Liberdade de consciência e Educação para a Cidadania
Uma cidadania sem liberdade de consciência será sempre uma cidadania mutilada.
A liberdade de consciência é uma dimensão essencial da cidadania.
O primeiro significado que adquiriu a cidadania, quando foi introduzida pelo liberalismo a primeira geração de direitos e deveres, foi o da liberdade. E no centro dessa liberdade estava a liberdade de consciência do cidadão. Uma liberdade proclamada em face do Estado, contra o Estado, para preservar o reduto da privacidade contra as tendências e tentativas invasoras do Estado. Se havia domínio onde o Estado não devia entrar, e que devia respeitar, era o da consciência, o das convicções profundas dos cidadãos.
Por essa liberdade de consciência se bateram muitos dos que pretendiam limitar e separar os poderes do Estado.
A cidadania foi adquirindo e acumulando novos significados, ao longo dos últimos dois séculos – a participação, a igualdade de direitos, a solidariedade social, a sustentabilidade ambiental –, mas nunca deixou de, a esses significados novos, juntar o da liberdade. Uma cidadania sem liberdade de consciência será sempre uma cidadania mutilada.
Não pode haver, portanto, qualquer contradição entre a defesa da liberdade de consciência e a defesa da cidadania. Não pode haver qualquer contradição entre a defesa da liberdade de consciência e a defesa dos direitos humanos, porque a liberdade de consciência é um dos primeiros e dos mais fundamentais direitos do homem. Não pode haver defesa da cidadania que contradiga a liberdade de consciência.
Uma educação para a cidadania não pode deixar de ser uma educação para a liberdade, e para a liberdade de consciência, não pode atentar contra a liberdade de consciência, não pode pretender invadir a esfera eminentemente pessoal. O Estado não pode assumir-se como promotor de uma concepção antropológica, vincadamente ideológica, que exclui a determinação do género pela biologia e pela natureza, que nega a diferença e a complementaridade entre homem e mulher. O Estado não pode propor-se alterar “costumes, atitudes e valores” sexuais, nem tão pouco eliminar “preconceitos e estereótipos” de género, porque esse não é o domínio da sua intervenção, porque essas são matérias da esfera pessoal, de consciência.
Quando essas matérias chegam ao Parlamento, os partidos reconhecem, regra geral, que se trata de questões de consciência e dão liberdade de voto aos seus deputados, não impondo a disciplina partidária. Por que razão se há de recusar na escola o que se reconhece no Parlamento?
Daí o direito que assiste a qualquer cidadão de resistir às ofensivas do Estado de invadir o domínio do foro pessoal dos cidadãos, arvorado em promotor de valores que atentam contra a sua consciência nos domínios que são da sua vida privada. Daí o direito dos pais a recusar uma educação que não respeite os valores da sua consciência, que não respeite a natureza humana, que não respeite o pluralismo de concepções éticas sobre a vida e a sexualidade. Sobretudo, quando um programa e uma actuação generalizada pretendem inculcar em crianças e jovens a ideologia, sem sustentação científica e academicamente controversa – pelo contrário, contradizendo o que a genética e a biologia nos ensinam –, de que o género é apenas uma construção social, passível de desconstrução por opção de cada um, com todas as graves consequências que essa mentalidade acarreta do ponto de vista sanitário e psicológico.
Não procedem, por conseguinte, as acusações ao abaixo-assinado em defesa do direito prioritário dos pais à educação dos filhos e da liberdade de consciência na educação cívica e moral, de ser contra os direitos humanos, contra a democracia ou contra a educação para a cidadania, porque ele afirma precisamente direitos humanos e uma concepção da cidadania que repousa basicamente na liberdade, porque ele afirma o pluralismo democrático próprio da liberdade de educação.
Acusar a defesa destes direitos humanos, de ser de direita e conservadora, revela a ideia de que a esquerda democrática (a não democrática, já nós sabemos que não respeita os direitos humanos) é contra eles, o que é desmentido pela história da cidadania.
O que atenta contra a dignidade humana, os direitos humanos, e contra a própria cidadania, é uma estratégia de moldar a nossa juventude num pensamento único obrigatório, sem alternativa nem pluralismo, sem respeito pela natureza humana nem pela diversidade e complementaridade dos sexos, sem respeito pelos “costumes, atitudes e valores” relativos à sexualidade, em que pertence aos pais o direito e o dever primeiros de educar os filhos.