esperança de ver a minha carta.” Maria Clotilde Moreira

https://webmail.publico.pt/OWA/14.3.158.1/themes/resources/clear1x1.gif3.º Encontro de Leitores/Escritores de cartas à Direcçãohttps://webmail.publico.pt/OWA/14.3.158.1/themes/resources/clear1x1.gif

Por sua livre iniciativa e espontânea organização da leitora Maria Clotilde Moreira reuniram-se, no passado dia 13 de Março, na UNICEPE, no Porto, vinte e quatro leitores – escritores de cartas para jornais. Como nos escreve, neste seu relato, Maria Clotilde Moreira, “os leitores-escritores de cartas concluíram que é necessário que os jornais indiquem quais os critérios de seleção das cartas e não apenas o número de carateres.”   

Por sua vez, o leitor José Almeida Rodrigues, a propósito deste assunto, escreve-me uma carta com alguns desabafos e pertinentes reflexões, carta essa que vou inserir no blogue do provedor dos leitores.

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