Entre soluços, Amber Heard acusou Johnny Depp de agressão sexual
A actriz mostrou uma enorme aflição emocional no banco de testemunhas, na quinta-feira, quando chegou ao momento de descrever o incidente em que o ex-marido Johnny Depp, segundo a própria, a agrediu sexualmente com uma garrafa e ameaçou a sua vida.
Foi entre soluços e com sinais de extrema tensão que a actriz Amber Heard testemunhou, na quinta-feira, sobre alguns incidentes de violência sexual que, segundo acusa, ocorreram durante a viagem que fez com o ex-marido à Austrália, onde Johnny Depp estava a filmar um dos títulos da saga Piratas das Caraíbas, cerca de um mês após o casamento, em 2015, incluindo detalhes gráficos sobre os acontecimentos.
De acordo com Heard, logo na primeira noite, o casal discutiu ainda antes do jantar que tinha planeado. Foi um embriagado Depp, testemunhou a actriz, que a empurrou e a segurou pelo pescoço. Amber Heard diz que conseguiu fugir, tendo-se refugiado no quarto. Mais tarde, contou, regressou já em camisa de dormir com a intenção de fazer com que o ex-companheiro se alimentasse. No entanto, de um modo que adjectivou como “beligerante”, o actor atirou garrafas que se partiram à sua volta.
A actriz acrescentou que Depp lhe arrancou a camisa de dormir e a atirou para cima de uma mesa de pingue-pongue. Logo de seguida, segundo relatou, ocorreu o episódio mais traumático: o actor, acusou, inseriu uma garrafa na sua vagina. “Ele estava a empurrá-la para dentro de mim vezes sem conta”, disse Heard, que afirmou que na altura só esperava que não fosse uma das garrafas partidas. A actriz testemunhou ainda que, durante o episódio, Depp disse repetidamente "Vou matar-te". “Eu estava assustada”, disse Heard. “Eu tinha acabado de casar com ele.”
Antes de relatar este momento, Heard, entre soluços, chegaria a afirmar: “Não quero fazer isto.”
Sobre o corte no dedo de Depp, que o actor disse ter sido causado pela ex-mulher, Heard contou que o actor estava zangado por diversos motivos, incluindo uma suspeita de uma infidelidade sua, tendo cortado o dedo quando pegou num telefone fixo e o partiu com as próprias mãos. Mais tarde, ela afirma ter encontrado mensagens escritas em sangue e tinta pela sala.
Durante o seu testemunho, Depp disse que a ex-mulher lhe tinha atirado com uma garrafa de vodka que se partiria na sua mão, justificando a ira da mulher com o facto de ele ter tido uma reunião com um advogado por causa de um possível acordo pós-nupcial. Enquanto o sangue saía em esguichos da sua mão (“como o Vesúvio”), o actor avaliou ter passado por um “esgotamento nervoso” que o levou a usar o seu próprio sangue para escrever nas paredes mensagens que “representavam as mentiras que ela contou”.
Alguns meses depois, de regresso a casa em Los Angeles, Heard disse que Depp lhe partiu o nariz e lhe arrancou mechas de cabelo noutro episódio violento, contrariando a tese apresentada pelo actor, que afirma que o elemento violento da relação era a ex-mulher. A actriz afirma que nunca bateu em Depp excepto para se defender ou para proteger a sua irmã mais nova. Johnny Depp, por seu turno, declara que "jamais” bateu numa mulher.
Ciúmes e violência
Amber Heard, que começou a testemunhar na quarta-feira à tarde, e que deverá continuar a 16 de Maio (o julgamento fica em suspenso até lá), descreveu Johnny Depp como controlador, nomeadamente sobre a sua vida profissional. Num dos exemplos citados, a actriz recua até 2014 quando, num avião particular, o ex-marido se exaltou a propósito de uma cena romântica num filme em que contracenava com o actor James Franco.
A actriz afirmou que Depp, que cheirava a marijuana e álcool, começou a questioná-la sobre uma cena íntima com Franco, sugerindo que tinha gostado. Heard disse que tentou não responder à provocação, mas que o então ainda namorado lhe deu um estalo, atirou-lhe cubos de gelo e depois pontapeou-a nas costas. Em seguida, Depp acabou por ir à casa de banho, onde, alega a actriz, desmaiou.
O incidente, recordou, levou-a a ponderar deixá-lo. “Tinha medo de o deixar; tinha medo se não o deixasse”, desabafou. “Não me sentia segura quando ia para casa.” Mas, segundo a actriz, Depp implorou por perdão e prometeu que ia tratar de se manter sóbrio. “Aceitei na condição de que ele iria manter a sua promessa de fazer o tratamento, de fazer a desintoxicação total.”
