Ciclone Idai: Governo moçambicano manda retirar deslocados das escolas
Ministro Celso Correia disse ao PÚBLICO que há urgência em reiniciar as aulas e prosseguir com o ano lectivo. “Para começar a retomar a vida normal”
O Governo de Moçambique ordenou a retirada dos deslocados do ciclone Idai das escolas onde estavam desde que a tragédia os deixou sem casa, transferindo-os para centros de alojamento. O processo começou na manhã desta segunda-feira e o Executivo contava que o processo estivesse terminado ao fim do dia.
“Esta manhã, começámos a retirar todos os deslocados das escolas”, afirmou, em declarações ao PÚBLICO, o ministro Celso Correia, que está a coordenar oficialmente a resposta aos efeitos do desastre natural no centro de Moçambique. “Estamos a levar as pessoas já para os centros de acomodação. As escolas funcionaram como centros de trânsito porque eram infra-estruturas que, minimamente, tinham condições de emergência e agora vamos retirá-las e esperamos ter até ao final do dia as escolas livres para começar a retoma da vida normal”, explicou o governante.
Com as escolas ocupadas pelos sinistrados, as crianças deixaram de ter aulas e o prolongar da situação estava a gerar preocupação nas famílias e nos profissionais da Educação. “As crianças não podem estar sem escola”, disse ao PÚBLICO Anália Jorge Intara, gestora da Escola Eduardo Mondlane, no centro da Beira.
O ministro da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural reconhece isso mesmo, embora sem querer comprometer-se com uma data certa para o reinício das aulas – “está a ser avaliado”.
“Temos cerca de 90 mil crianças que neste momento não estão a frequentar a escola, mas iremos fazer esta abordagem com alguma tranquilidade porque, para além do desastre físico, da perda material e da perda de vidas, há um choque que se apoderou das comunidades, temos de ser capazes de dar tempo e dar assistência psicológica e acreditamos que a retoma do ensino vai trazer também algum alento”, explicou.
O Ministério da Educação moçambicano está a preparar um acerto no calendário para contemplar este período de pausa forçada nas aulas. “Para ver se [as crianças] não perdem o ano lectivo e se conseguimos recuperar este tempo perdido no ensino”, explicou Celso Correia.
Com a descida acentuada do nível das águas, devido à melhoria das condições meteorológicas, o número de mortos manteve-se estável esta segunda-feira, nos 446, aumentando, por outro lado, as pessoas resgatadas das zonas isoladas pelas cheias: cerca de 180 mil.
A mudança das condições no terreno alterou igualmente a resposta das operações de busca e salvamento. “Estamos a aumentar o número de bases logísticas para termos uma operação mais eficiente”, disse o ministro.
O desafio da cólera
Em vez da entrega alimentar à distância e resgate de pessoas isoladas, importa agora ter uma maior proximidade das populações afectadas. Não as deslocar das suas zonas de residência, mas levar até elas a assistência alimentar e, sobretudo, médica. A assistência médica “será o desafio nas próximas semanas”, diz o ministro. “De certeza que vamos ter eclosão de doenças como malária, cólera”. A pensar nisso, Celso Correia garante que o Governo montou um centro de tratamento de cólera e nos hospitais estão “a separar os doentes que mostram sintomas de cólera”.
No Hospital Central da Beira, “os doentes com diarreias” estão a ser medicados e enviados de volta para os centros clínicos, porque o equipamento de laboratório foi danificado pelo ciclone, que deixou marcas visíveis nos edifícios da unidade hospitalar, e não há possibilidade de confirmar se os doentes com sintomas estão mesmo infectados.
No Centro Clínico da Munhava, no bairro mais populoso da Beira, já se vêem alguns doentes a receber soro em macas colocadas na rua e os Médicos Sem Fronteiras estavam a preparar cordas com ganchos para colocar os sacos de soro fisiológico, imprescindível para o tratamento das pessoas infectadas. A cólera provoca diarreia e vómitos fortes que levam a graves desidratações.
O sistema de prevenção de contaminações estava montado, com máscaras e desinfecção de mãos e calçado de borracha, para evitar o contágio. No entanto, a reportagem do PÚBLICO foi impedida de falar com as pessoas e de fotografar no Centro Clínico da Munhava. Segundo uma fonte dos Médicos Sem Fronteiras, por ordem do Ministério da Saúde moçambicano.