Loucura é não cuidar da sua saúde mental

A 10 de Outubro celebra-se o Dia Mundial da Saúde Mental, sendo um momento oportuno para uma breve reflexão no que respeita ao posicionamento e investimento de Portugal para assegurar a saúde mental dos portugueses e sobre a desmistificação de estigmas à volta da doença mental.

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@petercalheiros

Portugal encontra-se em segundo lugar, entre os países europeus, com maior prevalência de perturbações psiquiátricas na população. De acordo com o Estudo Epidemiológico Nacional de Saúde Mental, um em cada cinco portugueses sofre de uma perturbação psiquiátrica.

As perturbações de ansiedade, seguidas da depressão são as que apresentam maior expressão, em consequência, o consumo de antidepressivos e de ansiolíticos também coloca Portugal em lugares preocupantes entre os países da OCDE. Cerca de 20% das pessoas, em algum momento da sua vida, são diagnosticadas com depressão.

Estes números mostram que a aposta na saúde mental é, mais do que nunca, imperiosa, dado o seu forte impacto na sociedade e na economia do país. É certo que o equilíbrio emocional e o bem-estar geral das pessoas são fundamentais para melhorar a sua produtividade laboral, o seu desempenho escolar e a sua qualidade de vida. Senão, vejamos: Quem consegue trabalhar ou estudar quando sente desânimo, irritabilidade, stress, medo, ou sofre de violência doméstica? Tudo isto tem um forte reflexo na eficácia e na auto-estima da pessoa, gerando facilmente um círculo vicioso com pensamentos de incapacidade e crítica, sensações físicas negativas (cansaço, taquicardia, mal-estar), desânimo, isolamento, falta ao trabalho ou produção diminuída.

Em Portugal, o Plano Nacional de Saúde Mental não teve a repercussão desejada no acesso das pessoas às respostas na área da saúde mental, dado que, por exemplo, os portugueses continuam a gastar muito em medicação, têm um acesso limitado aos psicólogos no SNS e ainda há muitos seguros de saúde sem cobertura para a psicologia.

O acesso a um psicólogo na comunidade é uma questão de direitos humanos, porém, mantém-se difícil para grande parte da população portuguesa, tanto pela escassez destes profissionais nas áreas de maior necessidade e pela falta de continuidade do atendimento, como pela ausência de divulgação do serviço e da sua gratuidade. Isto conduz facilmente a que o atendimento psicológico fique limitando à classe média/alta.

O estigma sobre a doença mental

Embora os problemas de saúde mental afectem várias áreas da vida pessoal, familiar e profissional das pessoas e a pandemia tenha chamado atenção para a necessidade de investir seriamente na promoção da saúde mental, em Portugal, sofrer de uma doença mental ainda está associado a um forte estigma e discriminação, presente em todas as esferas da sociedade. A gravidade desta alegada vergonha social apenas contribui para que as pessoas não recorram aos tratamentos com psicólogos e/ou psiquiatras.

O estigma surge associado a crenças erradas sobre a saúde e a doença mental, sendo esta última muitas vezes considerada uma fraqueza de carácter. Em algumas situações, o maior estigma é aquele que cada um impõe a si próprio através da autocrítica e da vergonha. Encontrar alguém na sala de espera de um consultório de psicologia ainda é muito embaraçoso.

O estigma sobre a doença mental representa, também, uma dimensão do sofrimento envolvido nas perturbações. Por exemplo, um deprimido pode culpar-se pela sua falta de “carácter” ou de “energia” aumentando o seu sofrimento, que se torna ainda pior se as pessoas à sua volta forem acusatórias ou afastarem-se.

A depressão é a segunda causa de morte por suicídio em jovens entre os 15 e os 30 anos, porém, ainda assim, há mitos enraizados em relação aos medicamentos antidepressivos e à psicoterapia que dificultam o pedido de ajuda pelos jovens.

Devemos confiar na Psicologia e na Psiquiatria enquanto ciência, quebrando mitos infundados, como por exemplo, de que sempre que se está na presença de um “psi” deve-se ter receio de que ele possa adivinhar o que a pessoa está a pensar. Não somos bruxos! E, na verdade, estes também não advinham nada.

Os factos sobre a saúde e doença mental

Num ou noutro momento da vida, todas as pessoas sentem ansiedade, raiva, tristeza, desespero, medo, dificuldades em dormir, entre outros. Ninguém está livre de ter um problema psicológico e de precisar da ajuda de um profissional.

Os tratamentos psicológicos não põem fim à violência, só sendo isto possível através da mudança de crenças sociais e das atitudes dos cidadãos. Pedir ajuda e receber um tratamento adequado é um primeiro passo.

Muitas perturbações mentais surgem no período da adolescência, daí a aposta na prevenção e na psicoeducação ser importante desde a infância.

A evidência científica revela que alguns aspectos ambientais e de personalidade ligados à parentalidade, como por exemplo, a pobreza, o emprego precário, o baixo nível de educação formal, o consumo de substâncias, a instabilidade emocional ou a doença mental de um dos pais, podem conduzir as crianças à problemas ligados à saúde mental, como por exemplo, a ansiedade de separação, as dificuldades interpessoais, a ansiedade social ou as dificuldades de sono, aumentando a necessidade de atenção às intervenções de promoção de capacidades junto dos pais.

Para acabar com o estigma à volta da doença mental, é essencial dar conhecimento às pessoas para que compreendam a importância dos cuidados de saúde mental, começando pelos mais novos, nas instituições de ensino, até os adultos, nos locais de trabalho.

Nem todas as pessoas que procuram um psicólogo são diagnosticadas com uma doença mental formal, embora a ausência de intervenção atempada possa acelerar a evolução para uma perturbação diagnosticável. Os problemas de saúde mental incluem também as dificuldades e vulnerabilidades pessoais que afectam o bem-estar dos indivíduos, incluindo, por exemplo, o sofrimento associado a uma situação de divórcio, as dificuldades inerentes a uma relação conflituosa com outra pessoa e a perda ou a mudança de emprego.

Sobre a importância de pedir ajuda

Uma boa saúde mental representa um factor de protecção e de resiliência para o indivíduo, que contribui para um funcionamento adequado na sua vida pessoal, familiar, social e laboral. Uma pessoa deve procurar ajuda de um profissional especializado, sem sentir vergonha, se:

  • Tem dificuldade em compreender e lidar com situações de vida difíceis ou repentinas e precisa de orientação para se reorganizar;
  • Evita estar com outras pessoas;
  • Sente um desgaste emocional e um desequilíbrio entre as exigências das tarefas do dia-a-dia, do trabalho e/ou parentais e a capacidade física e psicológica para desempenhá-las;
  • Sente irritabilidade aumentada, exaustão, alteração no sono e no apetite, menor produtividade que se mantém no tempo;

No caso das crianças, se estiverem mais agitadas, zangadas, dependentes ou mais irritadas do que o habitual; se fizerem xixi na cama sem explicação aparente; se tiverem dificuldades em dormir, e, nos adolescentes, se mostrarem tendência ao isolamento, irritabilidade aumentada e mudanças constantes de humor.

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