Primeiro-ministro da Irlanda demite-se. “Políticos são humanos e temos limites”
Leo Varadkar justifica renúncia inesperada com “motivos pessoais e políticos”. Deixa a liderança do Fine Gael e vai chefiar o Governo até ser encontrado um sucessor. Coligação descarta eleições.
O primeiro-ministro da República da Irlanda apresentou esta quarta-feira, de forma inesperada, a sua demissão da chefia do Governo e da liderança do partido Fine Gael. Numa conferência de imprensa realizada ao início desta tarde, Leo Varadkar esclareceu que vai manter-se como taoiseach (primeiro-ministro) até ser escolhido o seu sucessor, mas que deixa a presidência do seu partido imediatamente.
A demissão de Varadkar não obriga à convocatória de eleições antecipadas, podendo ser substituído no cargo de primeiro-ministro pelo próximo líder do Fine Gael. O partido faz parte de uma coligação governamental, com o Fianna Fáil e os Verdes, e as lideranças de ambos os partidos já disseram que estão comprometidas em cumprir a legislatura até ao fim.
Não obstante, Mary Lou McDonald, líder do Sinn Féin, principal partido da oposição e o mais votado nas últimas eleições, defende uma ida às urnas. “O próximo taoiseach deve ser escolhido pela população, não pelo grupo parlamentar do Fine Gael”, disse esta quarta-feira no Parlamento.
Horas antes, num discurso emotivo, o líder demissionário explicou que os “motivos para a demissão são pessoais e políticos”. Mesmo assumindo que a decisão poderia apanhar muita gente de “surpresa”, não ofereceu, ainda assim, muitos mais pormenores, dando a entender que se trata de uma tomada de posição causada pelo desgaste da profissão.
“Uma das dimensões da liderança é saber quando chegou a altura de passar o testemunho a outra pessoa e, depois, ter coragem para o fazer”, afirmou. “E essa altura é agora. Por isso, apresento o meu pedido de demissão como presidente e líder do Fine Gael, com efeitos a partir de hoje; e irei demitir-me de taoiseach assim que o meu sucessor possa assumir o cargo”, anunciou.
Segundo Varadkar, que propõe que a eleição do novo líder do partido tenha lugar no congresso agendado para o início de Abril, o próximo primeiro-ministro terá tempo para preparar as eleições europeias (Junho) e legislativas (2025) e “estará mais bem colocado” para “renovar e reforçar a equipa, para focar a mensagem sobre as políticas e para as implementar”.
“Após sete anos no cargo, sinto que já não sou a melhor pessoa para fazer esse trabalho mais uma vez”, assumiu. “Os políticos são seres humanos e [nós] temos os nossos limites. Damos tudo até não conseguirmos dar mais. E, depois, temos de seguir em frente.”
Varadkar garantiu, no entanto, estar orgulhoso de ter “guiado a Irlanda do desemprego ao pleno emprego, do défice orçamental ao excedente orçamental e da austeridade à prosperidade” e de contribuir para um país “mais igualitário e mais moderno”, no que toca a “direitos das crianças, comunidade LGBT e igualdade para as mulheres”.
A renúncia inesperada do primeiro-ministro surge, ainda assim, poucas semanas depois de uma derrota embaraçosa para o Governo num referendo, do qual resultou a rejeição, pela maioria dos eleitores, de duas alterações à Constituição: a eliminação das referências à “mulher no lar” e um novo conceito de “família”.
Leo Varadkar exerceu o cargo de primeiro-ministro da República da Irlanda em dois períodos: entre 2017 e 2020; e a partir de 2022.
Em 2017, com apenas 38 anos, este filho de um indiano que emigrou para o Reino Unido e que partiu para Dublin nos anos 1970 substituiu o histórico Enda Kenny, tornando-se o mais novo chefe de Governo da Irlanda e o primeiro homossexual assumido a chegar ao principal cargo político do país – dados relevantes num país de forte tradição católica e conservadora.
Na sequência das eleições legislativas de 2020, em que o Sinn Féin, antigo braço político do IRA (Exército Republicano Irlandês), de esquerda, foi o mais votado, e em que o Fine Gael ficou em terceiro lugar, Varadkar fez um acordo com o Fianna Fáil, rival histórico do Fine Gael e segundo classificado, também de direita, e aceitou que o seu líder, Micheál Martin, fosse taoiseach durante a primeira metade da legislatura (2020-22).
O Irish Times aponta os nomes dos ministros Simon Coveney, Helen McEntee, Simon Harris e Paschal Donohoe como possíveis candidatos à liderança do Fine Gael e do Governo irlandês.