OE2024: Governo “fechou a porta” a professores, corte de 1200 milhões no IRS e baixa de IRC, diz PSD
Medina apresenta cenário macroeconómico do orçamento para 2024 aos partidos com assento parlamentar. Governo baixa previsões de crescimento para 2024 e já alinha pelos 1,5% do Banco de Portugal.
Dois dias depois de o Banco de Portugal ter revisto em baixa a projecção do crescimento económico no próximo ano de 2,4 para 1,5%, o Governo rendeu-se às evidências e é com esse valor que está agora a trabalhar o Orçamento do Estado para 2024. Um valor ainda mais baixo do que os 2% que tinha inscrito em Abril no Programa de Estabilidade. Ainda assim, espera-se que a economia portuguesa cresça neste ano na casa dos 2,1 ou 2,2%.
Estes foram os números comunicados nesta manhã por Fernando Medina à Iniciativa Liberal, no âmbito da consulta aos partidos ao abrigo do direito da oposição. O deputado João Cotrim Figueiredo contou ainda que o ministro das Finanças adiantou que neste ano "o saldo orçamental será positivo mas inferior a 1% e em 2024 será perto de 0%".
"É o nono orçamento de António Costa (...) e haverá a típica gestão de curto prazo, como aconteceu com medidas nos combustíveis e habitação, em vez de ser um orçamento estrutural", lamentou o deputado liberal, apontando que a despesa pública voltará a ficar acima dos 100 mil milhões de euros (neste ano a previsão é de 113 mil).
Redução do IRS, mas pouca
Haverá redução de IRS, mas muito abaixo dos 1200 milhões de euros propostos pelo PSD, e não há qualquer abertura para a recuperação do tempo de serviço congelado aos professores. Essa foi a primeira conclusão com que a delegação social-democrata saiu da reunião com o ministro das Finanças sobre o Orçamento do Estado para 2024 (OE2024).
A segunda é ainda uma esperança: Fernando Medina mostrou-se “receptivo” a algumas propostas do PSD no âmbito da habitação, nomeadamente a redução fiscal temporária por cinco anos na construção (a taxa normal é de 23%, mas os sociais-democratas propõem 6%), na compra de casa e nos rendimentos do arrendamento.
Em declarações aos jornalistas no final do encontro de quase uma hora com os ministros das Finanças e dos Assuntos Parlamentares, o líder parlamentar do PSD, Joaquim Miranda Sarmento, disse que o Governo “não apresentou praticamente nenhuns números do cenário macroeconómico” com que irá trabalhar o OE2024, mas também não terá insistido, uma vez que “o que preocupou” os sociais-democratas foi a “receptividade” às suas propostas.
“O Governo não parece aberto à proposta para a recuperação de 20% ao ano do tempo de serviço dos professores nem para qualquer mexida na taxa do IRC (tem sido uma prioridade do PSD). Sobre o IRS, a redução que se prepara para fazer é bastante inferior à do PSD”, apontou Miranda Sarmento, contando que não foi discutido qualquer travão às rendas. “Pareceu-nos que este OE segue a linha dos anteriores e os portugueses vão continuar a pagar impostos máximos para ter serviços mínimos”, disse.
Ao PAN, o ministro admitiu abertura para a revisão dos escalões do IRS pela taxa da inflação, afirmou Inês de Sousa Real. Mas a deputada levou outras reivindicações que não tiveram resposta: reforço do programa housing first (da habitação para os sem-abrigo), descida do IVA dos serviços médico-veterinários e da alimentação dos animais de companhia e o alargamento da gratuitidade dos passes a todos os jovens, e não apenas a estudantes.
Excedente entre mil e dois mil milhões
De acordo com o deputado Rui Tavares, o excedente deverá ficar entre os mil e os 2000 milhões de euros, o que significa entre 0,4% e 0,8% do PIB. Por isso, a delegação do Livre lançou o desafio ao Governo sobre a necessidade de "discutir um compromisso de equidade e investimento [com uma fórmula de base] para que o sacrifício" que todos fizeram e resultou num excedente seja redistribuído.
Rui Tavares já tem algumas ideias: criação de um fundo de emergência para quem perde a casa, canalizar para abonos de família ou expandir o passe ferroviário nacional.
