As jóias também podem ser arma política, diz a 2.ª Bienal da Joalharia Contemporânea

O evento arranca com duas exposições no Museu do Tesouro Real. Jóias para a Democracia homenageia 60 mulheres que contribuíram para a liberdade, numa celebração também dos 50 anos do 25 de Abril.

RG Rui Gaudêncio - 17 Abril 2024 - Jóias para a Democracia, exposição de Joalharia no Museu do Tesouro Real. Lisboa. Público
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Jóias para a Democracia fica patente até 30 de Junho Rui Gaudêncio
RG Rui Gaudêncio - 17 Abril 2024 - Jóias para a Democracia, exposição de Joalharia no Museu do Tesouro Real. Lisboa. Público
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Tiaras Contemporâneas tem a curadoria de Catarina Silva Rui Gaudêncio
RG Rui Gaudêncio - 17 Abril 2024 - Jóias para a Democracia, exposição de Joalharia no Museu do Tesouro Real. Lisboa. Público
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Jóias para a Democracia fica patente até 30 de Junho Rui Gaudêncio
RG Rui Gaudêncio - 17 Abril 2024 - Jóias para a Democracia, exposição de Joalharia no Museu do Tesouro Real. Lisboa. Público
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Homenagem a Cesina Bermudes de Luís Torres Rui Gaudêncio
RG Rui Gaudêncio - 17 Abril 2024 - Jóias para a Democracia, exposição de Joalharia no Museu do Tesouro Real. Lisboa. Público
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A tiara de Joana Vasconcelos Rui Gaudêncio
RG Rui Gaudêncio - 17 Abril 2024 - Jóias para a Democracia, exposição de Joalharia no Museu do Tesouro Real. Lisboa. Público
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Tiara de Marta Costa Reis Rui Gaudêncio
RG Rui Gaudêncio - 17 Abril 2024 - Jóias para a Democracia, exposição de Joalharia no Museu do Tesouro Real. Lisboa. Público
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Tiaras Contemporâneas Rui Gaudêncio
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O 25 de Abril é mote para a 2.ª Bienal da Joalharia Contemporânea, que acaba de arrancar no Museu do Tesouro Real, no Palácio da Ajuda, em Lisboa. A Associação Portuguesa de Joalharia Contemporânea (PIN) convidou 60 artistas joalheiros a contarem a história de mulheres que “tenham tido um papel na luta pela democracia em Portugal”, explica a presidente e curadora, Marta Costa Reis, ao PÚBLICO. A mostra Jóias para a Democracia fica patente a partir desta quinta-feira até 30 de Junho.

Ao centro da sala, está uma enorme mesa amarela com as peças dispostas como se estivessem na mesa de um cirurgião. Não são bisturis, mas jóias com o poder de serem armas políticas. “A joalharia continua muito ligada ao feminino. Onde é que estão as mulheres no 25 de Abril? Antes disso, a mulher não existia no espaço público”, começa por reflectir Marta Costa Reis.

A mulher podia não existir publicamente antes de 1974, mas estava lá e a prova são estas 62 peças, que lembram a importância delas para a construção da democracia. Não são homenageadas apenas mulheres portuguesas, mas também algumas brasileiras, como Elis Regina. “Os artistas foram livres de escolher quem queriam homenagear. Portanto, temos de tudo: de mulheres anónimas às que todas conhecemos.”

A primeira homenagem é feita pela própria PIN, que dedica a Bienal de Lisboa ao poema de Sofia de Mello Breyner Andersen, A Madrugada Que Eu Esperava. Mas há outras mulheres igualmente conhecidas, como Odete Santos, que inspirou Porta para a Liberdade, de Susana Gorjão, ou Manuela Eanes, para quem Eugénia Quartin fez um colar com 40 pérolas (uma das imagens de marca da ex-primeira-dama) — em celebração também pelos 40 anos do Instituto de Apoio à Criança (IAC), fundado por Eanes.

O colar para Manuela Eanes Rui Gaudêncio
Peça de Catarina Silva Rui Gaudêncio
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O colar para Manuela Eanes Rui Gaudêncio

As pérolas estão também presentes em Snu, que evoca Snu Abecassis com alguns dos seus objectos favoritos, como um livro da editora Dom Quixote, que fundou, três medalhas com valores da democracia, as flores ou um ursinho de peluche. “A artista Maria Benedita é disléxica e descobriu que Snu Abecassis também era. Então, se olharmos com atenção, vemos que as palavras têm erros”, detalha Marta Costa Reis.

