E porque não já?

Uma amizade é uma concessão mútua de desmarcações.

O mal de marcar encontros com as pessoas de quem gostamos é ter de marcá-los. Aos 25 anos aprendemos que nem o mundo nem a amizade se arruina se os desmarcarmos. Aos 40 anos aprende-se que também nada se perde em não remarcá-los quando se desmarcam.

Pode ficar tudo em aberto. Tudo em aberto é bom. Marcar é clínico e frio e oportunista. Uma amizade não é uma reunião de sócios. Nem sequer é uma consulta. Uma amizade é uma concessão mútua de desmarcações.

O Pedro Rolo Duarte e eu, por sermos muito amigos, almoçamos todas as quartas-feiras desde 2006 "sem ser preciso desmarcar". São estas quatro libertárias palavras que só os grandes amigos podem combinar, compreender e praticar.

Há 10 anos que não almoçamos juntos. E não é como se almoçássemos. Não. É pior. Mas é bom porque nos aceitamos um ao outro. E porque já passámos muito tempo, muito bom, um com o outro.

Conseguimos imaginar o que diríamos perante todas as meras circunstâncias das nossas vidas. Mas, mais do que isso, surpreendemo-nos com isso. E rimos. Rir é o vir da vida. E rir ao mesmo tempo e pela mesma razão que se ri quem se ama está para o rir sozinho como foder está para a punheta.

Falámos ao telefone às onze e meia. Ao meio-dia e meia estávamos a almoçar com os nossos amigos. Parecíamos crianças, se é que as crianças são capazes de tal alegria. Acho que sim, que são. Foram elas, afinal (ou seja, nós há muito tempo), que nos ensinaram as palavras mágicas: "E porque não já?"

 

 

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