O Livre livrou-se de boa e elegeu Francisco Paupério

O Livre quis fazer um processo eleitoral diferente do dos outros partidos, mas esperava um resultado igual ao conseguido por eles.

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Uma citação atribuída a Albert Einstein diz o seguinte: “Insanidade é continuar a fazer sempre a mesma coisa e esperar resultados diferentes.” Einstein, ou quem escreveu esta frase, estava cheio de razão. Lembrei-me dela a propósito das eleições primárias do Livre. Encaixa perfeitamente no que aconteceu.

O Livre quis contrariar o princípio estabelecido na afirmação. Fez uma coisa diferente, eleições primárias abertas a membros externos ao partido, mas esperava obter o mesmo resultado, concretamente a vitória da candidata que o partido já tinha escolhido. Quis fazer um processo eleitoral diferente do dos outros partidos, mas esperava um resultado igual ao conseguido por eles. Insanidade é também fazer uma coisa diferente e esperar um resultado igual.

No final da primeira volta, o candidato Francisco Paupério obteve um resultado extraordinário. Mas não era o que o partido desejava. Perante a vitória de Paupério, a Comissão Eleitoral do Livre considerou que o candidato teve “um número excessivo de votos” e, por isso, falou em “fortes indícios de viciação”.

Nessa primeira volta, Francisco Paupério ganhou, sobretudo com o voto de membros externos ao partido. Grande parte deles apenas votou em Francisco Paupério não tendo escolhido outros candidatos, como é habitual no sistema do Livre. Notem que não é obrigatório. Escolher apenas Francisco Paupério não viola o regulamento das primárias. Isto significa que não ocorreu nenhuma infração às regras que o Livre estabeleceu e que tudo se passou de forma regular.

O partido chegou a suspender as eleições e manifestou a intenção de mudar as regras a meio do processo eleitoral. Teria sido catastrófico. Alguém teve o bom senso de recuar e de salvar a face ao partido, que sempre apresentou o sistema de eleições primárias como sendo a menina dos seus olhos. Seria feio mudar tudo porque os resultados não eram os que os dirigentes do partido esperavam e preferiam. Na verdade, seria demonstração de que o Livre anuncia e promove primárias, mas que não gosta assim tanto do sistema e que, se os resultados contrariarem o que o partido espera, é capaz de o cancelar.

Francisco Paupério é membro do partido, mas tem conseguido fazer passar a sua mensagem de forma autónoma. Não foram só os membros exteriores ao partido que votaram nele. Os próprios membros do Livre votaram de forma expressiva neste candidato, tendo-se até registado uma grande subida destes votos na segunda volta.

O que salvou o Livre?

Foi a sua estrutura democrática. A Comissão Eleitoral levantou o problema e levantou suspeitas graves sobre a votação nas primárias. Francisco Paupério não gostou e apresentou recurso. Foi chamada a intervir a Comissão de Ética e Arbitragem e foi exímia a fazê-lo. Criticou a Comissão Eleitoral (naturalmente mais próxima da direção do Livre, pois alguns dos seus membros são por ela escolhidos) na justa medida em que o poderia ter feito, ou seja, sem pôr em causa a sua credibilidade. Mas, no que era mais importante, não vacilou: “Determina-se que a segunda volta das primárias devem permitir o voto não só de membros e apoiantes, mas também daqueles que se inscreveram no processo eleitoral, nos termos previstos no Regulamento das Primárias do Livre.”

O que salvou o Livre foi a existência de órgãos internos, a quem foram atribuídas competências pelos estatutos do partido, que são exercidas de forma independente e imparcial. Um membro da Comissão de Ética e Arbitragem não pode fazer parte da direção do partido. Pelos vistos, isto não tem apenas um significado simbólico. É efetivo. Os membros desta comissão, e de forma unânime, decidiram num sentido oposto daquele que estava a ser desenhado pelos dirigentes do partido e que se retirava até das palavras de Rui Tavares. E foi a sua deliberação que prevaleceu. O Livre mostrou ser um partido democrático e Francisco Paupério ganhou a segunda volta das primárias. Será o cabeça de lista às europeias e a sua candidatura promete.

Tenham presente que Rui Tavares passou pela experiência de, sozinho, entrar em rota de colisão com a direção de um partido quando foi deputado europeu eleito pelas listas do Bloco de Esquerda. Nessa altura tomou uma decisão radical e que muitos acharam excessiva: desvinculou-se do grupo parlamentar e prosseguiu como deputado independente. Entretanto, no Livre e estando no centro do poder, já lhe aconteceu o oposto. Foi com Joacine Katar Moreira. Agora veremos como correrão as coisas com Francisco Paupério. Estar no centro do poder é sempre outra coisa.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico

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