Peritos propõem fim de reforma antecipada por desemprego entre os 57 e 61 anos

Idade para aceder às várias modalidades de reforma antecipada deve aumentar e acompanhar esperança média de vida, defende a comissão responsável pelo Livro Verde da Segurança Social.

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Idade da reforma é 66 anos e quatro meses Adriano Miranda
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A Comissão para a Sustentabilidade da Segurança Social, nomeada pelo anterior Governo, propõe que a possibilidade de aceder à reforma antecipada por desemprego de longa duração deve acabar para quem tem entre 57 e 61 anos, noticia o Expresso. Além desta medida mais drástica, em cima da mesa está também o aumento da idade para aceder às várias modalidades de reforma antecipada, de modo a acompanhar o aumento da esperança de vida e a idade normal de acesso à reforma.

A comissão entregou uma versão preliminar do Livro Verde ao anterior Governo, que cessou funções na terça-feira, e as conclusões finais serão remetidas à nova ministra do Trabalho e da Segurança Social, Maria do Rosário Palma Ramalho.

De acordo com o Expresso, a comissão propõe que a pensão antecipada por desemprego de longa duração deve acabar para quem tem entre 57 e 61 anos.

Já a pensão antecipada por desemprego de longa duração a partir dos 62 anos deve ser ajustada e apenas atribuída a quem esteja a três anos da idade legal de reforma. Caso a regra se aplicasse já neste ano, só poderia passar à reforma nestas circunstâncias quem tivesse 63 anos e quatro meses de idade (os tais três anos de diferença face aos 66 anos e quatro meses exigidos a quem pede a reforma normal).

Em 2022, 48,4% das reformas antecipadas foram atribuídas na sequência de desemprego de longa duração e os elementos da comissão alertam para o facto de que com a situação actual “será cada vez maior o incentivo para que o empregador e/ou o trabalhador recorram a rescisão do contrato de trabalho com vista à antecipação da reforma, muitas vezes com grave prejuízo ao nível do rendimento pós-reforma”.

Uma pessoa que se reforme aos 57 anos após esgotado o subsídio de desemprego, notam, pode perder 43,82% do valor da sua pensão.

Actualmente, o regime em vigor permite que quem ficou desempregado quando tinha 52 ou mais anos e tem pelo menos 22 anos de descontos pode pedir a reforma antecipada quando chegar aos 57 anos, desde que tenha esgotado o subsídio de desemprego e continue desempregado. Neste caso, a pensão tem uma penalização de 0,5% por cada ano de antecipação até aos 62 anos e o corte do factor de sustentabilidade (que neste ano é de 15,8%). No caso de o despedimento ter sido por mútuo acordo, acresce um corte de 0,25% por cada ano de antecipação entre os 62 anos e a idade normal de acesso à reforma (e que é eliminado quando a pessoa atinge a idade normal da reforma).

Este regime também está acessível a quem ficou desempregado com 57 anos ou mais. Nestes casos, o acesso é permitido a partir dos 62 anos, desde que a pessoa tenha esgotado as prestações de desemprego e se mantenha sem trabalho. Nesta situação, não há o corte de 0,5% e apenas se aplica o factor de sustentabilidade.

Aumentar a idade de acesso à reforma antecipada

A comissão, constituída por Ana Fernandes, Amílcar Moreira, Armindo Silva, Manuel Caldeira Cabral, Susana Peralta e Vítor Junqueira, defende que o acesso às várias modalidades de reforma antecipada deve ter em conta a evolução da esperança de vida, à semelhança do que acontece com a pensão normal de velhice.

Ou seja, se a idade normal de acesso à reforma sobe quase todos os anos (é de 66 anos e quatro meses em 2024 e será de 66 anos e sete meses em 2025), a idade de acesso à reforma antecipada deve acompanhar esta subida e manter uma distância de cinco anos, estando previsto um regime transitório.

De acordo com o Expresso, no caso da pensão antecipada por flexibilização, que é possível aos 60 anos para quem tem 40 anos ou mais de descontos, esta deve distar em cinco anos da idade normal. Se aplicássemos esta regra já em 2024, só poderia antecipar a entrada na reforma quem tem 61 anos e quatro meses de idade (para garantir a diferença face aos 66 anos e quatro meses exigidos para a reforma normal).