"Apoio directo" no crédito à habitação e rendas
No final da sua reunião com os ministros, André Ventura contou que Medina não adiantou quaisquer metas orçamentais e admitiu apenas que o crescimento económico "será menor" no próximo ano, o que "é preocupante". Sobre medidas, ficou a garantia de que, "independentemente das deduções, quem ganha o salário mínimo não pagará IRS", que será prorrogada a devolução da receita de IVA no valor do ISP, e que haverá "apoio directo" às famílias no crédito à habitação e nas rendas quando a taxa de esforço for superior a 35 e 55%, respectivamente.
O líder do Chega afirmou que Fernando Medina "garantiu que este ano vão acabar as cativações" e que o Ministério das Finanças "deixará de supervisionar e de ter poder de controlo sectorial sobre outros ministérios". O ministro afirmou que o Governo "irá trabalhar no equilíbrio orçamental" e fará um "forte esforço para a redução da dívida pública". Mas que está preocupado com a possível contaminação de outros países europeus que correm risco de recessão, como Itália e França, e com os países que arriscam procedimentos por défice excessivo.
PCP insiste no salário mínimo: 910 euros em Janeiro, mil até ao fim do ano
Quem também saiu pouco entusiasmado do encontro foi o PCP, cuja preocupação essencial foi defender a necessidade de subir salários e pensões para recuperar poder de compra – um mínimo de 15% no salário mínimo em Janeiro, para 910 euros, e que se atinjam os mil euros durante o ano, resumiu aos jornalistas a líder parlamentar Paula Santos.
"O investimento público é fundamental para o desenvolvimento do país – na melhoria de serviços públicos, no reforço da saúde e da escola pública e habitação –, mas tem sido insuficiente e nem esse [que é inscrito no OE] é concretizado. A dirigente comunista defendeu a necessidade de "colocar os lucros dos bancos a pagar o aumento das taxas de juro e alargar a rede pública de creches para assegurar resposta a todas as famílias". Porém, de todas as propostas que deixaram, não viram "qualquer resposta", lamentou Paula Santos.
Prioridade do Governo é ser "cobrador do fraque"
O Bloco de Esquerda também saiu da reunião com Medina sem conhecer o cenário macroeconómico previsto para 2024 – algo que não é muito comum nestes encontros com o Governo. O que sabe é que haverá excedente neste ano, o que leva Pedro Filipe Soares a considerar que o executivo "está a ir além do que devia para ter excedente" e não dá "as respostas necessárias" às dificuldades da população, sobretudo nos serviços públicos, habitação, saúde e educação.
Pelo contrário, o Governo "teima em ter uma guerra contra os trabalhadores da administração pública" e a sua prioridade é ser "o cobrador do fraque".
Já o PS, que foi ouvido em último lugar, congratulou-se com o cenário macroeconómico, mas não o revelou, e com o facto de 2024 "voltar a ser ano de convergência com a média europeia". Eurico Brilhante Dias tem a expectativa de a proposta de orçamento do Governo ser de "reforço dos rendimentos das famílias e dos jovens", uma vez que "há passos em frente nas negociações com a função pública e no quadro da concertação social", mas também propostas na educação, como o alargamento das creches, e na mobilidade, com os passes gratuitos.
Para a discussão na especialidade, o líder parlamentar socialista prometeu "trabalhar com as diferentes forças políticas" e aprovar propostas de toda a oposição à excepção do Chega ("um partido anti-sistema democrático"). Mas apelou a uma "atitude construtiva": "Todos têm o dever e a obrigação de contribuir para um orçamento melhor."
Banco de Portugal mais pessimista
O Governo continuava, até aqui, a trabalhar oficialmente com as previsões do Programa de Estabilidade 2023-2027, de Abril, que previa que a economia crescesse neste ano 1,8% e 2% em 2024, enquanto o défice se situaria nos 0,4% neste ano e em 0,2% no próximo.
Na quarta-feira, 4 de Outubro, o Banco de Portugal reviu em baixa as previsões de crescimento da economia para o corrente ano e para 2024 para valores abaixo do que o Governo esperava. Depois de uma travagem na economia nos segundo e terceiro trimestres, o regulador liderado pelo antigo ministro das Finanças Mário Centeno estima que a economia cresça neste ano 2,1% (em Junho, contava que fossem 2,7%) e tem uma perspectiva ainda mais conservadora para 2004: 1,5%, em vez dos 2,4% que desenhava em Junho.