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O que sabemos sobre os casos de hepatite aguda em idade pediátrica?

As hepatites podem ser assintomáticas ou causar sintomas ligeiros e inespecíficos, como, anorexia, cansaço, náuseas, vómitos, dor abdominal e febre, confundindo-se com outras infecções.

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Ricardo Lopes

O inesperado aumento de casos de hepatite aguda em idade pediátrica de causa desconhecida, maioritariamente na Europa e nos Estados Unidos da América, tem colocado em alerta as autoridades de saúde, os médicos e os pais. Até à data, segundo a Direcção-Geral da Saúde (DGS), não há casos registados em Portugal.

A hepatite aguda não é uma doença nova. Trata-se de uma inflamação difusa do fígado, em que ocorre lesão e morte dos hepatócitos. As causas que levam à lesão hepática são várias, incluindo infecciosas, tóxicas/medicamentosas, auto-imunes (desregulação do sistema imunitário) ou metabólicas.

A causa mais frequente de hepatite é a infecciosa, sendo os vírus os principais responsáveis. Os vírus que afectam especificamente o fígado (hepatotrópicos) apresentam diversos modos de transmissão e epidemiologia (vírus da hepatite A, B, C, D, E). Contudo, existem outros vírus que, embora não actuando predominantemente no fígado, também podem causar hepatite, geralmente ligeira e transitória.

As hepatites podem ser assintomáticas ou causar sintomas ligeiros e inespecíficos, como, anorexia, cansaço, náuseas, vómitos, dor abdominal e febre, confundindo-se com outras infecções. O aparecimento da cor amarela dos olhos e da pele (icterícia), assim como urina muito escura (colúria) ou fezes descoradas (acolia), são sinais mais específicos do envolvimento do fígado e devem motivar observação médica.

A maioria dos casos de hepatite vírica tem resolução espontânea. O organismo consegue reagir à infecção e o fígado recuperar totalmente em algumas semanas. No entanto, alguns casos evoluem para hepatite crónica. Mais raramente, em crianças saudáveis, a hepatite vírica aguda pode progredir de uma forma rápida para falência hepática aguda, na qual o fígado deixa de ser capaz de realizar as suas múltiplas funções. Ainda assim, nestes casos, que são graves e que exigem tratamento diferenciado, também é possível ocorrer resolução do quadro clínico. Caso contrário, é necessário recorrer ao transplante de fígado.

O tratamento depende da gravidade, mas geralmente é de suporte e inclui uma boa hidratação e repouso. Dependendo do tipo de vírus envolvido, é possível a profilaxia pré e pós-exposição, utilizando-se imunoglobulinas ou vacinas.

Para a prevenção é fundamental a higienização dos alimentos que são ingeridos crus, a lavagem frequente das mãos e uma boa higiene respiratória, nomeadamente, tossir para um lenço de papel ou cotovelo.

O que sabemos até ao momento sobre os casos de hepatite aguda?

Os casos de hepatite de etiologia indeterminada foram descritos em crianças com idades entre 1 mês e 16 anos, maioritariamente, entre 3 e 5 anos. A maioria das afectadas era saudável e a apresentação mais frequente da doença foi um quadro gastrointestinal (dor abdominal, vómitos, diarreia) nas 2-3 semanas prévias ao aparecimento da icterícia. A maioria das crianças recuperou espontaneamente. Em 10% dos casos, foi necessário recorrer a transplante hepático.

A comunidade científica aponta para uma possível causa infecciosa. O adenovírus já foi identificado em muitos dos doentes, podendo ser um potencial agente causal. A circulação destes vírus, normalmente causadores de quadros gastrointestinais e respiratórios, é comum nesta época do ano.

De momento, não devem ser feitas especulações sobre possíveis agentes etiológicos nem sobre eventuais associações com a vacinação contra o SARS-COV2, com o fim da utilização de máscara ou com uma maior fragilidade do sistema imunitário. Devemos aguardar as conclusões das sociedades médicas e científicas que estão a investigar os casos.

Em Portugal, a Sociedade Portuguesa de Pediatria (SPP) criou um grupo de trabalho que já elaborou um protocolo de actuação clínica e de investigação. A DGS, em articulação com a SPP e o Programa Nacional para as Hepatites Virais, anunciou a criação de uma task force para acompanhar e avaliar a evolução da situação e elaborar orientações técnicas.

Os pediatras estão preparados para lidarem com situações de hepatite aguda e informados sobre as especificidades destes casos. Os pais deverão manter-se tranquilos e atentos aos sinais de alerta.

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