Lei de Bases da Saúde mais perto de um acordo ao centro
PSD vê como “positiva” aproximação do PS na Lei de Bases da Saúde, mas espera mais convergência. O diálogo desenrola-se pelo menos até dia 3 de Maio.
O coordenador do PSD para a área da Saúde, Ricardo Baptista Leite, entende ser um “sinal positivo” a aproximação do PS às posições sociais-democratas na Lei de Bases da Saúde, nomeadamente nas Parcerias Público-Privadas (PPP), mas diz que ainda há “um longo” processo de conversações e votações na comissão.
Depois da desavença pública entre o BE e o Governo (e que ficou visível também entre os próprios socialistas), o PCP pediu o adiamento das votações no grupo de trabalho, sinal de que ainda decorrem negociações com o executivo. A coordenadora bloquista Catarina Martins admitiu que “a negociação não acabou” e que o BE “não fecha a porta a um entendimento à esquerda”.
Em declarações ao PÚBLICO, Ricardo Baptista Leite sublinhou que o PSD se “manteve fiel à sua posição” e que foi o PS que se aproximou ao apresentar alterações à proposta de lei do Governo que não fecham a porta à contratualização com o sector privado e social. “O PS mudou a sua posição no sentido de aproximação do PSD. É um sinal positivo e de responsabilidade”, disse o deputado, lembrando que “há ainda um longo processo de conversações e de votações na especialidade”.
Os sociais-democratas defendem que a gestão do Serviço Nacional de Saúde (SNS) deve ser pública mas que “deve haver uma porta aberta”, sujeita a critérios, para o Governo “poder recorrer ao privado e social”. Neste momento, a proposta do PS estabelece que “podem ser celebrados acordos com entidades privadas e do sector social” em caso de “necessidade fundamentada” e que a gestão dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde “é pública”, podendo ser “supletiva e temporariamente assegurada por contrato de direito público”.
O PSD defende que essa contratação deveria estar sujeita a critérios como o do “custo/efectividade”, que “contribui para a sustentabilidade do sistema”, e o do “custo/oportunidade”, que permita uma melhoria do “acesso à saúde” e dos indicadores de saúde, segundo Baptista Leite. De certa forma, o PSD estende a mão ao PS e espera que os socialistas aceitem estes critérios, entre outras propostas na área do financiamento e da regulação do sector, para ser possível um entendimento.
Para já, os partidos terão uma semana para conversações, depois de terem sido adiadas, ontem, para a próxima sexta-feira, dia 3, as votações das propostas de alteração à Lei de Bases da Saúde no grupo de trabalho. Antes e depois da reunião, e no dia em que voltou a ser pública a divergência entre BE e Governo, o PCP declarou-se empenhado em encontrar uma solução. Jerónimo de Sousa, em declarações aos jornalistas no Parlamento, disse haver “caminho para andar” para aprovar uma nova lei. Em comunicado, os comunistas assumem que o PS pode procurar um entendimento com o PSD com o “patrocínio do Presidente da República”. Marcelo Rebelo de Sousa fez saber que não aprovaria uma lei de bases só com uma maioria de esquerda e que fechasse a porta às PPP.
No mesmo comunicado e pela voz da deputada Carla Cruz, o PCP fez questão de sublinhar a base “construtiva e de seriedade” com que os comunistas têm estado no “exame comum” da nova lei de bases. Um recado directo para o BE. Os bloquistas ouviram outros avisos, mas da parte do Governo.
O secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, Duarte Cordeiro, advertiu os partidos – sobretudo à esquerda – sobre se querem ter “a actual lei ou uma nova lei de bases da saúde”. Uma forma de dizer que esta proposta do PS é um avanço face ao que está em vigor e que os partidos à esquerda correm o risco de ficar de fora desta lei.
O governante foi questionado insistentemente pelos jornalistas sobre o sobressalto do processo de negociação entre os socialistas e os bloquistas, adiantando apenas que o BE sabia, já depois de ter recebido o documento do Governo, que não correspondia à última posição do PS. “Posteriormente à distribuição dessa mesma versão, foi dito aos vários parceiros, incluindo o Bloco de Esquerda, que ela já não correspondia à última posição, desde logo assumida pelo PS em concertação com o Governo. Portanto, existia conhecimento prévio do Bloco de Esquerda que sobre aquela proposta em concreto não havia entendimento”, disse Duarte Cordeiro, sem revelar qual o momento dessa comunicação, se antes ou depois da conferência de imprensa em que o BE anunciou um acordo com o Governo.
As declarações de Duarte Cordeiro deixaram transparecer que não havia consenso entre a proposta do Governo e o PS e mostraram o incómodo do PS com a divulgação dos documentos em negociação. Na reunião do grupo de trabalho, onde as votações acabaram por ser adiadas, a socialista Jamila Madeira assumiu que as propostas do PS são de “confirmação da proposta do Governo e de reforço da sensatez, responsabilidade e convergência”.
O certo é que, como o Bloco tem lembrado, foi o próprio primeiro-ministro António Costa a anunciar, no debate quinzenal de 4 de Abril, a entrega ao BE de uma “redacção em função dos últimos contactos mantidos” e a assumir que é a actual maioria que tem “capacidade de convergência” e que a Lei de Bases da Saúde dispensa partidos que “nunca apoiaram o Serviço Nacional de Saúde”.
Foi com base nesse documento – que fechava a porta às PPP, entre outras medidas – que o Bloco anunciou um acordo com o Governo, que veio a ser desmentido. O PS entregou então uma proposta que concretizava o recuo face ao documento do executivo: dá margem às PPP e à contratualização com o sector privado e social, bem como abandona a dedicação exclusiva dos profissionais de saúde. O texto mantém a redacção sobre o fim das taxas moderadoras para actos médicos prescritos e cuidados de saúde primários. Ao longo da próxima semana, o PS terá de encontrar, à esquerda ou à direita, o seu parceiro preferencial para fazer aprovar uma nova lei.