O PASOK foi o primeiro a ir para a cova, o SPD alemão é uma sombra, o PS francês está só à espera das próximas eleições, o PSOE acende velinhas à Virgem de Guadalupe para que o Podemos não lhe coma o eleitorado todo, os Trabalhistas foi o que se viu a semana passada, a Itália é a salganhada incompreensível do costume, os escandinavos aguentam-se (mas com dinheiro também eu) e por cá... por cá a sorte do Costa é o Pedro e o Paulo serem umas feras da austeridade tão autistas e impenitentes (em quantas burricadas tem o António de cair para perder as próximas legislativas?! É que vai ser preciso jeito!).
E a malta olha para o cenário e pergunta: o que é que aconteceu a estes gajos? Nos maus velhos tempos isto foi um movimento vivo e com ideias e gente interessante: travaram uma revolução na Alemanha, tornaram a França num exemplo e puxaram a Escandinávia para o século XXI; hoje parecem um “country club” de meninos bem-comportados, mais preocupados em ser convidados para Davos do que em atacar problemas reais; o fantasma do Jaurès deve estar às cambalhotas na tumba do Panthéon.
Os inteligentes apostam na tese do suicídio: a culpa é do Blair e do Giddens, do “New Labour” e da Terceira Via, deste tiro na cabeça que foi a invenção dum "socialismo" ultra-aguado que se tornou moda. Desta tendência duma Esquerda tão para lá de descafeínada que às tantas não é nem rosa nem o seu contrário e que leva o terço que ainda vota a dizer a si próprio “antes o diabo que se assume que o que me sussurra ao ouvido antes de meter a areia na vaselina”. Ou seja, a social-democracia, ao engolir “hook, line and sinker” a patranha da Direita de como qualquer ideia de Esquerda é irresponsável (esse grande palavrão) e utópica (um palavrão ainda maior) se esvaziou a si própria e marchou cantando e rindo para a total e absoluta irrelevância.
Agora notem que isto para mim é tudo um bocado "lana caprina": eu sou assumida e desavergonhadamente vermelho (não sei se já leram qualquer outra crónica minha...), duma Esquerda radical e às vezes até infantil (diria o tio Vladimir Ilitch) que não vê no adjectivo "radical" um insulto mas sim um elogio porque sabe que "radical" vem do latim "raiz": da vontade de lidar com as raízes dos problemas em vez de desperdiçar tempo a podar os ramos altos das consequências.
Mas seja por vício académico ou queda para a teologia política o falecer da social-democracia pica-me a interesse (mais do que o luto, sejamos sinceros) e francamente puxa-se-me mais a chinela para o cumprimento do que para o suicídio: que é como quem diz a social-democracia não se matou porque morreu de morte natural, foi morte morrida e não morte matada diria o meu avô brasileiro.
O projecto da social-democracia cumpriu-se: democracia formal, igualdade de sexos e "raças" perante e lei, saúde (mais ou menos) gratuita, educação (mais ou menos) laica, férias pagas (para quem tenha contracto), segurança social (mais, menos pensão miserável)... para o Jaurès, o Olof Palme, o Bochechas, l’ami Mitterrand e o resto dos girondinos já lá estamos, a História cumpriu-se e tudo o que podia ser feito sem desafiar a estrutura fez-se, e no entanto...
E no entanto não chega (parece que ouço a Rosa Luxemburgo a rir-se da prateleira): estranhamente esta estrutura onde o 1% mais rico pode comprar e vender o resto do mundo 100 vezes não contenta 99% dos humanos... estranhamente.
E no entanto os girondinos (leia-se, o velho PS), por inoperantes bem-intencionados que fossem, davam jeito para um frentismo aqui um frentismo ali... a calhar ainda vamos ter saudades deles, afinal com os humanos, tudo é possível.
