Grada Kilomba finalista para criar memorial das vítimas da escravatura em Londres

Artista portuguesa concorre com o projecto Arqueologia da Contemplação, partindo do barco como metáfora da memória dos que foram transportados como carga pelos europeus.

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Grada Kilomba é uma das mais internacionais artistas portuguesas Matilde Fieschi
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A artista portuguesa Grada Kilomba está entre os seis finalistas do concurso para o Memorial às Vítimas da Escravatura Transatlântica a erguer em Londres, cujo vencedor será anunciado no final do ano, anunciou a Câmara Municipal da capital britânica.

O projecto Arqueologia da Contemplação utiliza a imagem de um barco como metáfora da memória, recordando aqueles que foram transportados como carga pelos britânicos e por outras nações.

A proposta de Grada Kilomba inclui um plinto rectangular com 11 metros de comprimento sobre o qual serão colocadas 140 peças fundidas em bronze negro na forma de um navio para simbolizar o transporte de escravos e 18 peças de bronze dourado em homenagem às vítimas.

Um poema da artista portuguesa, traduzido para seis línguas de comunidades descendentes da diáspora africana em Londres, será inscrito na escultura.

"Proponho uma escultura poética para promover a reflexão sobre a Passagem do Meio. A Passagem do Meio foi a viagem brutal de milhões de africanos escravizados através do Atlântico para trabalhos forçados nas Caraíbas e nas Américas", descreve a artista.

O novo monumento, o primeiro do género no Reino Unido, cuja inauguração está prevista para 2026, conta com um financiamento de 500 mil libras (590 mil euros), atribuído pelo presidente da Câmara, Sadiq Khan.

A iniciativa inclui um programa pedagógico para reflectir sobre as experiências e a resistência dos africanos escravizados e sobre o papel de Londres na organização e no financiamento do comércio de escravos.

Os outros artistas finalistas são Alberta Whittle, Helen Cammock, Hew Locke, Khaleb Brooks e Zak Ové.

O memorial ficará situado no West India Quay (Cais das Índias Ocidentais), na zona das Docas, uma área situada junto ao rio Tamisa onde ainda subsistem edifícios em tempos usados para armazenar o açúcar vindo das plantações das Índias Ocidentais onde trabalhavam homens, mulheres e crianças escravizados.

Esta relação histórica com a escravatura transatlântica já é reconhecida pelo Museu das Docas.

O memorial ficará perto do local onde uma estátua do negociante de escravos escocês Robert Milligan (1746-1809) permaneceu até ser removida em 2020, por pressão do movimento Black Lives Matter.

Grada Kilomba propõe substituir o plinto onde estava aquela estátua por uma área para as pessoas se sentarem para "recordar e contemplar".

A artista esteve no grupo de cinco criadores convidados a apresentar uma proposta para um memorial da escravatura em Lisboa, concurso que haveria de resultar, em Março de 2020, na escolha do artista angolano Kiluanji Kia Henda. Mais de quatro anos depois, o memorial continua por instalar no local designado, o Campo das Cebolas.

Nascida em 1968 em Lisboa, Grada Kilomba vive e trabalha em Berlim, na Alemanha, onde completou um doutoramento em Filosofia. Com raízes em São Tomé e Príncipe e Angola, tem trabalhado as questões do racismo, do pós-colonialismo, da memória, do trauma e do género.

As suas obras foram exibidas em eventos como a décima Bienal de Berlim, a Documenta 14 de Kassel, a Bienal de Lubumbashi VI, e a 32.ª Bienal de São Paulo, assim como em vários museus e teatros internacionais. A artista integrou ainda a equipa curatorial da última edição da Bienal de São Paulo.

A instalação e performance O Barco foi apresentada na Somerset House, em Londres, em 2022. Em Portugal, passou um ano antes pelo MAAT, em Lisboa, abrindo a bienal BoCA.

Como suportes para seu trabalho, a artista portuguesa tem escolhido a performance, a leitura cénica, o texto, o vídeo e a instalação, estando representada em colecções públicas e privadas como a da Tate Modern, em Londres.

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