Porém, o mesmo incidente foi recordado de forma diferente por Depp: negou ter bebido excessivamente nesse dia, dizendo que tinha tomado dois comprimidos de opiáceos e talvez bebido uma taça de champanhe. No avião, contou o actor, a companheira estava “activamente à procura de uma forma de provocar uma briga”, levando-o a retirar-se para a casa de banho.
James Franco, com quem a actriz terá tido um caso durante o tempo em que se relacionava com Johnny Depp, como demonstraram vídeos levados a tribunal pelo ex-marido, foi incluído na lista de testemunhas da actriz, mas recentemente veio a público que o actor e produtor não iria tomar parte da defesa de Mera de Aquaman.
Johnny Depp afirma que Amber Heard o difamou quando escreveu um artigo para o The Washington Post, em Dezembro de 2018, no qual relatou ser uma sobrevivente de abusos domésticos. Pouco tempo depois, Depp interpôs uma acção de 50 milhões de dólares (47,3 milhões de euros), considerando que as “falsas acusações” lhe “custaram tudo”. Na altura, um novo filme da rentável franquia Piratas das Caraíbas foi atirado para a gaveta e a sua participação em Monstros Fantásticos foi descontinuada.
No texto que levou o ex-casal a uma batalha judicial milionária, Amber Heard não identifica o seu agressor pelo nome, mas, defende o advogado de Depp, Benjamin Chew, era claro que se estava a referir ao actor. Do seu lado, a actriz não nega que de facto falava sobre o ex-marido, mas observa que, por um lado, apenas escreveu a verdade e que, por outro, a sua opinião está protegida como livre expressão ao abrigo da Primeira Emenda da Constituição dos EUA. Ou seja, respondeu com uma contra-acusação, pedindo uma indemnização de cem milhões de dólares (94,6 milhões de euros).
Depp vs. Heard
Johnny Depp e Amber Heard conheceram-se em 2009, nas filmagens da longa-metragem O Diário a Rum. Casaram, numa cerimónia privada, em 2015. Mas, apenas um ano depois, a actriz entrava com o pedido de divórcio, tendo conseguido uma ordem de afastamento temporária contra o actor, que acusou de abusos verbais e físicos. Depp negou sempre essas acusações e, através dos seus representantes, alegou que Amber Heard estaria em busca de uma compensação financeira.
Depois de alguns tumultos, Heard retirou as queixas de violência doméstica e o ex-casal emitiu uma declaração conjunta em que dizia que a “relação era intensamente apaixonada e por vezes volátil, mas sempre ligada pelo amor”. E declararam: “Nenhuma das partes fez falsas acusações por ganhos financeiros. Nunca houve qualquer intenção de dano físico ou emocional.” Na altura, Depp pagou à ex-mulher sete milhões de dólares (6,6 milhões de euros) que a actriz se comprometeu a doar à União Americana pelas Liberdades Civis (ACLU, na sigla original) e ao Hospital Infantil de Los Angeles — algo que, cinco anos depois, ainda não fez na totalidade. Terence Dougherty, conselheiro geral da ACLU, afirmou em tribunal que a instituição terá recebido cerca de 1,3 dos 3,5 milhões de dólares prometidos: 350 mil pagos directamente por Amber Heard; cem mil, através de Depp; e 850 mil através de um fundo de doadores, entre os quais estaria Elon Musk. “Não recebemos quaisquer montantes em 2019 e nos anos seguintes”, confirmou.
Após a publicação do artigo no The Washington Post, deste lado do Atlântico, o The Sun publicou um artigo em que apelidava o actor de “espancador da mulher”. E, durante as audiências, que decorreram em Londres no Verão de 2020, a relação entre os dois foi descrita como “tóxica e violenta”.
Ambos falaram sobre o casamento e comentaram os alegados casos extraconjugais. No processo foi ainda explorado o estilo de vida hedonista de Johnny Depp e a sua luta contra a dependência de álcool e de drogas. Sob a influência destes, Amber contou que Depp se transformava num “monstro”, tendo muitas vezes ameaçado matá-la — a actriz reviu em detalhe 14 ocasiões de extrema violência, em que acusou o actor de a ter asfixiado, esmurrado, esbofeteado, estrangulado e pontapeado.
Depp refutou as acusações, afirmando que nunca tinha sido violento para com a sua ex-mulher, acusando-a de ser sociopata e de ter sido responsável por ele ter perdido a ponta de um dedo, quando lhe atirou com uma garrafa no meio de uma violenta discussão. Mas, na sequência desse episódio, a actriz relatou que viveu uma “situação de sequestro” ao longo de três dias. Depp pronunciou-se sobre o assunto em tribunal, dizendo: “Essas alegações doentias são completamente falsas.”
O tribunal londrino, porém, deu como provada a violência contra a actriz, considerando assim que a expressão do The Sun não constituía difamação e que Depp não tinha razão.