Dar-me ao luxo

Luxo é poder escolher. É o contrário da tensão. É tranquilidade e relaxamento. É poder dar-me ao luxo.

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EPA/MARIO CRUZ

Quando penso em luxo, não penso no estilo de vida que atribuímos aos jogadores de futebol, em iates em Ibiza, em carros brilhantes e velozes, nem em restaurantes que só permitem a entrada a quem esteja vestido de gala e onde se abrem garrafas de champanhe acompanhadas por fogo-de-artifício. Tão-pouco penso nas lojas de roupa da Avenida da Liberdade, em férias no Dubai ou em malas da Louis Vuitton.

Quando pesquiso “luxo” no Google, aparecem-me imagens de tudo isto. Carros supersónicos cujas portas se abrem na vertical, mulheres com óculos escuros enormes, desfiles de moda em Paris com modelos sisudas, homens a usar pólos com logótipos de marcas de renome, relógios de milhares de euros com pulseiras de aço, arranha-céus em Abu Dhabi. Esta é a ideia generalizada de luxo.

A conhecida frase de Coco Chanel: “O luxo tem de ser confortável ou não é luxo” parece não se adequar a este mundo de carros tão baixos que obrigam a que uma pessoa tenha de se deitar para conseguir entrar, de sapatos de saltos vertiginosos e desconfortáveis, de procedimentos estéticos para manter uma imagem visual irrealista, e de constante sustentação de pose.

O filme Triângulo da Tristeza começa com uma cena em que um fotógrafo pede aos modelos que fiquem sérios, porque sério é Balenciaga, enquanto o riso é H&M. Para estes critérios, a tensão é luxo, a descontracção é lixo.

A definição de luxo, segundo o dicionário, é ostentação e gala, mas, também “bem ou actividade que não é considerado necessário, mas gera conforto ou prazer”. Esta segunda definição aproxima-se mais do que eu considero luxo. O luxo verdadeiro, para mim, não é o faustoso e ostensivo, para fora, mas aquele que vem de dentro e que cada um tem definido internamente. São coisas específicas, pequenos caprichos, que não têm necessariamente de ser caros. Têm apenas de nos dar extremo prazer.

Luxo é poder escolher. É o contrário da tensão. É tranquilidade e relaxamento. É poder dar-me ao luxo. Dar-me ao luxo de estar confortável, dar-me ao luxo de estar sossegada, dar-me ao luxo de ir a uma tasca, dar-me ao luxo de andar de Havaianas, dar-me ao luxo de ler deitada na praia. Cada um tem a sua imagem do que é dar-se ao luxo, feita por medida, como um vestido para a cerimónia dos Óscares.

No meu caso é dar-me ao luxo de poder viajar, dar-me ao luxo de tirar o dia, dar-me ao luxo de comer uma lasanha em frente da televisão a ver uma série. Dar-me ao luxo de estar em silêncio, dar-me ao luxo de parar horas numa livraria, dar-me ao luxo de ir ao cinema a meio da tarde, dar-me ao luxo de não me preocupar com o que tenho vestido.

O luxo é individual. Se vir pessoas a brindar com Dom Pérignon dentro de uma limusine, penso: “Que embaraçoso.” Mas, se vir duas pessoas com uma cadeira de campismo ao pé de uma falésia, a brindar com uma cerveja, a comer tremoços e a ver o pôr-do-sol, penso: “Que luxo.”

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