Por que não querem advogados nos tribunais de família e menores – Parte II
Já me chegaram ao escritório pais e mães que, tendo participado em conferências de pais no tribunal sem a presença de um advogado, de lá saíram com um “acordo” que julgavam tratar-se de uma decisão imposta pelo tribunal.
Em muitos dos processos da jurisdição da família e menores não são necessários advogados. Nestes litígios judiciais delicadíssimos, onde se decide o futuro das nossas crianças, permite-se que os pais compareçam sozinhos em tribunal e, portanto, desacompanhados de um representante habilitado a conduzir o processo.
As consequências de as partes em conflito se representarem a si próprias são muitas vezes desastrosas. Na verdade, são poucos aqueles que, em matérias tão sensíveis como aquelas que se discutem nos tribunais de família, conseguem manter a objetividade que se requer quando se trata de decidir o futuro dos filhos, por exemplo. Em artigo anterior publicado neste jornal já nos insurgimos contra esta possibilidade admitida pela nossa lei.
E a verdade é que já me chegaram ao escritório pais e mães que, tendo participado em conferências de pais no tribunal sem a presença de um advogado, de lá saíram com um “acordo” que julgavam tratar-se de uma decisão imposta pelo tribunal…
O facto de estes processos dispensarem a presença de advogados acarreta, porém, outras consequências negativas para os cidadãos. É que, em regra, as diligências judiciais (conferências, julgamentos, etc.) são marcadas tendo em atenção a agenda dos advogados. No caso da maioria dos processos de família, porém, e uma vez que aí se dispensa a presença de advogados, há tribunais que não tomam em consideração as agendas desses representantes das Partes — afinal, se não é necessário ter advogado no processo, não há que adiar um julgamento ou conferência só porque ele não pode estar presente.
Assim, um pai ou mãe que, consciente da gravidade da matéria, contrata os serviços de um advogado para o representar num processo de regulação das responsabilidades parentais, corre o risco de não o ter a seu lado na conferência de pais, por exemplo, ou numa diligência de prova, porque o tribunal decidiu proceder à sua marcação sem tomar em consideração a agenda do advogado.
Estes são, pois, os danos colaterais da desnecessidade da presença de advogados em muitos dos processos da jurisdição da família e menores, e que atingem também aqueles que optam, e muito bem, por ter um advogado a seu lado.
Refira-se, em abono da verdade, que a maior parte dos tribunais da área da grande Lisboa, que melhor conheço, são sensíveis a esta questão e tentam conciliar as datas com as agendas dos advogados. Mas existem algumas exceções, e de relevo. São tribunais que secundarizam o papel dos advogados — com suporte na lei, sublinhe-se — por razões que não são evidentes. Alguns dirão que, sem advogados presentes nas diligências, será mais fácil conseguir acordos que os advogados eventualmente impediriam, por entenderem não corresponderem aos melhores interesses dos clientes ou dos seus filhos. Não quero, todavia, acreditar que seja assim, e prefiro pensar que se trata de tribunais que professam uma interpretação mais literal e formal da lei, sem cuidar de atender ao direito — constitucional — que a todos assiste de se fazerem representar por um advogado.
É claro que os tribunais, em ambos os casos, limitam-se a aplicar a lei, tal como a interpretam, pelo que é ao legislador que deverão ser assacadas responsabilidades por ter previsto que nestes processos os advogados são dispensáveis. Assim se melhoram as estatísticas da justiça, mas deixam-se por resolver os problemas das pessoas.
Note-se que o direito a ser assistido por um advogado encontra-se expressamente previsto na nossa Constituição, integrando o direito mais vasto, e também constitucionalmente consagrado, de acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efetiva (cf. o art. 20º). Às vezes não parece.
O autor escreve segundo o Acordo Ortográfico de 1990