Porque é que 28 de Junho é o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+

Naquela madrugada, a polícia invadiu o Stonewall Inn, um bar em Nova Iorque, frequentado principalmente por homens gays, mas também lésbicas e pessoas trans. Eles ripostaram.

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Marcha do Orgulho em Istambul, que o Governo turco voltou a proibir este ano. EPA/ERDEM SAHIN
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É numa modesta construção no número 53 da rua Christopher, em Nova Iorque, que se encontram as origens da explicação para o 28 de Junho ser, há mais de 50 anos, celebrado como a principal data de resistência da comunidade LGBTQIA+.

O que se transformou numa manifestação que une festas e actos políticos que ocupam o espaço público para celebrar o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ teve como marco fundador um episódio que opôs violência e exclusão à resistência a favor da diversidade.

A 28 de Junho de 1969, durante as primeiras horas da madrugada, polícias à paisana do Departamento de Polícia de Nova Iorque fizeram uma rusga no bar nova-iorquino Stonewall Inn, um dos mais populares entre a comunidade LGBT da região e uma espécie de refúgio numa era de intolerância.

O alvo da operação eram locais frequentados por pessoas "doentes mentais" — a forma discriminatória como a Associação Americana de Psicanálise descrevia pessoas LGBT. Até 1961, todos os estados norte-americanos tinham leis que proibiam a homossexualidade. E por muito tempo elas vigoraram.

"Homens negros e brancos de Boston unidos" - Gay & Lesbian Pride Parade em Boston, Massachusetts, em Junho de 1984,"Homens negros e brancos de Boston unidos" - Gay & Lesbian Pride Parade em Boston, Massachusetts, em Junho de 1984 c/o @northeastern
“The Darned Club” (Alice Austen, Trude Eccleston, Julia Marsh e Sue Ripley), da fotógrafa Alice Austen, tirada em Staten Island, Nova Iorque, Outubro de 1891,“The Darned Club” (Alice Austen, Trude Eccleston, Julia Marsh e Sue Ripley), da fotógrafa Alice Austen, tirada em Staten Island, Nova Iorque, Outubro de 1891 Alice Austen, c/o @aliceaustenhouse
“Se acha que as bichas estão a revoltar-se, nós estamos” [trocadilho com "são revoltantes"], lê-se na t-shirt de Chris Johnson no Dia do Orgulho Gay em San Diego, California, c. 1975 Christine Kehoe, c/o @lambdaarchives
“You never completely have your rights for one person until you all have your rights.” (tradução livre: “Só teremos direitos por completo quando todas as pessoas tiverem direitos”) – Marsha P. Johnson, pioneira da luta pelos direitos LGBT nos EUA (Marsha P. Johnson em Nova Iorque, a 10 de Maio de 1978) © Bettye Lane, c/o Radcliffe Institute
"Um dia sem lésbicas é como um dia sem a luz do sol” - Gay Freedom Day Parade de São Francisco, California, em Junho de 1979 Fotógrafo desconhecido
"Crime: Sodomia". Homer Baker e Thomas Keene detidos a 5 de Junho de 1908 na prisão estatal de San Quentin, na California c/o @glbt_history
Prisioneiros com o triângulo cor-de-rosa (que marcava as pessoas queer) no campo de concentração de Sachsenhausen, Alemanha, a 19 de Dezembro de 1938 c/o Corbis
“Parem de gastar $$$ dos impostos em caça às bruxas por homossexuais” - Guy Strait, fundador das primeiras publicações dirigidas à comunidade LGBT, marcha em São Francisco, 21 de Maio de 1966 c/o @glbt_history
Marsha P. Johnson, Sylvia Rivera e outras activistas da Street Transvestite Action Revolutionaries (S.T.A.R.) lideram a Parada de Christopher Street Liberation Day em Nova Iorque, a 24 de Junho de 1973 Leonard Fink, c/o @lgbtcenternyc
“Dele” — “Dele também”, lê-se nas t-shirts de um casal em Christopher Street West, Los Angeles, a 29 de Junho de 1975 Fotógrafo desconhecido, da colecção do @lgbt_history
"Bichas são fantásticas", Harmodius e Hoti na Castro Street Fair em São Francisco, em Agosto de 1975 © Danny Nicoletta (@dannic100)
Bobbi Campbell na International Lesbian & Gay Freedom Day em São Francisco, em Junho de 1983. “Sou Bobbi Campbell e tenho ‘cancro gay’.” - foi com estas palavras, publicadas na primeira página do San Francisco Sentinel em Dezembro de 1981, que Bobbi Campbell se tornou a primeira pessoa a assumir publicamente estar doente com sarcoma de Kaposi (uma infecção associada à sida). Morreu aos 32 anos, em Agosto de 1984 Roger Ressmeyer
“Bi e grande” – “Escudo contra a bi-fobia” – “Bi-ceps”, Lani Ka’ahumanu e outras activistas bissexuais no International Lesbian & Gay Freedom Day em São Francisco, 24 de Junho de 1984 Arlene Krantz, c/o Lani Ka’ahumanu
"Fufas contra o Klan" - South Portland, Maine, 11 de Junho de 1988 Annette Dragon
"Transexuais pela mudança" - Heritage of Pride Parade em Nova Iorque, a 24 de Junho de 1990 Robert Fisch (@nyc1gwm)
"Stonewall foi um motim, não o nome de uma marca" - activistas da Homocore Chicago na Lesbian & Gay Pride em Chicago, Illinois, a 5 de Junho de 1994 c/o The Queer Zine Archive Project
"Graças a Deus sou gay” - comemoração dos 25 anos dos motins de Stonewall, em Junho de 1994, em Nova Iorque © Michael J. Prendergrast
"Hip hip hurra! Os meus dois filhos são mesmo gay!" - Pride Parade em Londres, Junho de 1995 Photofusion Picture Library
“Precisamos de maridos” - Lesbian & Gay Pride de Chicago, Illinois, em Junho de 1995 c/o @gerberhart
“Poder gay, poder negro, poder feminino, poder estudantil, todo o poder para o povo”, protesto em Weinstein Hall, Nova Iorque, em Outubro de 1970 Diana Davies, c/o @nypl
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"Homens negros e brancos de Boston unidos" - Gay & Lesbian Pride Parade em Boston, Massachusetts, em Junho de 1984,"Homens negros e brancos de Boston unidos" - Gay & Lesbian Pride Parade em Boston, Massachusetts, em Junho de 1984 c/o @northeastern

