O primeiro atleta olímpico da Palestina morreu em Gaza, num campo de refugiados

Majed Abu Maraheel tinha 61 anos. “Correu nas pistas de Atlanta, em 1996, com lágrimas nos olhos. Fez o mundo parar e olhar para a Palestina.”

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Majed Abu Maraheel (à direita) enquanto treinava o corredor Bahaa al-Farra Mohammed Salem/Reuters
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Para a história pouco importa a classificação de Majed Abu Maraheel no momento em que cruzou a meta na corrida masculina dos dez mil metros nos Jogos Olímpicos de Verão de 1996, em Atlanta. Ele já era o primeiro atleta olímpico da Palestina.

Por estes dias, transmite-se uma história diferente, a de que o primeiro atleta palestiniano a participar nos Jogos morreu na terça-feira, dia 11 de Junho de 2024, no campo de refugiados Nuseirat, em Gaza, por insuficiência renal devido a cortes de energia e à escassez de cuidados médicos em consequência da guerra israelita em curso e do cerco ao enclave.

Majed Abu Maraheel, corredor de longas distâncias, sucumbe aos 61 anos depois de ter sido literalmente o primeiro porta-bandeira do povo palestiniano nos Jogos Olímpicos, testemunha do famoso "espírito olímpico" e o atleta que abriu portas para que outros atletas da Palestina pudessem competir em provas olímpicas — mais de vinte até aos nossos dias.

“Ele era um ícone palestiniano e permanecerá como tal”, disse o seu irmão à Paltoday TV após o funeral. “Tentamos retirá-lo para o Egipto, mas a fronteira de Rafah foi fechada e o seu estado continuou a piorar”.

A morte de Abu Maraheel deixa à vista o destino sombrio de muitos palestinianos em Gaza que enfrentam doenças crónicas graves para além da destruição provocada por Israel desde Outubro de 2023. Em Março deste ano, um relatório da Euro-Med Human Rights Monitor concluía que havia entre mil a 1500 pacientes em Gaza com insuficiência renal perante uma "morte lenta" devido à "falta de serviços médicos e terapêuticos, medicamentos e outras necessidades".

Desde o início deste capítulo do conflito que as forças israelitas lançaram um cerco total ao enclave, tendo sido destruídas hospitais e infra-estruturas de saúde de Gaza. Segundo uma investigação (de Maio) do norte-americano The Washington Post, apenas quatro dos 36 hospitais de Gaza não terão sido destruídos e invadidos pelas forças israelitas.

Na sua página de Facebook, a Federação Palestiniana de Atletismo disse: "O grande foi. O bom foi. O nosso corredor olímpico desapareceu. Ele carregou a bandeira e correu nas pistas de Atlanta com lágrimas nos olhos. Ele fez o mundo parar e olhar para a Palestina em 1996."

A morte de Abu Maraheel também sublinha o preço que a guerra em curso tem custado aos atletas palestinianos. Dos mais de 37 mil mortos por Israel contabilizados em sensivelmente oito meses, mais de 300 eram atletas ou dirigentes desportivos, segundo o chefe do Comité Olímpico Palestiniano, Jibril Rajoub.

“Apesar de todas as dificuldades, dos desafios e da atmosfera geral, temos atletas qualificados”, apontou Rajoub durante uma conferência de imprensa em Ramallah, referindo-se por exemplo ao atleta de taekwondo Omar Yaser Ismail, que se tornou no primeiro atleta palestiniano desta modalidade a ganhar um ingresso para os Jogos e o primeiro do seu país a classificar-se directamente num desporto de combate olímpico. “Acredito que teremos entre seis a oito [atletas em Paris].”

Rajoub aproveitou a circunstância para dizer que um halterofilista perdeu 20kg devido à crise humanitária causada pela guerra e para lembrar a importância dos Jogos de Paris como alerta para a destruição de Gaza e a ocupação ilegal da Cisjordânia, onde mais de 500 palestinianos foram mortos desde 7 de Outubro. “Paris é um momento histórico e um grande momento para ir até lá e dizer ao mundo que é hora de dizer basta." "Enquanto continua com os seus crimes, Israel perdeu o direito legal e o direito moral de comparecer [nos Jogos Olímpicos]".

Apesar da pressão internacional — e da petição online — para que Israel seja excluído da competição, o Comité Olímpico Internacional nada deliberou nesse sentido.

Majed Abu Maraheel completou os seus estudos básicos e preparatórios nas escolas da UNRWA — outro dos alvos de Israel —, obteve o diploma do ensino secundário na Escola Secundária Khaled bin Al-Walid, em Nuseirat, e obteve um diploma de Língua Árabe na Casa dos Professores. Começou a carreira desportiva em 1981 para, já depois do momento histórico nos Jogos dos Estados Unidos, ter ingressado no Instituto de Leipzig, na Alemanha, em 1998, como o primeiro estudante palestiniano a obter um certificado avançado em treino de atletismo. Foi olheiro e treinador de vários talentos. Era frequentemente visto nas suas corridas diárias em Gaza, desde a sua casa até à passagem de Erez.

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