Habitar entendido como valor a redescobrir na sua essência, expressão da relação intrínseca entre arquitetura e design, hoje esquecida em prole de um processo de especialização das disciplinas de projeto. Este processo tem conduzido, por um lado, ao progressivo entendimento do design como disciplina complementar da arquitetura, por outro, leva a considerar a arquitetura em função das suas qualidades espaciais e não como lugar e espaço para ser habitado.
As duas seções que compõem o pavilhão português apresentam-se organizadas, graças ao "layout" expositivo da Design Factory, em duas salas contíguas: uma reúne os projetos dos alunos da ESAD/Escola Superior de Artes e Design de Matosinhos no módulo O Objeto Reinventado, e as novas praticas do design português, no módulo Novas Práticas em Design. Em ambos os módulos emergem os valores de um projeto autoproduzido — onde os objetos são caracterizados pelos seus valores semânticos e expressivos — e os valores do reuso, importante recurso conceitual capaz de legitimar o projeto, desde o objeto até a arquitetura, mais atual do que nunca no contexto de crise económica e ambiental.
Hoje convivem realidades produtivas convencionais com realidades híbridas entre artesanato e indústria, entre pequena série e grande série, num panorama onde todos os cenários são possíveis. E num contexto social, político e ambiental de grande crise que não parece vir a retroceder.
Em Portugal nunca houve uma indústria desenvolvida, o artesanato sempre conviveu com realidades produtivas caracterizadas por um grande nível de manufatura, mas pouco valorizadas pelo design, que sempre foi considerado um derivado da arquitetura e uma sua consequência.
O design português é em grande parte representado ainda pelos mestres da arquitetura que, pela dificuldade em encontrar manufaturas, mobiliário e complementos produzidos industrialmente durante a ditadura, têm desenvolvido um projeto de objetos e mobiliário fortemente ancorado a um espaço específico, tradição que se mantém até hoje.
A nova geração de designers confronta-se, porém, com um paradigma pós-industrial que, por um lado, legitima novas práticas de projeto e novos processos, e por outro, orienta para uma forte incidência no real, no social e nas problemáticas ambientais. Estas novas práticas são apresentadas, através de uma seleção de trabalhos significativos de estudantes e de jovens profissionais que, tendo assimilado a herança dos mestres da cultura projetual portuguesa, estão agora a ultrapassá-la, na tentativa de olhar para horizontes futuros.
Numa das salas adjacentes que compõem o pavilhão português são colocadas em relação dialéctica as práticas de projeto de arquitetos emergentes que, operando sobretudo nos espaços urbanos, efetuam uma reflexão sobre o habitar a cidade, e um conjunto de entrevistas efectuadas a 13 mestres da arquitetura portuguesa, que se expõem numa conversa, questionando-se sobre o sentido do habitar, sobre a ideia de conforto, sobre a felicidade e a sua relação com a arquitetura, demonstrando que o habitar se configura e ganha forma partindo das necessidades ancestrais do homem cujas funções primárias se realizam através de um sistema de objetos que medeia a sua relação com o espaço. Trata-se do módulo 13 Habitats.
O projeto Extemporay Capsule repropõe um processo projetual capaz de reaproximar a mão e a mente, o ato de fazer com o de projetar, saber desde sempre pertencente à dimensão do homem-artesão, filosofia expressada pelo Richard Sennett no livro "The Craftsman" (2008).
Este conjunto de módulos expositivos que integram o programa da Representação Portuguesa na Trienal de Milão Objects After Objects refletem sobre as razões mais profundas do habitar, sobre o valor do reuso, as práticas de projeto autoproduzidas e sobre a importância do corpo na relação entre objeto e espaço, meio incontornável para dar sentido aos objetos e aos espaços, demonstrando como nos momentos de crise se redescobre o sentido de atitudes que pareciam já ultrapassadas, mas que continuam a ser um desejo inato na natureza do homem.