Entre as anónimas, está a mãe de Valentim Quaresma e todas as militantes do Movimento Democrático das Mulheres (MDM). O artista lembra-se de ir às reuniões com a mãe, após o 25 de Abril, e de se deixar inspirar pela luta daquelas mulheres pela liberdade, como escreve na memória descritiva. A peça inclui o alfinete de peito do MDM que pertenceu à sua mãe, bem como um pequeno relógio (tema que Quaresma utiliza frequentemente nas suas criações) e umas asas de liberdade.

Valentim Quaresma Rui Gaudêncio
Snu de Maria Benedita Rui Gaudêncio
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Valentim Quaresma Rui Gaudêncio

O desafio é percorrer a exposição, tentando adivinhar quem é a homenageada da peça em questão — uma pista: há duas jóias dedicadas a Maria Lamas. Há alusões mais literais, como a boquilha de Natália Correia, de Teresa Milheiro, que aqui se transforma num Instrumento de Caça. A mesma artista vai expor a solo, na Galeria Zé dos Bois, integrada no programa da Bienal de Joalharia Contemporânea de Lisboa. “É uma artista que tem trabalhado muitos temas políticos. Portanto, fez-nos sentido mostrar o trabalho dela”, reflecte a responsável.

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“Matraca" de Marília Maria Mira, em homenagem a Maria Lamas Rui Gaudêncio

Tiaras provocadoras

A exposição Jóias para a Democracia vai desaguar na mostra seguinte, Tiaras Contemporâneas, que “entra pelo cofre” do Museu do Tesouro Real, onde está a colecção de joalharia e ourivesaria da monarquia portuguesa. “Um dos nossos objectivos é fazer com que o museu não esteja parado na época da colecção, mas que seja uma ponte tanto para o presente como para o futuro”, enquadra Nuno Vale, director executivo da instituição.

As tiaras da exposição em nada se comparam às utilizadas pelos príncipes e princesas, são uma reinterpretação contemporânea, carregada, por vezes, de ironia. A ideia surgiu inicialmente em 2018, quando Catarina Silva, curadora da mostra e responsável pelo departamento de joalharia do Ar.Co, convidou antigos alunos, como Joana Vasconcelos, para este exercício criativo. Agora, volta a expor algumas dessas peças, dando-lhes nova roupagem, e acrescentando dez novos artistas.

Para exemplificar a provocação de algumas tiaras, Catarina Silva aponta para as peças de Grace Miell, “uma artista britânica que reinterpretou as coroas da monarquia britânica, usando umas pipetas de gás hilariante”, proibidas no Reino Unido. Também num jogo de ilusão, o neerlandês David Bielander cria peças em prata e ouro branco que mimetizam a textura de um cartão. Visualmente, é um engano que só consegue ser desfeito pelo peso dos materiais, que esclarecem o cérebro.

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As coroas de Grace Miell Rui Gaudêncio

A Tiaras Contemporâneas e a Jóias para a Democracia vão ser dinamizadas com diversas actividades, para todas as idades, no Museu do Tesouro Real. A programação completa pode ser consultada no site oficial, mas destaca-se, a 25 de Abril, uma conversa com artistas e mulheres homenageadas, a reunir a artista Catarina Silva, a cineasta Margarida Gil e a homenageada Aurora Rodrigues.

As duas exposições marcam o arranque da 2.ª Bienal da Joalharia Contemporânea, que terá, ainda, como ponto alto a exposição Madrugada, co-organizada pelo Mude (Museu do Design e da Moda), a arrancar no final de Junho, no Palacete dos Condes da Calheta, em Belém. “Não sendo um museu dedicado às artes, entendemos o design como uma perspectiva ampla e a joalharia cruza-se aqui obviamente com a expressão artística”, analisa a directora do Mude, Bárbara Coutinho, que reforça a importância do tema. “É fundamental voltar a reforçar e debater o que é, o que foi este conceito de liberdade de expressão, sobretudo no momento em que estamos a viver”, termina.


Artigo corrigido a 19 de Abril de 2024 com a alteração do nome da obra dedicada a Snu Abecassis, bem como da artista joalheira Maria Benedita. Inicialmente a obra tinha sido atribuída a Kaia Ansip, que também homenageia Snu Abecassis.

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