Orçamento do Estado “mais parece um folheto publicitário”, criticam sindicatos da educação

FNE e Fenprof alegam que falta saber quase tudo sobre a atribuição de subsídios de habitação aos professores deslocados. Directores apontam o dedo à falta de investimento na escola pública.

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O subsídio para os professores deslocados proposto pelo Governo fixa uma distância mínima de 70 quilómetros entre a casa e a escola Adriano Miranda (arquivo)
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Foi mais um dia “não” para os professores o da apresentação esta terça-feira, da proposta de Orçamento de Estado (OE) para 2024. “Não houve uma palavra para a educação”, destaca o presidente da Associação Nacional de Directores e Agrupamentos de Escolas Públicas (ANDAEP), Filinto Lima, a propósito da conferência de imprensa do ministro das Finanças, Fernando Medina, que se prolongou por mais de duas horas.

Para este dirigente escolar, o que se passou, e também o que está escrito na proposta de OE, são “um prenúncio do escasso investimento que vai existir na escola pública”. “Desilusão”, “folheto publicitário”, “nada de novo”. São os termos escolhidos por sindicatos e movimentos independentes de professores para caracterizar o OE.

Nem mesmo a previsão de virem a ser concedidos subsídios de habitação a professores deslocados suscita algum optimismo, pela simples razão de nada de existir concreto a este respeito.

Em declarações à TVI, o secretário-geral adjunto da Federação Nacional de Professores (Fenprof), José Costa, indicou que esta questão estará em cima da mesa numa próxima reunião entre o Ministério da Educação e sindicatos de professores, mas por agora “não há nada”, frisou.

A proposta do OE não especifica nem o montante nem a forma de pagamento dos subsídios para habitação. Num dos mapas com a descrição das dotações para a educação estão reservados 3,5 milhões de euros para habitação, sem qualquer outra especificação quanto à sua aplicação.

No documento, refere-se que os professores colocados nas regiões de Lisboa e Vale do Tejo e no Algarve vão ter subsídios para apoiar os custos com habitação. Esta prerrogativa será também aplicada aos colocados em “qualquer outra região, onde os custos da habitação são mais elevados”.

Para terem direito a estes subsídios, os professores terão de estar colocados “em escolas a mais de 70 quilómetros da sua área de residência”. Estes apoios também só serão atribuídos quando o valor dos encargos com o alojamento “ultrapasse a taxa de esforço de 35%”.

“Só espero que o processo burocrático leve a que ninguém acabe por receber”, comenta o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares, Manuel Pereira, que receia que seja mesmo isso que venha a acontecer. “O Governo deveria assumir, de forma provisória, o financiamento de professores nas regiões onde há falta de docentes. Definindo, por exemplo, uma verba fixa” para o efeito, que tornaria mais fácil a operacionalização desta medida.

“É importante, mas no concreto não há nada no Orçamento”, resume. “A ideia é boa, mas tem de ser clarificada”, corrobora Filinto Lima.

“Um pouco delirante”

Sobre o OE no seu conjunto, o líder da Federação Nacional da Educação (FNE), Pedro Barreiros, considera que este “não respeita e não vai ao encontro das necessidades de professores”. “Há instrumentos que temos identificado e que viriam dar resposta aos problemas, mas que o Governo teima em ignorar”, acrescentou. Para Pedro Barreiros, o que se encontra referido no OE mais não é do que um “conjunto de anúncios, que mais parece um folheto publicitário”.

O secretário-geral adjunto da Fenprof corrobora, frisando que “não há nenhuma intenção [no OE] de valorizar os professores”, sendo até “um pouco delirante” o modo como se apresentam medidas, como a multiplicação dos Quadros de Zona Pedagógica, que resultaram da “pressão” dos sindicatos.

“Não traz nada de novo”, aponta Cristina Mota em nome do movimento Missão Escola Pública, que aponta como exemplo a falta de medidas destinadas a reforçar “a atractividade da carreira, que é necessária para chamar mais jovens aos cursos de formação de docentes e garantir assim mais professores no futuro”. E também o facto de o crescimento previsto no orçamento para a educação “estar destinado fundamentalmente para a transição digital”.

O que constitui “motivo de preocupação”, uma vez que não existe qualquer referência à realização “de estudos sobre o impacto dos manuais digitais” como aconteceu na Noruega ou na Suécia, que em função dos resultados obtidos fizeram marcha atrás neste caminho. Esta alegada paixão pela digitalização leva a que na proposta do OE se coloque “as competências digitais dos professores em primeiro plano, em detrimento da actualização dos seus conhecimentos científicos”, aponta ainda Cristina Mota.

Que salienta, por outro lado, que é “com indignação” que a Missão Escola Pública constata que a proposta do OE “não contempla a recuperação do tempo de serviço congelado”.

“Era preciso que, claramente, se visse no Orçamento um investimento na educação e isso não existe”, sublinha Manuel Pereira. “Não há uma palavra sobre a recuperação do tempo de serviço congelado. É uma desilusão”, lamenta Filinto Lima.

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