Voltaremos aos professores acabados de sair do ensino secundário?
Quem é o engenheiro informático que quer ser professor? Com a falta de profissionais na área e com os ordenados que as empresas estão a oferecer, quanto irão enveredar pelo ensino? Não será pelos faustos vencimentos e pela valorização profissional, de certeza.
Voltaremos aos professores acabados de sair do ensino secundário? Até aí nada de novo. Nos idos anos 80 e 90 do século passado já aconteceu.
A massificação do ensino levou a uma falta de professores tal que qualquer um com o 12.º ano podia dar aulas na sua área de “especialização” do secundário. Não era incomum encontrar um “professor” acabado de sair do secundário ou do serviço militar obrigatório à frente de uma sala de aula.
Em 2018 escrevi sobre o que nos esperava, mas, é claro, poucos foram os que leram com atenção e muitos os que não se acreditaram que estávamos à beira do abismo.
Na última sexta-feira, o ministro da Educação revelou os números da colocação em mobilidade interna e contratação inicial de professores para o próximo ano letivo. Referiu que as escolas tinham colocados quase todos os professores necessários para o arranque, mas tal não se verifica.
O Ministério da Educação parte do princípio que todos os professores do quadro, colocados cumprem os critérios de componente letiva máxima, 25 horas para os da Educação Pré-escolar e 1.º ciclo, e 22 horas para os do 2.º, 3.º ciclo e secundário, mas tal não acontece devido à redução da componente letiva que advém da idade.
Esta situação, só por si, desmente os números apresentados em conferência de imprensa. O ministro também só referiu que os “97,7% dos horários pedidos pelas escolas tinham professores atribuídos”, não referiu que as escolas tinham essa percentagem de alunos com professor a todas as disciplinas.
As escolas, só dia 18 de agosto, ou no dia 1 de setembro vão ter a noção exata de quantos mais professores necessitarão. O envelhecimento docente leva a cálculos desfasados da realidade, porque a plataforma de concursos tem essa grande falha e não interessa resolvê-la ou o bonito das conferências não seria tão bonito.
O cerne da questão é que faltam muitos professores e a situação irá continuar a piorar nos próximos anos. Já em 2018 escrevi que, “ser professor já não é uma profissão atraente e quem ainda envereda por ela, cedo ou tarde, verifica que este país não é para professores”. E continua a não ser.
Por essa razão foi anunciada uma revisão das habilitações para a docência. Essa revisão trará de volta às escolas “professores” sem componente pedagógica no currículo das suas licenciaturas ou mestrados que, depois, poderá ser, ou não, realizada através da profissionalização em serviço.
Mas quem é o engenheiro informático que quer ser professor? Com a falta de profissionais na área e com os ordenados que as empresas estão a oferecer, quanto irão enveredar pelo ensino? Não será pelos faustos vencimentos e pela valorização profissional, de certeza. E na área da Geografia? Quantos se têm formado? Para professor de Inglês haverá muitos professores acabados de completar uns módulos numa das muitas escolas particulares da língua. Matemática será mais complicado, terão mesmo de convencer os engenheiros de uma dessas engenharias vetadas ao desemprego ou gestores e administradores de empresas que não existem.
O que é necessário para que isto não aconteça? Todos o sabemos, mas não há vontade de o fazer. O certo é que estas soluções avulsas sairão muito mais caras ao país e às futuras gerações do que valoriza, hoje a profissão de professor.
Acabo com o mesmo parágrafo de 2018: “Restar-nos-á o exemplo do que está a acontecer em alguns municípios do Reino Unido, com professores de Educação Física, formados em Portugal, a lecionar Matemática e Ciências, por na sua formação base terem uma ou duas cadeiras sobre essas matérias. Serão estes os professores do futuro?” Serão com certeza.
O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990