Foi apenas em 2003 que o Supremo Tribunal de Justiça dos EUA, por cinco votos contra quatro, invalidou uma antiga decisão e eliminou a proibição da homossexualidade em nove estados que ainda a sustentavam.

Durante a rusga em Stonewall Inn, quando várias pessoas foram levadas sob custódia — e os relatos dão conta que os detidos eram, na maioria, gays, lésbicas e pessoas trans —, um grupo resistiu. E a ele se somaram mais pessoas que ficaram a saber da violência.

A mobilização e a resistência duraram cinco dias. A "revolta", como o movimento é descrito por parte da historiografia, começou como um protesto espontâneo contra o assédio policial crónico e a discriminação contra pessoas LGBTQIA+ numa década efervescente para o movimento de direitos civis.

Exactamente um ano após o episódio, a 28 de Junho de 1970, uma manifestação partiu do local do bar e caminhou mais de quatro quilómetros em direcção ao Central Park, cartão-postal de Nova Iorque, naquela que é considerada a primeira marcha do orgulho LGBT no país. O evento ecoou para outras nações.

"Provavelmente somos o grupo minoritário mais assediado e perseguido da história, mas nunca teremos os direitos civis que merecemos a menos que paremos de nos esconder em armários e no anonimato", disse na ocasião Michael Brown, 29, ao The New York Times.

Os números da mobilização variaram — a polícia falava em "mais de mil", enquanto os organizadores contaram 20 mil pessoas. Mas o consenso dos que conversaram com o jornal americano ia na linha do que disse Martin Robinson, 27: "Nunca tivemos uma manifestação como esta."

O reconhecimento da discriminação na época tem ganho espaço também nas fileiras da polícia americana. Em 2019, no marco dos 50 anos de Stonewall, o então comissário da polícia de Nova Iorque, James P. O'Neil, pediu desculpas pelo caso, que descreveu como um erro: "Sei que o que aconteceu não deveria ter acontecido. As acções do Departamento de Polícia foram erradas, pura e simplesmente. As atitudes e as leis eram discriminatórias e opressivas. Peço desculpas."


Exclusivo PÚBLICO/Folha de S. Paulo
Nota do editor: o PÚBLICO respeitou a composição do texto original, com excepção de algumas palavras ou expressões não usadas em português de Portugal.

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