Vamos ser todos avós por um dia?
Um dia em que as mães e os pais se transformavam em avós? “Era o que faltava roubarem-nos os trunfos. Nem que seja por um dia.”
Querida Mãe,
bom Dia dos Avós.
Proponho que hoje todos os pais se tornem avós por um dia! Que, por um dia, não fique no planeta um único pai ou mãe. Já imaginou o bom que seria? O que as crianças adorariam? Todos os adultos das suas vidas teriam mais tempo para eles. E, se calhar, mais amor incondicional.
Era um dia sem discussões tontas sobre pequenas coisas que não interessam nada, porque os avós já sabem que a vida acaba demasiado depressa e que não se pode perder tempo a seguir regras parvas.
Só se viam adultos a jogar à macaca com os miúdos, porque já não têm vergonha do que os outros possam pensar.
Até o ritmo do mundo abrandaria porque todos estes novos “avós” não passariam a correr por flores bonitas, sem tempo para lhes mostrar como as abelhas gostam de pousar ali mesmo no centro. E, sim, haveria mais chocolates no mundo, mas também mais passeios na natureza e mais jogos, e por isso os doces seriam um detalhe num dia cheio.
E, não, não faria falta a educação para a sustentabilidade, nem para a reciclagem porque, afinal, na geração dos avós usavam-se garrafas de vidro, que era obrigatório devolver. E ninguém sabe mais sobre mezinhas naturais para tirar as nódoas. As da roupa e as mais invisíveis, que estão cá dentro e, às vezes, magoam.
Por isso vamos todos ser avós por um dia. Ou talvez até dois ou três.
Querida Filha,
Hum, adorei a tua carta, mas não sei se queremos tanta concorrência. Deixem-se lá estar no papel de pais, porque uma parte da graça de sermos avós é concorrermos convosco. Para ganhar, claro. Ou julgas que me esquecia da tua Birra/ Provocação de ontem?
Além do mais, assim os miúdos vão percebendo que a sabedoria se adquire com a idade, que em casa dos avós os chateiam menos e come-se melhor (no caso vertente, só se for o avô a cozinhar), e que a Terra não deixa de girar lá porque viramos do avesso as regras que, com tanto esforço, os pais lhes impõem.
Mas não me admira nada que vocês queiram trocar. Não viste na porta do meu frigorífico um íman a dizer que se soubesse que era tão bom ser avó, tinha começado logo por aí? Pois, mas não pode ser. Era o que faltava roubarem-nos os trunfos. Nem que seja por um dia.
O Birras de Mãe, uma avó/mãe (e também sogra) e uma mãe/filha, logo de quatro filhos, separadas pela quarentena, começaram a escrever-se diariamente, para falar dos medos, irritações, perplexidade, raivas, mal-entendidos, mas também da sensação de perfeita comunhão que — ocasionalmente! — as invade. E, passado o confinamento, perceberam que não queriam perder este canal de comunicação, na esperança de que quem as leia, mãe ou avó, sinta que é de si que falam.