Colombianos em Portugal manifestam-se sábado contra a violência policial
Duas concentrações em Lisboa e no Porto servem para chamar a atenção para “as violações de direitos humanos” contra os participantes dos protestos que agitam a Colômbia há quase um mês.
Desde o final de Abril que a Colômbia atravessa um dos momentos mais conturbados da sua história recente, com protestos violentos quase diariamente que já causaram dezenas de mortos. O que começou como uma manifestação e greve geral contra a reforma fiscal transformou-se em algo de muito mais sério e é todo o sistema político que está agora em causa. Este sábado, concentrações em três cidades portuguesas juntam-se a um movimento global para tentar travar a violência policial no país sul-americano.
Até dia 18 de Maio, foram mortas pelo menos 43 pessoas em confrontos com a polícia e o Exército durante manifestações em todo o país, de acordo com a organização não-governamental Temblores. A violência contra os participantes em protestos tem crescido de intensidade e assume novos contornos. A violação e agressão de uma jovem de 17 anos por elementos da força antimotim, que se suicidou, chocou o país e expôs uma nova dimensão da violência policial.
O objectivo principal das manifestações deste sábado é “dar visibilidade às violações de direitos humanos” pelas forças de segurança colombianas, diz ao PÚBLICO a activista Catalina Cadena, uma das organizadoras da iniciativa. O colectivo “Colômbia em Paz” já tinha organizado acções semelhantes no início do mês, porém, desde então, a situação no país sul-americano deteriorou-se.
“Duplicou o número de homicídios perpetrados pelas forças públicas, há casos de violência sexual contra manifestantes mulheres”, descreve a publicitária de 33 anos, a viver há onze em Portugal. Em Lisboa, a concentração está marcada para as 17h deste sábado na Praça Luís de Camões e, no Porto, às 18h na Avenida dos Aliados.
O que ouve de pessoas conhecidas em cidades como Bogotá ou Cali, o epicentro das manifestações mais violentas, são ecos de uma “militarização” dos locais dos protestos. Catalina dá o exemplo da utilização da polícia de granadas de gás lacrimogéneo “fora do prazo” que torna a substância letal e diz que há pessoas que estavam em casa e morreram ao inalar o gás libertado.
A colombiana descreve um ciclo que se vai repetindo sempre que há manifestações. De dia, “o Governo é meiguinho”, conta. “As manifestações são positivas, há música, movimentos culturais que animam a população, mas a partir das seis da tarde, quando começa o sol a cair, começam os ataques”, diz Catalina.
O Governo colombiano tem justificado a acção musculada da polícia como uma resposta a actos de vandalismo e ataques perpetrados contra os agentes, mas há muito que vários sectores da sociedade exigem uma reforma das forças de segurança. Durante décadas, a polícia teve pela frente cenários de violência extrema, com o combate ao narcotráfico e a movimentos de guerrilha, como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC).
Hoje, há quem veja uma desadequação dos meios e das práticas da polícia, uma das raras a estar sob a égide do Ministério da Defesa, para lidar com a população civil. A reforma da polícia é “essencial” e uma das principais exigências dos manifestantes, diz Catalina, a que acrescenta a extinção do Esquadrão Móvel Anti-Distúrbios (Esmad), a unidade antimotim que é hoje sinónimo do pior da violência policial para os activistas.
O Presidente colombiano, Iván Duque, iniciou um processo de diálogo com os principais líderes da greve geral, mas até agora com poucos frutos. A reforma fiscal caiu por terra e o Governo já mudou dois ministros desde o início da crise, mas o que está em causa já ultrapassa a política comum.
“Já não se trata de uma reforma mas de tudo o que está por trás”, diz Catalina Cadena, a que junta a corrupção na política, a dimensão do Congresso, a protecção dos activistas sociais e indígenas, o ensino universitário e os serviços de saúde, como tópicos que devem estar em debate daqui para a frente.
Apesar da violência, Catalina não acredita que os colombianos abandonem a contestação e escolhe o exemplo do Chile – que conseguiu forçar nas ruas a abertura de um processo de elaboração de uma nova Constituição – como um modelo para o seu país. “A Colômbia está a caminhar para encontrar mudanças reais nesse sentido, por isso não acredito que a população vá parar, porque isso só nos vai deixar pior”, afirma.