Acusação pode recorrer da libertação de Bruno de Carvalho e "Mustafá"
Juiz de instrução criminal determina medidas de coacção menos gravosas do que a prisão preventiva. Líder da Juve Leo terá apanhado “boleia” do ex-presidente, apesar dos indícios “fortes” contra si.
Não são “fortes” as provas recolhidas pela investigação sobre o envolvimento de Bruno de Carvalho, ex-presidente do Sporting, e Nuno Mendes, conhecido como "Mustafá" e líder da Juventude Leonina, no ataque à Academia de Alcochete, a 15 de Maio deste ano. Os dois arguidos, detidos na noite de domingo, foram esta quinta-feira libertados e vão aguardar o julgamento em liberdade. A decisão do juiz de instrução criminal Carlos Delca não agradou ao Ministério Público (MP) que pondera recorrer.
Para já, foram aplicadas aos dois mais recentes arguidos deste processo medidas de coacção menos gravosas, que passam pelo Termo de Identidade e Residência, com apresentações diária às autoridades, e uma caução de 70 mil euros. O despacho, lido na manhã de quinta-feira no Juízo de Instrução Criminal do Barreiro, deixou cair a hipótese de prisão preventiva como pretendia a investigação.
Em prisão preventiva continuam 38 dos 45 arguidos no processo. Os primeiros 23 cumprem esta sexta-feira seis meses de detenção – o prazo máximo permitido por lei até ser deduzida acusação, ainda que a prisão preventiva tenha sido formalmente decretada apenas a 21 de Maio - e podem vir a ser libertados. Uma situação que poderia precipitar o despacho de acusação por parte do MP, como foi esta quinta-feira avançado pelo jornal Expresso.
Em relação às medidas aplicadas a Bruno de Carvalho e Nuno Mendes, as mesmas foram consideradas insuficientes pelo MP, que pondera também a hipótese de recorrer da decisão, segundo revelou à Agência Lusa uma fonte oficial da Procuradoria-Geral da República.
“Apenas em relação à prática do crime de tráfico de estupefacientes imputado ao arguido Nuno Mendes se verificam fortes, os indícios resultantes dos elementos de prova”, justificou o juiz no despacho. E mesmo estes não foram suficientes para manter detido o líder da "Juve Leo", de 40 anos, que ontem já esteve no Pavilhão João Rocha a assistir a um jogo de futsal do emblema "leonino".
Para aplicar as medidas de coacção, o juiz de Instrução Criminal do Barreiro considerou que se verificam, em relação aos dois arguidos, “os perigos de fuga”, “de perturbação do decurso do inquérito”, “da continuação da actividade criminosa” e de “grave perturbação da ordem e tranquilidades públicas”. O despacho considera ainda que a actuação dos arguidos “revela um manifesto desprezo pelas consequências gravosas que provocam nas vítimas.”
Instigadores e autores materiais
Um desfecho que não surpreendeu Rui Pereira, jurista e ex-ministro da Administração Interna. “Achava que era possível a não aplicação da prisão preventiva porque os indícios em relação a Bruno de Carvalho e Nuno Mendes são menos fortes do que em relação aos executores materiais que estão detidos”, justificou ao PÚBLICO o penalista. “É sempre mais difícil fazer a prova em relação aos instigadores do que em relação aos que praticaram materialmente os crimes.”
Para Rui Pereira, a aplicação destas medidas de coacção menos gravosas não significa que estes dois arguidos tenham sido absolvidos dos crimes que lhes são imputados. “Quando o juiz diz que não existem indícios fortes está a referir-se aos indícios fortes em relação à instigação daqueles crimes. Se não houvesse indícios suficientes, o MP não poderia deduzir a acusação.”
Menos justificáveis para alguns juristas contactados pelo PÚBLICO são as medidas de coacção aplicadas concretamente a Nuno Mendes. É que o líder da claque “leonina” foi também acusado do crime de “tráfico de estupefacientes” e, neste caso, o juiz considerou no despacho que os indícios recolhidos eram “fortes”. Mesmo assim optou também por não aplicar a prisão preventiva.
Para alguns penalistas, que não quiseram ser identificados, "Mustafá" poderá ter apanhado “boleia” e sido beneficiado pelas medidas de coacção adoptadas para Bruno de Carvalho. O contrário também pode acontecer, como se verificou com os restantes executores materiais do ataque à Academia do Sporting, que ficaram todos em prisão preventiva.