Portugal vai estar representado oficialmente na XXI Trienal de Milão que, entre 2 de abril e 12 de setembro, se desenvolve sob o conceito geral "21st Century. Design After Design". Em dois artigos de opinião vou procurar enquadrar esta edição, do ponto de vista do conceito geral e do programa da representação portuguesa, e evidenciar porque, em minha opinião, a ideia de Escola nos surge como central.
Na definição programática desta edição da Trienal destacam-se duas linhas orientadoras: uma projetiva, questionadora do futuro próximo dos campos disciplinares do design e da arquitetura; outra retrospetiva, inquiridora da atualidade de certas referencias históricas. Na síntese entre as duas linhas, a edição de 2016 estabelece diversas ligações com a edição de 1968 — e este é um facto particularmente relevante.
Conhecida pela "Trienal Fantasma", a edição de 1968 teve como comissário o arquiteto italiano Giancarlo De Carlo. Certamente influenciado por dois anos de contacto muito próximo com a realidade norte-americana, caracterizada pela conflitualidade e pluralidade cultural e política, em anos marcados pela guerra no Vietnam, pela contestação estudantil, pela transformação do campo da arte contemporânea (Pop Art, Arte Concetual, Movimento Fluxus), De Carlo desenha uma trienal sob o tema "O Grande Número".
O objetivo da XIV trienal era o de se posicionar face a uma profunda crise social e económica, não obstante a coexistência de discursos neoliberais otimistas quanto a um crescimento económico de um mercado crescentemente global. O tema "O Grande Número" foi proposto por De Carlo como capaz de tratar esta dicotomia. A sua origem remetia-nos para o contexto dos CIAM, mas evocava igualmente os programas sociais e económicos em desenvolvimento experimental em países destruídos pela segunda guerra mundial e em algumas colónias do norte de África. No fundo, "O Grande Número" remetia para uma certa ditadura do financeiro, em contexto de crise de valores, o que aproxima a realidade que atualmente vivemos (em particular nos países do sul da Europa) com a realidade de então.
Pensada para ser inaugurada a 30 de maio, no Palazzo dell’Arte, a edição de 1968 foi imediatamente ocupada, encerrada e destruída por estudantes em protesto.
As ações, muito generalizadas, perpetradas por movimentos de estudantes, podem ser vistas como uma extensão radical do espaço da Escola e como uma manifestação radical da sua função social. Esta ideia interessa-nos particularmente.
O programa da Representação Portuguesa na XXI Trienal de Milão, com curadoria geral de Roberto Cremascoli e Maria Milano, é em grande medida construído em torno da ideia de Escola e da sua reflexão crítica. Formalmente, a ESAD Escola Superior de Artes e Design de Matosinhos assume a produção do evento. Alguns núcleos expositivos, como "O Objeto Reinventado", apresentam trabalho desenvolvido em contexto de "workshop"; a par da componente expositiva, será autoproduzido um projeto de arquitetura efémera, em pleno espaço público, envolvendo professores e estudantes portugueses e italianos, no âmbito do módulo Extemporary Capsule. A ideia de Escola persiste ainda orientadora de núcleos expositivos onde se dá voz aos mestres — refiro-me à instalação 13 Habitats — ou onde se realça uma produção experimental recente — como nos núcleos Novas Práticas do Design e Novas Práticas da Arquitetura — sem que se pretenda canonizar o discursos dos mestres nem empolar, pelo lado da novidade ou por razões geracionais, trabalho mais emergente.
Próximo no tempo da edição da Trienal de 1968, é a publicação "Un Société Sans École", de Ivan Illich, contemporânea também do surgimento de inúmeras escolas informais, algumas criadas a partir de processos de ocupação de espaços devolutos, um pouco à semelhança da Es.Col.A da Fontinha, no Porto, um espaço coletivo autogestionado, que em 2012 procurou autogerir e abrir à comunidade uma Escola no edifício devoluto da Escola Primária do Alto da Fontinha.
Os diversos modelos de Escola e a ideia de ensino em design serão o objeto da segunda parte deste artigo.
Texto escrito segundo o novo Acordo Ortográfico.