De quem é a Amazónia?
A Amazónia é a maior floresta tropical do mundo e possui a maior biodiversidade registada numa área do planeta. A sua importância é gigante.
A subjugação das políticas ambientais às lógicas económicas na Amazónia é tema antigo. Só que agora o contexto mudou. À frente dos destinos do Brasil está alguém que advoga uma liderança musculada e de confronto aberto e que parece acreditar, mais do que nunca, que desenvolvimento económico é sinónimo de exploração de recursos naturais, enquanto o mundo, sobretudo a Europa, está cada vez mais consciente de que vivemos em alerta ambiental. Nesta conjuntura só podia dar choque.
Os incêndios fizeram soar o alarme, mas a tensão vinha de trás. Em Junho, Bolsonaro já havia dito a Merkel e Macron que a Amazónia era do Brasil e que não permitiria interferências externas na gestão do território, enquanto os líderes europeus advogam que é uma questão internacional, mostrando preocupação pelos níveis de desmatamento florestal, com a Alemanha a suspender o financiamento de projectos para a protecção da área e diversos países europeus nos últimos dias a proporem boicotes.
A Amazónia é a maior floresta tropical do mundo e possui a maior biodiversidade registada numa área do planeta. A sua importância é gigante. E a juntar a isso existem também as ressonâncias simbólicas. No imaginário de milhões é o “pulmão do planeta” que está em causa, daí que perante os riscos não seja surpreendente que milhões de vozes se tenham feito escutar nos últimos dias, numa dinâmica em que as redes sociais — quase sempre demonizadas — foram decisivas, pela ressonância criada.
A celeuma é como definir o que é uma questão internacional. Existe quem advogue que se a Amazónia for tratada como um assunto vital para a presença na Terra, também o petróleo, as armas nucleares, o património cultural e outras dimensões capitais para a humanidade acabam por sê-lo.
Existe um fundo de verdade nessa proposição. E não deve ser esquecida. Se a Europa quer mostrar que o equilíbrio ecológico está posto em causa e que esta é a hora de proteger o meio ambiente, não basta solicitar que o Brasil ampare ou refloreste a Amazónia. É preciso que esses países façam nas suas zonas o que estão a pedir e ao mesmo tempo pressionem – por exemplo, Trump e Putin, que vão explorar petróleo no Pólo Norte; a Rússia, o Canadá ou o Congo, para preservarem as suas florestas; o Governo japonês, que autoriza a caça às baleias; o próprio Macron, a desligar as suas centrais nucleares. Ou que questionem modelos económicos e lógicas de crescimento infinito e de acumulação de lucro.
É preciso dizer que são necessárias alterações dos comportamentos ao nível social, económico e político e que a actual organização da produção e do consumo constitui um obstáculo à sustentabilidade. Dessa forma será mais fácil, politicamente, mas também do ponto de vista moral, pressionar o Brasil a empenhar-se em soluções que tenham em conta o bem comum, inclusive a comprometer-se com uma política humanista em relação aos indígenas, da mesma forma que a Europa tem de respeitar os imigrantes.
Dessa forma será mais compreensível proclamar que a Amazónia é sem dúvida nenhuma brasileira, mas é também património mundial, e que a sua destruição irresponsável, em nome do nacionalismo, não é de forma nenhuma tolerável, num mundo cada vez mais interdependente, que solicita que a Amazónia seja gerida com responsabilidade planetária.