Mulheres na abadia do Monte Saint-Michel
“É nas viagens que me descubro e que tudo recomeça”, escreve a leitora Alexandra Braga Falcão.
De volta a esta imagem das monjas da abadia de Monte Saint-Michel, em França. De volta pela ligação óbvia, para mim, com uma outra fotografia, premiada num concurso, que tirei há nove anos na Mesquita Azul, em Istambul, Turquia, e que já me fez correr muita tinta, por durante muito tempo a ter considerado "A" minha fotografia.
Falava, num post que publiquei vai para três anos, de como, nas viagens que faço, me ser essencial reservar alguns minutos de recolhimento. Sobretudo em destinos de grande procura turística. Foi assim na Mesquita Azul e, agora, no Monte Saint-Michel, onde saltei da cama, ainda o sol não tinha despertado, para subir à abadia e assistir ao ofício de Laudes.
Nas duas imagens, um grupo de mulheres, de pé, em oração. As cores feéricas da fotografia captada no templo muçulmano cederam à quase monocromia da luz dourada, etérea, fumada, e perfumada, pelo incenso da abadia cristã. No entanto, a mesma atmosfera de devoção e recolhimento.
A meu lado, uma mulher, de meia-idade e olhar muito vivo, puxa do saco um caderninho de esboços e desenha arcos quebrados, colunas, vãos... a sugestão de luz e sombras, no que considerei um acto de fé, tal a afinação dos movimentos do lápis sobre o papel com a melodia dos salmos entoados. Não fosse esse detalhe, da mulher sentada a meu lado a desenhar, provavelmente não teria sido percorrida por um intenso sentimento de déjà vu. Vale a pena lembrar que, nos instantes que precederam o clique da câmara do telemóvel, em Istambul, estivera largos minutos a observar um jovem, em estado de completa concentração, e também sentado ao meu lado, a desenhar vários pormenores da mesquita.
Um dèjá vu que me compeliu a fixar em fotografia — como havia sucedido com o registo das mulheres de Istambul — a mesma sensação de tranquilidade e felicidade absolutas, que não dependem de ninguém, mas que deriva da comunhão com aquilo que somos: amor, sempre o amor.
A foto da Mesquita Azul foi eleita, se é que os amores e os afectos têm condições para o fazer, como a melhor fotografia das férias desse ano de 2014.
Volvidos nove anos, é bem possível que "A" então minha fotografia tenha mudado, porque também eu mudei. É nas viagens que me descubro e que tudo recomeça.
Alexandra Braga Falcão