O seu luto em tempo de pandemia
Se vive uma perda, queremos que saiba que os profissionais de saúde têm consciência que para si este é um momento ainda mais difícil e que estamos ao seu lado.
A pandemia da covid-19 está a criar um enorme impacto negativo na nossa percepção de segurança e de estilo de vida. O confinamento forçado, as más notícias sobre o aumento de casos e sobretudo o conviver diariamente com a mortalidade a nível local, nacional e mundial leva-nos para um ambiente de grande incerteza e ansiedade.
Se vive uma perda, queremos que saiba que os profissionais de saúde têm consciência que para si este é um momento ainda mais difícil e que estamos ao seu lado.
Estamos tristes ainda por saber que se o seu ente querido morreu no hospital e, por isso, não pôde estar com ele nos seus últimos dias. Sabemos que sentiu, porventura, que o abandonou e esse é um sentimento muito doloroso. E se depois do falecimento, o corpo foi directamente para o crematório ou sepultura e não pôde escolher a roupa que tinha pensado, ver o corpo, fazer o velório e funeral que desejava, vai sentir que não fez a homenagem que queria e que o seu ente querido merecia.
Além destas dificuldades, sabemos que está a perder aquilo que pensamos ser o mais importante num momento como este, tão difícil, que é a oportunidade de ser confortado e ter a compaixão dos familiares e amigos.
Aqui ficam com algumas recomendações que gostaríamos que lhe fossem úteis:
- Feche os olhos por breves momentos e dê-se conta do mundo à sua volta. Do momento difícil para todos, da necessidade de estarmos em casa e da importância destas medidas para a saúde de todos. Não é por culpa de ninguém que estamos assim. É um momento especial que afecta milhões de pessoas em todo o mundo. Sinta que muitas pessoas enlutadas estão a sentir o mesmo. Sinta-se em comunidade e em ligação com todos, que não está sozinho a viver este momento tão duro. Por exemplo, caso tenha vivido o sentimento de abandono do seu ente querido no hospital, compreenda que tal se deve à situação mundial e não à sua acção.
- Sinta que perder alguém é diferente de não realizar rituais fúnebres. Mesmo que esses rituais sejam relevantes para si, o importante é concentrar-se na perda o seu ente querido.
- Compreenda que se não realizou agora esses rituais poderá fazê-los mais tarde, altura em que poderá agendar missas, encontros de família e visitas ao cemitério ou ao local onde foram depositadas as cinzas.
- Enquanto está em casa, isolado pode focar a sua atenção na pessoa que partiu. Permita-se partilhar emoções, sentimentos e recordações com as pessoas que convivem consigo.
- Pode, se se sentir seguro, fazer pequenas reuniões com as pessoas com quem convive, para conversar sobre a que partiu e escutá-las. Permita que as crianças e adolescentes participem porque têm esse direito, além de que, muitas vezes, têm facilidade em falar sobre estes temas.
- Se preferir fazer estas homenagens em privado, opte pela escrita, expressando os seus sentimentos, ao mesmo tempo que ouve uma música que a pessoa tanto gostava ou que a faz ligar-se a essa pessoa tão querida.
- Permita e aceite as suas emoções associadas ao luto. Chorar e estar revoltado são emoções tão associadas à perda que, quando expressadas, sentimo-nos mais aliviados e compreendidos. Sentir que quer estar isolado é também um comportamento que deve aceitar em si e nos outros. Permita que as emoções dos outros se expressem também sem as conter ou limitar.
- Permita sentir-se mais frágil neste momento. Aceite a ajuda de outras pessoas. Abra o seu coração ao outro e à ajuda que lhe bate à porta. Poderá querer procurar um profissional que, nestes momentos, pode ser muito importante para o ajudar a expressar o que sente e a gerir o futuro do seu luto.
- Não esqueça que é um ser integral que, apesar de neste momento preferir estar focado na sua perda tão dolorosa, deve olhar para si como alguém que também deve cuidar da sua saúde física e mental e dos seus familiares. Mantenha as suas rotinas, hábitos saudáveis (exercício e alimentação) e, em caso de sintomatologia incapacitante, contacte o seu médico de família.
- Tome em atenção as crianças e adolescentes, que necessitam também de partilhar a dor e as emoções. O mais importante é criar um ambiente de segurança para que se sintam livres e aceites na forma como expressam as suas emoções, tiram dúvidas e recebem orientações compreensivas.
- Sinta que os psicólogos estão consigo e com a sua dor. Não hesite em contactar-nos para falarmos consigo. Temos consciência das dificuldades que está a sentir.
Um abraço fraterno,
Rui Devesa Ramos