Birras, como sobreviver-lhes

A birra é assim como uma espécie de furacão, uma tempestade gigante e intensa de emoções, que geralmente envolve frustração profunda, raiva, perda (por vezes) e desânimo extremo que aparece sem razão aparente numa criança pequena.

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"Para controlar emoções fortes, uma criança precisa de desenvolver conexões entre o cérebro lógico e o cérebro emocional" Henley Design Studio/Unsplash

Todos nós, pais, sabemos que uma birra pode acontecer de um momento para o outro. São como as febres: aparecem de repente e são tantos os factores que as podem provocar, que se tornam muito difíceis de antecipar.

O que é uma birra?

A birra é assim como uma espécie de furacão, uma tempestade gigante e intensa de emoções, que geralmente envolve frustração profunda, raiva, perda (por vezes) e desânimo extremo que aparece sem razão aparente numa criança pequena.

Normalmente, este quase “surto” emocional pode levar a criança a chorar, gritar, atirar-se para o chão, chutar, morder, bater em si ou no outros, atirar brinquedos pelo ar, bater a cabeça na parede ou até prender a respiração, até não conseguir mais… De certo que todos nós já vimos estas tempestades acontecerem!

Ao contrário do que muitas vezes ouvimos, as birras não são uma forma de a criança querer controlar o nosso comportamento ou manipular as nossas acções. O seu cérebro não é capaz de tal performance, a criança não é capaz de raciocinar ou manipular a situação. Mas nós adultos sim!

No caso dos mais pequenos, normalmente estes acessos acontecem quando estão chateados com algum acontecimento. Eles tendem a ter acessos emocionais quando estão aborrecidos, como no caso dos mais velhos (com mais de 4 anos), embora ainda não consigam regular-se emocionalmente e possam ter estas descargas emocionais. Dependendo do comportamento passado e das reacções dos pais, algumas crianças aprendem a usar as birras como meio de conseguir o que querem.

Por que fazem birras?

As birras da criança são comportamentos expectáveis em termos do desenvolvimento cerebral e emocional. Geralmente, resultam de necessidades ou desejos não atendidos num momento de desenvolvimento da sua independência. Curiosamente também testam as expectativas dos pais que, até então, estavam habituados a controlar tudo na vida da criança: o que come, o que veste, onde fica sentado, etc..

Do ponto de vista dos pais, a vida das crianças é fantástica: Quem me dera dormir 15 horas por noite, ter a comidinha preparada, fazer o que eu gosto e nada de trabalhar no dia seguinte…”​ Mas dentro do cérebro em desenvolvimento dos filhos, as emoções são imensas e intensas, sem capacidade vocabular de as traduzir ou expressar as suas necessidades: “Cheguei ao mundo há pouco tempo, estou a tentar classificar tudo à minha volta e a tentar explorar tudo de uma só vez. Ao mesmo tempo, só há pouco aprendi a andar e nem sempre consigo aquilo que quero porque as minhas habilidades motoras ainda não são as melhores e por vezes sai-me tudo ao lado!” Mais: “Ainda estou a aprender a falar e o facto de não ainda ter muitas palavras no meu vocabulário aumenta a minha raiva e frustração quando tento explicar o que quero!”

Paralelamente, os filhos esperam de nós segurança (porque explorar coisas novas pode ser assustador), conforto (porque nem sempre conseguem o seu objectivo) e orientação (para subir por exemplo para cima de algo que nós achamos perigoso). Tudo isto eles querem e gostam de partilhar com as pessoas mais importantes da sua vida: nós! A coisa sai um pouco furada quando o que normalmente nós temos para lhes dizer se resume a “não faças isso!”, “pára!” e “não toques aí!”, o que para eles, convenhamos, é algo sem sentido nenhum! Um verdadeiro balde de água fria! Por isso, reagem à frustração e decepção com a tal “tempestade” de emoções que o seu cérebro ainda não é capaz de controlar.

Explicando melhor o que se está a passar no seu cérebro: enquanto os seus sistemas de resposta ao stress, como por exemplo o choro, estão já maduros no momento do nascimento, isto por uma questão de sobrevivência (se o bebé não conseguisse sinalizar o perigo, ficaria à mercê dos predadores), o mesmo não se passa com os seus sistemas de regulação emocional que ainda não se encontram desenvolvidos.

Assim, o que acontece num momento de stress ou de raiva é que um pequeno alarme (amígdala) dentro de seu cérebro emocional (também conhecido como cérebro límbico ou inferior) é ligado. No entanto, o chamado cérebro superior ou racional da criança (também conhecido como córtex pré-frontal ou cérebro superior) não está suficientemente desenvolvido para conseguir gerir esse sistema de alarme e dar uma resposta regulada.

Nesta situação as hormonas do stress (cortisol e adrenalina) são lançadas na corrente sanguínea e como consequência as próprias emoções tornam-se mais intensas causando dor e angústia (mais ou menos parecido com o que sentimos na dor física). Por outro lado, o cortisol que foi lançado “inunda” literalmente o cérebro, “desligando” a parte mais racional, o que impede a criança de pensar, de ter acesso a qualquer pensamento lógico, como se essa parte do cérebro ficasse coberto por um pano branco (as chamadas “brancas” que todos já tivemos em exames, ou que alguém tem quando nos diz: “naquele momento eu estava com tanta raiva que disse coisas sem pensar”).

Para controlar emoções fortes, uma criança precisa de desenvolver conexões (entre neurónios) entre o cérebro lógico e o cérebro emocional. Só então o cérebro lógico pode acalmar racionalmente o cérebro emocional. Por isso, a birra aparece como a sua única forma de  expressar o seu sofrimento emocional e o facto de não conseguir lidar com isso sozinha é a sua forma de nos pedir ajuda!

Saiba mais sobre birras e torne-se um expert. Uma ferramenta eficaz é o livro Tita – A zebra que não queria ter riscas

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