Eleições EUA: morreu o Anticristo, é hora da parusia
Bem-vindos à parusia – a segunda vinda de Trump, perdão, de Cristo à terra. E todos os crentes em São MAGA – a Nova Jerusalém – viverão em paz e felicidade.
Kamala Harris ou, como os apoiantes de Donald Trump carinhosamente a apelidaram, o Anticristo, foi derrotada. Foi a paga pelo cataclismo deixado pela administração Biden da qual fez parte.
Um legado satânico que deixou um país devastado por uma taxa de desemprego de pouco mais de 4% (muito abaixo da média dos países da OCDE). Uma economia que teima em ser catastroficamente a maior do mundo, provavelmente desde os finais do século XIX, e que cresceu a uma taxa anualizada de quase 3% no último trimestre. Uns salários que, não obstante o pico da inflação (já normalizada), têm crescido a uma taxa ajustada de 3,9%. Um país onde os democratas prometiam para o futuro um fim dos tempos com o reforço do Affordable Care Act, a proteção dos direitos reprodutivos, um acordo bipartidário para o sistema de imigração e a recuperação e reforço de ligações diplomáticas, tendencialmente, com regimes mais democráticos.
Foi nesta batalha épica, entre as forças do bem, encabeçadas por Trump, e as do mal, lideradas por Harris, que se abriu espaço para a volta de Jesus Cristo à terra. Ou, como Trump lhe chama, o estabelecimento do reino milenar do MAGA.
O imaginário trumpiano pretende recuperar a América das cinzas deixadas pelo Anticristo. Diz que vai voltar a colocar a divina América no lugar onde merece, o topo, a Babel de onde nunca saiu; vai recuperar os empregos que os egrégios trabalhadores não perderam; vai trazer a indústria gloriosa (ex. automóvel) que a América decidiu que devia dar lugar a outra liderada pelos novos milionários digitais americanos; vai proceder à maior deportação em massa de imigrantes ilegais, profanos, que não merecem pisar a terra sagrada construída e constituída toda ela por imigrantes e seus descendentes; vai alinhar com as “democracias musculadas”, por exemplo a Hungria de Viktor Orbán, qual São Jorge a combater o dragão perverso das democracias liberais, fundadas pela própria Guerra da Independência dos EUA.
Bem-vindos à parusia – a segunda vinda de Trump, perdão, de Cristo à terra. E todos os crentes em São MAGA – a Nova Jerusalém – viverão em paz e felicidade.
Se pensa que é, novamente, passageiro, desengane-se. Tal como na escatologia cristã, o número três está associado à parusia, na medida em que Trump-Cristo regressará em três fases distintas: Casa Branca, Senado e Câmara dos Representantes. Se acha que são apenas mais quatro anos e que depois passa, desengane-se. Tal como Cristo teve o apóstolo Paulo, Trump teve o apóstolo Musk, aquele que amplificou a sua mensagem, distribui cheques sublimes, desinformou, literalmente, todo o mundo e, sobretudo, como na escatologia paulina, ressuscitou Trump dos mortos.
Não sei se já o disse, por isso, permita-me ser mais claro – se considera que é só um mais um momento na história e que já passa, desengane-se. Embora o delfim não seja uma imagem muito cristã, Trump já tem um: J. D. Vance. Não se sabe se tem as mesmas qualidades divinas do seu presidente. Contudo, sabemo-lo muito crente, católico. E de quem o leu, analisou e comentou, sabemo-lo potencialmente mais capaz de carregar a cruz MAGA mais longa e competentemente.
No final dos tempos, com a volta de Cristo, diz-nos a Livro do Apocalipse, todos seremos julgados pelos nossos atos e receberemos uma recompensa ou um castigo. Uma vez que o filho (Trump) regressa à terra para recuperar e estabelecer o seu reino milenar, acho mais prudente orarmos ao pai. Assim sendo, aqui vai: “Deus tende piedade de nós”.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico