Como os humanos moldaram o cérebro dos cães

Ressonâncias magnéticas a dezenas de animais constatou que a anatomia cerebral varia consoante a raça.

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Um cão da raça beagle, uma das 33 analisadas pelo estudo Claro Cortes/Reuters

Ao longo dos séculos, os seres humanos procuraram cruzar entre si diferentes raças de cão, com o objectivo de aglutinar características intrínsecas a cada uma delas. Actualmente, há milhares de variações deste animal de estimação por todo o mundo, com tamanhos, atributos e compleições díspares. Uma equipa de cientistas deu o primeiro passo para provar que este cruzamento selectivo promovido pelos humanos não afectou só as características físicas destes animais, mas também a forma como os seus cérebros funcionam.

Intitulado “Variações neuroanatómicas significativas entre raças de cães domésticos” , o trabalho publicado esta segunda-feira na revista The Journal of Neuroscience teve um ponto de partida simples, explica Erin Hecht, neurocientista na Universidade de Havard e autora principal do estudo, ao jornal Washington Post: “A primeira questão a que queríamos responder era se existiam diferenças entre os cérebros de cães de diferentes raças.”

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Ressonâncias magnéticas feitas a diferentes raças de cães Hecht et al., JNeurosci 2019

A equipa fez ressonâncias magnéticas a 62 animais, representantes de 33 raças, e concluiu que, mesmo tendo em conta as diferenças de tamanho entre os indivíduos da amostra, há alterações entre regiões dos cérebros das diferentes raças de cães. “A anatomia cerebral varia consoante a raça do cão. As estruturas dentro dos cérebros também são diferentes e, ao que tudo indica, alguma desta variação deve-se ao cruzamento selectivo tendo em conta comportamentos específicos, tais como a caça, o pastoreio ou a guarda”, explica Erin Hecht.

Os investigadores identificaram seis mapas de redes neurológicas que comandam certas funções, como olfacto e movimento. Nestes mapas dizem haver uma “correlação significativa” com os traços associados a cada raça. Ouvido pelo Washington Post, o director do Laboratório de Cognição Canina e Interacção Humana da Universidade de Lincoln, Jeffrey Stevens, classificou o recurso a ressonâncias magnéticas como uma decisão “inteligente”, mas deixou uma palavra de aviso aos cientistas. “A única coisa em que acho que existe algum desentendimento é a ligação dos comportamentos às raças. Muitas vezes, existe uma grande variação entre indivíduos.”

Todos os cães analisados, sublinhou ainda o especialista, eram animais de estimação de lares norte-americanos, não realizando actividades ligadas à caça ou pastoreio, por exemplo. Jeffrey Stevens defende que a correlação entre os mapas neurológicos agora traçados e os traços comportamentais característicos de cada raça poderia ser maior, caso fossem analisados cães que desempenhassem essas mesmas tarefas.

O próximo passo para a equipa de investigadores responsáveis pelo estudo inicial passará pelo aprofundamento da análise das diferenças cerebrais entre indivíduos pertencentes à mesma raça. “Por exemplo, entre um border collie que ganha competições de pastoreio no mundo real e outro que, por qualquer razão, prefere ficar sentado num sofá”, resume Erin Hecht. A cientista espera que, no futuro, os dados recolhidos nesta investigação ajudem e potenciar os tratamentos veterinários para as diferentes raças de cão. 

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