A selecção da Hungria vs. a Hungria de Orbán

Orbán, conhecido pelas políticas anti-imigração, não parece ter problemas com o plantel da Hungria, que, este sábado, se estreia no Euro 2024 frente à Suíça.

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Orbán no Euro 2016 © Sergio Perez / Reuters
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Iliberal, extremista, radical. Todas estas palavras já foram usadas para descrever Viktor Orbán, primeiro-ministro húngaro, e a sua visão da política externa. No entanto, apesar de abertamente anti-imigração, o político parece fechar os olhos quando se trata da selecção nacional húngara.

Desde 2010, data da reeleição de Orbán, que a Hungria vive numa bolha de discursos de extrema-direita e a homogeneidade étnica não é um desejo escondido. Mas neste sábado, uma selecção húngara não exclusivamente composta por nativos húngaros, estreia-se contra a Suíça no Euro 2024.

Em 2022, Orbán disse ter saudades de uma “Hungria étnica e racialmente pura”. E Márton Dárdai ou Willi Orbán, nascidos na Alemanha? No mesmo discurso, demonstrou a vontade de ter uma Hungria composta por “cristãos brancos”. Mas como fica Loïc Négo?

Nenhum dos jogadores nascidos no estrangeiro fala húngaro e, nos últimos anos, têm sido convocados para a selecção atletas nascidos no Brasil, Nigéria e África do Sul. Estes casos não são os únicos do plantel que deixam a descoberto a incoerência do discurso nacionalista radical. Afinal, se não houvesse margem para alguma flexibilidade integracionista, quem seria o seleccionador da Hungria? Certamente não o italiano Marco Rossi, adorado por estes dias pelos adeptos da selecção magiar.

Está comprovado que a lógica impermeável à imigração não se aplica ao futebol, mas nem por isso Orbán mostra vergonha. “Hoje temos uma equipa que entra em jogo com a possibilidade de ganhar a qualquer um”, disse ao jornal húngaro Blikk, em Maio, cheio de orgulho.

Apesar de efusivo na sua ideologia radical, Orbán também é efusivamente um fã de futebol. O The Guardian afirma que o político, que foi jogador semiprofissional, marca reuniões políticas em função dos jogos (evita reuniões quando coincidem com estes e vice-versa) e é altamente provável que esteja presente em todas as partidas da Hungria no Euro 2024.

O primeiro-ministro húngaro olha para o sucesso futebolístico como uma forma de projectar o sucesso da nação e, na verdade, tem tido algum. A Hungria apurou-se para o Euro 2024 em primeiro lugar do seu grupo de qualificação, pela primeira vez na história. E nos últimos 20 jogos, teve apenas duas derrotas, derrotando selecções teoricamente mais poderosas como a Alemanha e a Inglaterra.

O grande investimento no futebol já conferiu reconhecimento internacional à Hungria. A UEFA decidiu que a final da Liga dos Campeões de 2025/2026 será no Arena Puskas, em Budapeste, um estádio novo, financiado pelo Estado húngaro em 590 milhões de euros. Mas este valor é só a ponta do icebergue dos investimentos de Orbán no futebol.

O The NY Times estima que, desde que Orbán foi reeleito, 2,6 mil milhões de euros em fundos públicos na Hungria foram canalizados para a renovação de estádios e instalações de treino no país. A oposição já o acusou de gastar mais no desenvolvimento de jovens futebolistas do que em professores, mas isso não parece incomodá-lo.

Janos Kele, jornalista húngaro, citado pelo jornal norte-americano, confirmou que “o país está unido em torno da equipa, mas, a nível político, está polarizado em relação ao tema do futebol e à forma como o dinheiro foi investido".

A Hungria joga, este sábado, contra a Suíça. As equipas fazem parte do Grupo A e o jogo será transmitido às 14h na Sport TV.

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