Pais e dispositivos eletrónicos: impactos no desenvolvimento infantil

Aparentemente crianças cujos pais dedicam longos períodos de tempo em dispositivos eletrónicos tendem a apresentar atrasos em competências cognitivas, como a linguagem e o raciocínio lógico.

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"O facto de os pais ficarem absortos nos seus telemóveis enquanto a criança procura atenção, limita a qualidade e natureza da interação" Helena Lopes/Pexels
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O avanço tecnológico transformou profundamente a forma como interagimos com o mundo ao nosso redor, especialmente no que diz respeito ao uso de dispositivos eletrónicos. Enquanto a atenção tem sido focada nos potenciais efeitos negativos dessas tecnologias nas crianças e adolescentes, recentes estudos científicos apontam para um aspeto menos explorado: o impacto do uso excessivo de dispositivos pelos pais no desenvolvimento dos seus filhos.

Nos últimos anos, diversos estudos têm alertado para os riscos associados ao uso intensivo de smartphones e outros dispositivos eletrónicos por crianças e adolescentes. No entanto, o papel dos pais nesse cenário tem sido pouco discutido. A crescente dependência dos adultos dos seus próprios dispositivos está a ter impacto significativamente negativo no desenvolvimento infantil.

Aparentemente crianças cujos pais dedicam longos períodos de tempo em dispositivos eletrónicos tendem a apresentar atrasos em competências cognitivas, como a linguagem e o raciocínio lógico. Não só a nível cognitivo mas também a nível da inteligência emocional: a forma como esta competência (conjunto de capacidade mentais que permitem ao indivíduo reconhecer e gerir as suas emoções) é desenvolvida nos mais pequeninos depende muito dos pais.

O facto de os pais ficarem absortos nos seus telemóveis enquanto a criança procura atenção, limita a qualidade e natureza da interação, impactando negativamente na inteligência emocional da criança. Surpreendentemente, o tempo gasto ao telefone tem uma correlação mais forte com a redução da inteligência emocional em comparação com atividades como leitura e brincadeiras ao ar livre.

Essa forma de interação representa para a criança uma falta de responsividade na relação, sendo associada, na Psicologia, à expressão clássica do "rosto imóvel" ("still face"), que, de maneira geral, está ligada à depressão e sabemos ter um impacto negativo na saúde mental das crianças, o que motiva uma correlação positiva entre o maior uso de dispositivos eletrónicos pelos pais e distúrbios comportamentais nas crianças no presente com maior agressividade, deficit de atenção ou hiperatividade.

Quando se analisa o impacto do uso constante de dispositivos eletrónicos pelos pais nas competências sociais e de comunicação de crianças em idade pré-escolar, os resultados sugerem que crianças cujos pais estão frequentemente imersos nos seus dispositivos podem apresentar dificuldades em desenvolver habilidades sociais e de comunicação, fundamentais para interações saudáveis ao longo da vida.

Este declínio das relações parentais é até mensurável: a investigação aponta para que quando um pai/mãe está ao telemóvel tem cerca de 20% menos de comunicação verbal com a criança e 39% menos de comunicação não-verbal (expressões faciais, contacto ocular, etc.). Além disso, a investigação indica que a distração parental, que reduz a atenção e sensibilidade dos pais, prejudica até mesmo a capacidade de aqueles ensinarem coisas novas aos seus filhos.

Um aspeto crucial que emerge deste crescente grupo de estudos é a questão da modelagem de comportamento parental. As crianças aprendem por observação e imitação, e os pais, ao priorizarem o uso excessivo de dispositivos eletrónicos, inadvertidamente estão a modelar um comportamento que pode ser prejudicial ao desenvolvimento saudável dos seus filhos.

É imperativo que a sociedade reconheça a importância de um equilíbrio saudável no uso de tecnologia, especialmente no contexto parental. Pais e cuidadores desempenham um papel vital no desenvolvimento dos seus filhos, e a consciencialização sobre os efeitos do uso excessivo de dispositivos pode ser o primeiro passo para promover ambientes familiares mais saudáveis e propícios ao crescimento infantil.

Aqui estão algumas sugestões práticas para mudar positivamente os seus hábitos com os dispositivos electrónicos:

  • Agende momentos sem telemóvel: Reserve períodos específicos para se concentrar exclusivamente na interação com o seu filho. Desligue ou coloque o telemóvel noutra divisão durante estes momentos para minimizar distrações.
  • Silencie as notificações: Desative as notificações do seu telemóvel. Considere usar o modo "não incomodar" ou o modo avião para criar momentos sem interrupções.
  • Estabeleça zonas "sem telemóvel": Determine áreas específicas da casa, como a sala de estar ou de jantar, onde o uso do telemóvel é proibido. Isso cria espaços onde pode estar totalmente presente com o seu filho.
  • Torne o telemóvel menos atrativo: Reorganize as suas aplicações, colocando as distrativas mais escondidas. Opte por cores em tons de cinza no seu papel de parede e configurações, tornando o telemóvel menos atrativo.
  • Utilize o tempo de ecrã para interações positivas: Aproveite o telemóvel para interações significativas. Chamadas de vídeo com membros da família, especialmente avós, podem melhorar as capacidades de comunicação.

Lembre-se, não se trata de eliminar completamente o uso do telemóvel, mas sim de reduzir a frequência de navegação sem propósito na presença dos seus filhos. Os impactos positivos no desenvolvimento serão duradouros.


A autora escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990

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