Profissionais das USF geridas por privados não podem ter vínculo com SNS nos três anos anteriores
Decreto-lei que altera o regime jurídico de organização e funcionamento das unidades de saúde familiar (USF) foi promulgado no sábado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Os profissionais de saúde das unidades de saúde familiar modelo C, que serão geridas pelos sectores privado e social, não podem ter vínculos permanentes com o Serviço Nacional de Saúde nos últimos três anos, excepto em casos de formação especializada ou aposentação.
A medida consta do decreto-lei que altera o regime jurídico de organização e funcionamento das unidades de saúde familiar (USF), aprovado pelo decreto-lei nº 103/2023, de 7 de Novembro, e promulgado no sábado pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.
Segundo o diploma, os sócios ou accionistas das entidades contratadas também "não podem ter ou ter tido qualquer tipo de vínculo contratual por tempo indeterminado ou sem termo, consoante o caso, ao sector público da saúde nos últimos três anos à data do termo do prazo para apresentação da candidatura", excepto contratos com objectivo de formação especializada ou situações de aposentação ou reforma.
Segundo o Governo, as USF modelo C têm carácter complementar às do modelo B e são constituídas para "colmatar as necessidades verificadas numa determinada unidade local de saúde (ULS), no âmbito da prestação de cuidados de saúde primários". Serão, dito de modo simplificado, "centros de saúde" com médicos, enfermeiros e pessoal administrativo contratados pelo sector privado ou por misericórdias e visam dar resposta aos cidadãos que não têm médico de família. Em Agosto, eram um milhão e 675 mil os portugueses sem médico de família atribuído.
As USF modelo C devem assegurar a prestação de cuidados em articulação com as unidades na área de influência em que são constituídas, para assegurar "uma gestão mais eficaz e uma resposta mais rápida às necessidades dos utentes".
O número de USF modelo C a constituir será estabelecido anualmente por despacho dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das Finanças e da Saúde, adianta o decreto-lei, consultado pela agência Lusa. O processo de constituição dessas unidades será realizado por meio de um procedimento aberto ao mercado, conforme as normas do Código dos Contratos Público, ou por recurso à celebração de contrato para a prestação de cuidados de saúde.
O início "do caminho da privatização"
As USF Modelo C estão previstas no Plano de Emergência da Saúde e têm como principal objectivo "a resposta integrada e eficiente do sistema de saúde português, em benefício das pessoas e das suas famílias, em particular, e da saúde pública, em geral". A sua criação, porém, foi encarada por vários responsáveis do sector, como o antigo director-geral da Saúde, Constantino Sakellarides, e o presidente da Associação Nacional das Unidades de Saúde Familiar, André Biscaia, como "o início do caminho da privatização" dos centros de saúde.
"São soluções rápidas que abrem o caminho para a privatização dos cuidados de saúde primários. É uma lógica errada porque estão a criar soluções privadas que vão retirar recursos ao SNS", considerou Sakellarides em declarações ao PÚBLICO.
Numa nota publicada no sítio oficial da Presidência da República na Internet, Marcelo Rebelo de Sousa diz que promulgou este decreto-lei "considerando que a presente versão é mais clara quanto ao cabimento na Lei de Bases da Saúde e na legislação aprovada sobre as USF tipo C no último Governo constitucional e esperando que a aplicação deste regime permita ajudar a resolver necessidades muito urgentes de vazio de médicos de família". As unidades de saúde familiar modelo C, recorde-se, não são uma novidade em termos legislativos, vindo já do tempo do ministro socialista Correia de Campos.
O chefe de Estado espera também que esta alteração legislativa feita pelo executivo PSD/CDS-PP "seja mais do que um remendo para ganhar tempo e envolva uma visão global dos cuidados primários, incluindo as USF de outros tipos, peças essenciais do Serviço Nacional de Saúde (SNS)", lê-se na mesma nota.