A pensão antecipada por carreiras muito longas, possível a partir dos 60 anos, para quem acumula 48 anos ou mais de contribuições ou para quem começou a trabalhar aos 17 anos e tenha 46 anos ou mais de descontos, seguiria a mesma regra.

OIT dá tarefa por terminada

A Comissão para a Sustentabilidade da Segurança Social foi criada pelo anterior Governo em Julho de 2022 e tinha como objectivo olhar para a sustentabilidade do sistema previdencial na vertente das pensões e elaborar o Livro Verde até 30 de Junho de 2023.

O ministério então liderado por Ana Mendes Godinho pediu à Organização Internacional do Trabalho (OIT) que coordenasse os trabalhos e providenciasse o necessário apoio técnico, tendo este organismo indicado o nome da economista e perita da OIT, Mariana Pereira.

Mas, entretanto, no comunicado enviado na semana passada pela comissão a dar conta de que a versão preliminar do Livro Verde e as respectivas notas técnicas tinham sido entregues ao Governo que ainda estava em funções, o nome de Mariana Pereira deixou de constar e a mensagem de email era assinada por um dos elementos da comissão, o professor do Instituto Superior de Economia e Gestão Amílcar Moreira.

Questionada pelo PÚBLICO sobre o fim da participação no projecto, fonte oficial do escritório da OIT em Portugal diz que o relatório é da responsabilidade da comissão criada em 2022 e não da organização.

“No conhecido contexto de transição, foi entregue pela comissão, no dia 28 de Março, uma versão preliminar do relatório ao gabinete da então senhora ministra. Com essa entrega cessou o nosso apoio técnico nos termos em que havia sido acordado”, garante.

A OIT lembra que o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social havia solicitado “em ofício endereçado ao seu então director-geral, Guy Ryder, que a OIT apoiasse tecnicamente a comissão e coordenasse os seus trabalhos”.

Continua a mesma fonte: “A OIT deu resposta positiva a esta solicitação e prestou esse apoio a partir do seu Departamento de Protecção Social (SOCPRO), indicando para o efeito, em sua representação no terreno, a perita Mariana Pereira (especialista em protecção social e perita associada na OIT-Lisboa).”

A organização “procurou contribuir para uma reflexão no quadro das tendências internacionais, partilhar experiências reconhecidas internacionalmente e metodologias por si desenvolvidas, integrando o sistema normativo da OIT nas discussões, e promover um diálogo alargado com os constituintes tripartidos portugueses”. Contudo, “o relatório produzido seria sempre da responsabilidade da comissão, não constituindo um relatório da OIT”, conclui.

Do lado dos parceiros sociais, a UGT foi a primeira a reagir para dizer que “não perfilha soluções radicais que coloquem em causa a protecção social na velhice e a solidariedade que presidiu à alteração da legislação em matéria de antecipação de reformas, num claro sinal de valorização das longas e muito longas carreiras contributivas, daqueles que iniciaram o seu percurso profissional em idade precoce ou que se encontram numa situação em que a reinserção no mercado de trabalho se afigura mais difícil”.

A central sindical liderada por Mário Mourão defende antes que as alterações devem ir “no sentido de completar a reforma realizada em 2018” e de eliminar “a aplicação injustificada do factor de sustentabilidade nas situações de antecipação/flexibilização da idade de reforma”.

As medidas divulgadas também fizeram soar o alarme na CGTP que receia “redução dos direitos sociais dos trabalhadores e pensionistas, de que são exemplos paradigmáticos o aumento da idade de acesso à pensão de velhice e a introdução da consideração da evolução da esperança média de vida nas fórmulas de cálculo das pensões, fazendo repercutir este avanço civilizacional, de forma negativa, sobre os pensionistas”.

“Pretender aprofundar ainda mais estas vertentes, como parece ser intenção da comissão, quando propõe a introdução do critério da evolução da esperança média de vida também na definição da idade de acesso a reformas antecipadas é, em nosso entender, um retrocesso inaceitável”, refere a central liderada por Tiago Oliveira, que recusa propostas “no sentido de enfraquecer ou fragilizar o sistema público de pensões através do reforço dos sistemas privados para substituição, total ou parcial, do sistema público”.

João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), não quis comentar as propostas que afirmou desconhecer em pormenor e defende que o documento devia ter sido apresentado formalmente ao novo Governo e aos parceiros sociais.

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