Entre a IL da “borla” fiscal e o BE do “bloqueio” económico, não há pontos comuns

Rui Rocha acusou o BE de querer “distribuir pobreza”, em vez de “crescimento económico”. E Mariana Mortágua criticou a IL por só ter como propostas “borlas à banca” e “cheques para os privados”.

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Liberais e bloquistas foram a debate esta quinta-feira na CNN José Alves
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Não há um tema em que liberais e bloquistas se entendam. Num frente-a-frente vivo e de muitas interrupções, Rui Rocha e Mariana Mortágua divergiram em tudo: habitação, impostos ou saúde. E insistiram várias vezes nos mesmos argumentos para o mostrar: a líder do Bloco de Esquerda (BE) na "borla" fiscal que a Iniciativa Liberal (IL) quer dar à banca e às grandes empresas, e o líder da IL no "bloqueio" que o BE propõe para a economia.

A visão dos dois para o país não podia ser mais oposta. E os próprios resumiram-no bem. "Queremos crescimento económico. Não há nada mais social do que o crescimento porque só assim é possível distribuir e não distribuir pobreza que é a proposta do BE", afirmou Rui Rocha. "A IL diz-se liberal e tudo o que diz ao país é que quer dar cheques ao privado. Eu quero um país em que os jovens queiram viver porque têm salários e sabem que a vida não é uma competição permanente", contrapôs Mariana Mortágua.

A área da habitação, por onde começou o debate na CNN, deixou bem claras as divergências. A IL, que culpa os impostos por não existir habitação acessível, quer resolver o problema criando incentivos à construção — além de disponibilizar as casas vazias do Estado para arrendamento. E, para isso, propõe reduzir o tempo do licenciamento e o IVA na construção, bem como isentar de IMT e imposto do selo a compra de habitação própria.

Mortágua diz que a resposta da IL é "mais do mesmo: mais mercado a funcionar". E embora defenda que 25% da nova construção vá para habitação acessível e queira construir 80 mil casas por 1200 milhões de euros anuais — uma medida que a IL diz ser "inviável" —, desconstrói a ideia de que o problema esteja na falta de construção. "Há um superavit de casas para famílias de 1,8 milhões", afirma, apontando o "alojamento local" e o "mercado de luxo" como causas da crise.

Rui Rocha ainda responde que o alojamento local representa 3% do mercado e atira-se contra a proposta do BE de proibição da venda de casa a não-residentes, acusando-o de querer "combater os estrangeiros". Uma "enorme hipocrisia", devolve Mortágua, que vinca que o que está em causa não é a nacionalidade, mas se as pessoas "procuram casas" ou "bens de luxo". Rocha puxa de outro argumento: "É ilegal no espaço da União Europeia". Mas Mortágua também tem resposta: "A mesma excepção" aplicada em Malta e Dinamarca "pode-se aplicar a Portugal".

Dos impostos à saúde

Sobre impostos, novo embate. Mortágua defende que a Caixa Geral de Depósitos deve baixar os juros dos créditos à habitação, provocando um "arrastamento do mercado", e garante que isso não prejudicaria o banco, visto que manteria os lucros, mas "mais reduzidos". Já a IL propõe uma baixa para metade do IRC para a banca, a EDP e Galp, critica.

Puxando da máxima liberal de que o Estado não deve "asfixiar quando corre bem", nem "enfiar dinheiro dos contribuintes" quando corre mal, Rocha vira-se para as nacionalizações, questionando como é que o BE propõe pagar a nacionalização dos CTT, da EDP ou da ANA. Mas Mortágua explica que o BE apenas defende o controlo público dos CTT e da REN, o que custaria "menos de metade do que a borla de 2,2 mil milhões de euros em IRC à banca".

Criticando o BE por só falar quatro vezes de crescimento económico no programa, Rocha justifica a redução do IRC para que as empresas se fixem em Portugal e "tragam salários mais altos" e "tecnologia". Assim como insiste em baixar o IRS dos trabalhadores. E garante que tem forma de custear os cinco mil milhões que as propostas fiscais custariam: recuperando os 3,5 mil milhões de despesa do Estado.

A bloquista classifica a medida da taxa única do IRS (flat tax) como "inconstitucional" porque "elimina a progressividade" — algo que Rocha recusa porque a IL prevê isenções — e, respondendo às críticas de que não tem propostas para pôr o país a crescer, garante que o BE quer fazer "investimentos em áreas com futuro e emprego qualificado", como a eficiência energética, os transportes, os serviços de saúde de ponta ou a investigação.

Não satisfeita, volta a condenar a "borla" de 2,2 milhões de euros que a IL "quer oferecer" aos quatro presidentes de empresas que ganham um salário anual de oito milhões de euros. A ideia vale-lhe uma das muitas acusações de "demagogia" por parte de Rocha durante o debate: "Está preocupada com um conjunto de pessoas e não com todos. O que essas pessoas ganham dividido pelos portugueses não dava nada. Isto é a demagogia do BE", afirmou, tentando contrariar a ideia de que a IL "é dos ricos".

Na saúde, também trocaram acusações. Para defender um modelo de privatização, Rocha traz o caso da reversão da parceria público-privada do Hospital de Braga, que diz ter criado "pior serviço e condições", por culpa do BE. "O BE anestesia na saúde e bloqueia a economia", atira.

Mortágua lembra que o hospital estava "em falência técnica" e acusa a IL de querer "entregar o dinheiro ao privado", tornando o sistema de saúde "mais caro e com menos qualidade". Argumento que Rocha usa para atirar a "geringonça" contra Mortágua. Nos últimos anos, o orçamento para o SNS aumentou 72% e "as coisas não estão melhores", aponta, acusando o BE de ser "responsável deste caminho". Sem contestar, Mortágua termina o debate acusando a IL de ter uma só ideia: "Cheques ao privado."

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